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Especialista alerta para risco real de febre amarela urbana nas Américas

Em Washington

21/02/2018 17h56

A epidemia de febre amarela que afeta as Américas há dois anos, tendo o Brasil como epicentro, pode se propagar para todos os países da bacia do Amazonas e Orinoco e até se tornar urbana - alerta um especialista do Programa de Emergências da Organização Pan-Americana de Saúde (OPS).

Sylvain Aldighieri, diretor adjunto da OPS, pediu que se combata o mosquito Aedes aegypti, vetor da enfermidade em áreas urbanas, a exemplo da campanha de vacinação no Brasil, e alertou que matar macacos para evitar a febre amarela "é uma loucura total".

A seguir, um resumo da entrevista de Aldighiere com a AFP:

Em várias zonas das Américas são reportados casos de febre amarela nos últimos dois anos. É o mesmo surto?

- Não, são focos diferentes em ecossistemas diferentes, na Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana Francesa, Peru e Suriname. A febre amarela selvática é endêmica em parte dos 13 países e territórios das Américas. O surto atual no Brasil é o mais importante desde os anos 1940. Dos mais de 800 casos humanos confirmados nas Américas, entre julho de 2016 e junho de 2017, a grande maioria ocorreu no sudeste do Brasil.

A febre amarela é uma doença selvática e do mundo animal. A que se atribui esta expansão do vírus entre humanos?

- As cidades eram muito menores antes, agora são megalópoles com ecossistemas selváticos próximos ou dentro das próprias áreas urbanas. Há suficiente população de primatas não humanos e de mosquitos nesses ecossistemas. Também há humanos não imunizados que entram contato com estes ecossistemas. E se observam outros aspectos favoráveis da propagação, como a chuva, a temperatura, a fragmentação das matas.

A febre amarela pode se tornar urbana?

- O risco sempre existe. Dependerá da densidade do mosquito Aedes aegypti, vetor da enfermidade nas áreas urbanas. Até o momento não foram reportados casos de transmissão por esse mosquito em nenhum país das Américas.

O Aedes aegypti está envolvido nos surtos?

- A maioria dos casos de febre amarela nos últimos anos foi transmitida por mosquitos selváticos. O último foco por Aedes aegypti se registrou em 2008 em Assunção, com 14 casos. Antes havia um foco assim no Brasil, nos anos 1940.

Na semana passada, o Brasil informou sobre a detecção do vírus da febre amarela no mosquito Aedes albopictus. De que tipo é este mosquito?

- É um mosquito que, nas Américas, se estabeleceu em zonas periurbanas depois de sua introdução na região. Seus criadouros estão à margem das cidades, não nas cidades, como acontece com o Aedes aegypti. Apesar de, em outras regiões do mundo, ser um vetor de transmissão da chikungunya, por exemplo, até agora não se demonstrou que tenha um papel na Américas. Mas está sob vigilância.

Como se combate a febre amarela?

- Temos duas armas. Primeiro, vacinar a população em zonas próximas a ecossistemas selváticos. E, segundo, de igual importância, controlar o Aedes aegypti. É a luta contra as larvas, os ovos e o adulto em águas paradas e em depósitos de água limpa.

Por que o Brasil está usando vacinas fracionadas?

- Para aproveitar o estoque existente e assim vacinar mais pessoas em zonas de baixo risco. Tem exatamente a mesma efetividade.

Como avalia a gestão deste surto no Brasil?

- As medidas estão no bom caminho. É algo muito desafiante imunizar 100% da população em áreas de risco. O Brasil está priorizando a zona onde o surto está ativo, visa a uma população de cerca de 24 milhões de pessoas. Conseguir imunizar os jovens trabalhadores em zonas remotas é o maior desafio. E, depois, conseguir um mínimo de cobertura nas zonas urbanas.

Que países devem ficar atentos à propagação da doença?

- É muito difícil antecipar isso. Todos os países da bacia amazônica e do Orinoco: Paraguai, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela e Guianas. O maior desafio é nas zonas de colonização do ambiente amazônico, onde há novos assentamentos, construção de estradas, exploração petroleira, mineração legal e ilegal, deslocamentos de população. O critério de risco se aplica a essas populações móveis em zonas que já foram matas.

E o fato de estarem matando macacos?

- Não, isso é uma loucura total. O macaco é o maior aliado do ser humano porque, quando morre, identifica a presença do vírus e alerta para o início de uma campanha de vacinação. Espécies de macacos em vias de extinção sofreram o impacto do vírus no ano passado. E matar os poucos sobreviventes é um novo ataque contra a biodiversidade. As campanhas de comunicação devem servir para promover a vacinação, e não para matar os macacos.