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PGR esvazia ofensiva da CPI da Covid e mantém só 2 ações contra Bolsonaro

O procurador-geral da República Augusto Aras e o presidente Jair Bolsonaro em evento na PGR - Ueslei Marcelino - 17.abr.2020/Reuters
O procurador-geral da República Augusto Aras e o presidente Jair Bolsonaro em evento na PGR Imagem: Ueslei Marcelino - 17.abr.2020/Reuters

do UOL, em Brasília

26/07/2022 04h00

Ao pedir o arquivamento de sete das dez apurações instauradas no STF (Supremo Tribunal Federal) contra o presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados do Planalto, a PGR (Procuradoria Geral da República) esvazia a ofensiva da CPI da Covid contra o governo. Agora, restam em pé somente dois procedimentos contra o governo abertos a partir dos trabalhos da comissão.

Em junho, um dos 10 casos derivados da CPI já havia sido arquivado pela Procuradoria por falta de provas. A apuração mirava o deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara. Senadores classificam a postura da PGR como "blindagem" e prometem reagir.

O relatório final da CPI apresentado em outubro do ano passado indiciou Bolsonaro por 10 crimes, sendo que sete deles seriam de competência do Supremo: epidemia com resultado morte, infração de medida sanitária, charlatanismo, incitação ao crime, falsificação de documento particular, emprego irregular de verba pública e prevaricação.

Agora, só restam abertas as apurações sobre falsificação de documento e incitação ao crime.

O primeiro caso envolve um "estudo" do TCU citado pelo presidente sobre casos de covid no Brasil. O documento afirmava que "em torno de 50% dos óbitos por covid no ano passado (2020) não foram por covid". O TCU desmentiu o presidente e ministros da Corte de Contas afirmaram que o parecer era falso.

Em depoimento à CPI, o auditor do TCU Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques, apontado como autor do estudo falso, afirmou que o documento elaborado por ele foi alterado após ser encaminhado a Bolsonaro.

O segundo procedimento ainda em aberto envolve suposto crime de incitação ao crime e, além de Bolsonaro, investiga também o ex-ministro Onyx Lorenzoni (PL), o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e os deputados Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Carla Zambelli (PL-SP), Carlos Jordi (PL-RJ), Osmar Terra e Ricardo Barros.

É investigada a incitação da população a desrespeitar medidas sanitárias que impediriam a propagação da pandemia por meio de publicações com informações falsas sobre tratamento de covid, uso de máscaras e o distanciamento social. Neste caso, a PGR pediu ontem a prorrogação das apurações por mais 90 dias para a PF concluir diligências pendentes.

Pressão sob Aras

Além do presidente, também foram indiciados e tiveram as apurações arquivadas ontem pela PGR os ministros Marcelo Queiroga (Saúde) e Wagner Rosário (CGU), os ex-ministros Walter Braga Netto (Casa Civil) e Eduardo Pazuello (ex-ministro da Saúde), e os deputados federais Osmar Terra e Ricardo Barros.

A manifestação da PGR desagradou senadores que integraram a comissão e abriu novo capítulo no embate entre os parlamentares e o procurador-geral, Augusto Aras.

Desde o início do ano, a cúpula da CPI pressionava a equipe do procurador-geral a dar rumo às apurações. Os senadores chegaram a ameaçar protocolar um pedido de impeachment contra Aras no Senado se a PGR não encaminhasse uma posição sobre o indiciamento de Bolsonaro e de outras autoridades denunciadas pela CPI.

Diante da pressão dos senadores, integrantes da Procuradoria pediram aos parlamentares que detalhassem as acusações relacionadas a cada autoridade indiciada. Em fevereiro, uma relação de provas obtidas pela comissão contra Bolsonaro e seus aliados foi enviada a Aras.

Na ocasião, porém, senadores reclamaram que já o tinham feito no próprio parecer final, entregue ainda em 2021, e diziam que Aras estaria "protelando" para tomar medidas relacionadas à CPI.

Agora, os senadores planejam reagir aos arquivamentos de apurações contra Bolsonaro. O senador Randolfe Rodrigues vice-presidente da CPI, afirmou que deve recorrer da manifestação da PGR e não descarta apresentar um novo pedido de investigação contra Aras por prevaricação.

