Topo

Entre ameaças e acusações, tucanos já descartam PSDB mais unido pós-prévias

Arthur Virgílio, Eduardo Leite e João Doria, os três pré-candidatos do PSDB à Presidência da República - Arte/ UOL
Arthur Virgílio, Eduardo Leite e João Doria, os três pré-candidatos do PSDB à Presidência da República Imagem: Arte/ UOL

Lucas Borges Teixeira

Do UOL, em São Paulo

31/10/2021 04h00

Cada vez menos tucanos têm olhado com empolgação para as prévias do PSDB à Presidência da República. Em meio a denúncias de fraude e ameaças de judicialização, aumenta o número de peessedebistas que avaliam que o partido deverá sair da pré-campanha ainda mais fragmentado do que entrou.

Nas últimas semanas, a disputa entre os governadores Eduardo Leite (RS) e João Doria (SP) tem passado do ponto que a direção do partido considera saudável publicamente. Oficialmente, as campanhas ainda falam em apoio irrestrito ao vencedor, mas membros do PSDB consideram isso cada vez mais distante.

O ex-senador Arthur Virgílio (AM) também é candidato, mas não está envolvido nas brigas e deve apoiar o ganhador.

Oficialmente, o partido ainda fala em fortalecimento pelo pleito interno. Sem um candidato natural, a Executiva do PSDB tem repetido desde o começo do ano que a formulação das prévias o recolocaria nos holofotes —o que tem funcionado— e ajuda a reposicionar a imagem do partido, tradicionalmente conhecido por escolher seus presidenciáveis em mesas dos restaurantes mais caros de São Paulo ou Brasília.

Líderes tucanos usavam como exemplo as prévias do partido democrata, nos Estados Unidos, em 2020. A pré-campanha teve debates fortes entre os postulantes, mas, com a escolha de Joe Biden para enfrentar o então presidente Donald Trump, todos se uniram em torno dele, que acabou ganhando as eleições gerais, em novembro.

Mas, nas últimas semanas, a possibilidade de ver um partido unido em torno de um único nome em 2022 parece cada vez mais remota entre os peessedebistas.

As farpas entre Doria e Leite, favoritos, já tinham começado nos bastidores, com compartilhamento de figurinhas e piadas em grupos do WhatsApp. Em um encontro em São Paulo, Leite ressuscitou o BolsoDoria de 2018 ao passo que Doria passou a relembrar publicamente o posicionamento dos deputados tucanos do Rio Grande do Sul, mais próximos ao governo do que os paulistas.

O relacionamento com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tomou o centro do primeiro debate entre os três concorrentes, com cutucadas e ataques diretos. Coisas da política, diziam as campanhas extraoficialmente.

A figura mudou na semana passada, em meio à denúncia de fraude na filiação de 92 prefeitos paulistas por parte do PSDB-SP para que pudessem votar nas prévias. O dossiê foi elaborado por grupo formado por quatro diretórios estaduais (BA, CE, MG e RS), que apoiam Leite, e alegam que as filiações foram feitas após o prazo correto.

O candidato gaúcho logo pediu que o caso fosse apurado. Doria, depois de alguns dias em silêncio, passou a responder que ninguém vai "ganhar no tapetão".

Neste meio tempo, vazaram conversas de um grupo de sua campanha que mostrava preocupação com o julgamento. O caso deixou o governador paulista furioso, diretamente de Dubai, onde está em viagem oficial, e a campanha registrou um boletim de ocorrência por "indícios de hackeamento" na última quarta (27).

"O coordenador-geral da campanha de Doria, Wilson Pedroso, lamenta que as prévias tenham chegado a um clima tão belicoso e reitera seu compromisso com eleições limpas, democráticas e que se ganhe no voto", dizia a nota da campanha paulista.

Do lado de Leite, a ato foi desdenhado e chamado de "eleitoreiro".

No dia seguinte (28), a Executiva do partido se reuniu e decidiu que os casos deverão ser analisados pela Comissão de Prévias. Até então, está tudo em suspenso: a campanha ao Sul destaca que eles ainda não podem votar; a de São Paulo, que seguem aptos.

Não tem mais clima para convenção, lamentam tucanos

Seguindo a tradição norte-americana, o PSDB quer fazer uma grande convenção em Brasília para a apuração dos votos, em 21 de novembro. Os filiados devem votar por um aplicativo desenvolvido especialmente para as prévias, mas é esperado que autoridades e lideranças votem presencialmente na capital federal.

O plano é reunir as três campanhas, apoiadores, parlamentares e ex-presidentes do partido para que, assim que sair o resultado, seja declarada a união em torno do laureado. Nos bastidores, é cada vez menor o número de tucanos que acredita nisso.

Já é consenso entre os partidários que, dos três concorrentes, só Virgílio aceitará de bom grado fazer campanha pelo vitorioso. A postura contra é negada pelas outras duas campanhas, que garantem apoio a quem vencer, mas a promessa tem perdido força.

Leite disse que acreditará em quem vencer as prévias "desde que sejam limpas". O grupo de Doria olha enviesado para o aplicativo de votação, mas comemora que, segundo sua campanha, a maior proporção de inscritos é de paulistas.

Em meio à queda-de-braço, alguns tucanos ao Sul, em Minas Gerais e no Centro-Oeste fitam os movimentos governistas. Outros em São Paulo acompanham os passos do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB), de saída do partido, e, no Nordeste, procuram posições independentes para projetos próprios, sem se meter em confusão.

Algumas lideranças já garantem que não devem ir a Brasília, mas não querem declarar isso abertamente para não prejudicar o pleito. A Executiva Nacional tem pedido para as campanhas diminuírem um pouco o tom para tentar evitar aprofundar a guerra fraterna.