O senador disse que irá questionar as manifestações da PGR e medidas adotadas pela Procuradoria que teriam dificultado a instauração de inquéritos. Segundo o parlamentar, se a PGR mantiver a postura pelo arquivamento, pedirá a abertura de uma investigação contra o procurador-geral Augusto Aras por prevaricação.

"Estamos confiantes que o STF não faltará ao clamor de mais de 600 mil compatriotas que perderam a vida para omissão do governo Jair Bolsonaro!", disse Randolfe.

O senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI, afirmou ontem que a Procuradoria "blinda" Bolsonaro às vésperas das eleições. Já o presidente do colegiado, Omar Aziz (PSD-MA), afirmou que a posição da PGR é um "desrespeito à memória e às famílias" das vítimas da covid-19.

Ao pedir o arquivamento de uma apuração, é praxe aos ministros do Supremo Tribunal Federal acatarem as manifestações da PGR e encerrarem os processos. Isso porque cabe à Procuradoria avaliar se há elementos suficientes para uma apuração e até quando ela deve ocorrer.

PGR não viu crime

Na série de manifestações em que defende o arquivamento das sete apurações, a vice-procuradora-geral Lindôra Araújo disse que as investigações conduzidas após a entrega do relatório final da CPI foram insuficientes para apontar crimes cometidos pelo presidente e por aliados do Planalto.

Nos casos em que a comissão acusou Bolsonaro de cometer supostos crimes de epidemia e charlatanismo, por exemplo, a PGR diz que a CPI não apresentou provas suficientes que apontassem infrações do presidente.

No relatório final, os senadores indiciaram Bolsonaro por retardar a compra de vacinas contra a covid-19, adotar uma postura de omissão no combate à pandemia e incentivar o chamado "tratamento precoce", que não tem eficácia contra o coronavírus.

Ao comentar sobre a insistência do presidente com o uso da cloroquina, a vice-procuradora minimizou a conduta e diz que "não há indícios mínimos" de que Bolsonaro tinha conhecimento da ineficácia dos medicamentos no início da pandemia e que, em declarações seguintes, o presidente alertava que a eficácia "ainda pendia de comprovação médico-científica".

Os elementos amealhados não evidenciam a vontade livre e consciente do indiciado em apregoar cura infalível sabidamente ineficaz, notadamente porque depreende-se dos autos que o Presidente da República Jair Messias Bolsonaro tinha plena convicção e confiança na eficácia do tratamento para a Covid-19 com a utilização de cloroquina e hidroxicloroquina, aliado ao seu conhecimento de pendência comprobatória médico-científica para esse propósito"
Lindôra Araújo, vice-procuradora-geral da República

Lindôra também minimizou a acusação da CPI contra Bolsonaro por infração de medida sanitária por deixar de usar máscaras em diversas ocasiões, mesmo após o seu uso ser recomendado para evitar a propagação de covid. Para a Lindôra Araújo, trata-se de uma conduta que deve ser reprovada no campo político, e não criminal.

"O Chefe do Executivo assim procedeu não por desconsiderar a gravidade da doença ou a crise sanitária, mas porque, na compreensão dele, estavam em jogo diversos outros fatores num cenário macro, como a economia do país. A discordância desse posicionamento, se merece alguma reprovação, deve ser dirimida no campo político, não no processo penal", afirmou.

Wagner Rosário e Ricardo Barros

A PGR também pediu o arquivamento de dois procedimentos que miravam o ministro da Controladoria-Geral da União, Wagner Rosário, e o líder do governo na Câmara, Ricardo Barroso.

Em relação a Rosário, Lindôra disse que não houve indícios de omissão do ministro na apuração de irregularidades na contratação da Precisa Medicamentos, farmacêutica responsável pela venda da Covaxin.

O procedimento envolvendo Ricardo Barros, por sua vez, foi enviado para a primeira instância após a PGR considerar que não há indícios de envolvimento do parlamentar no caso. Ele foi indicado por formação de organização criminosa.