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Nigéria fez trabalho de 'detetive' para derrotar ebola

20/10/2014 11h58

A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a Nigéria oficialmente livre do ebola nesta segunda-feira (20), depois de seis semanas sem registro de novos casos no país.

Falando na capital do país, Abuja, o representante da organização Rui Gama Vaz afirmou que esta foi uma "história espetacular de sucesso".

O país mais populoso do continente africano ganhou elogios por sua resposta rápida depois que um diplomata liberiano, Patrick Sawyer, chegou doente ao país, em julho.

A Nigéria teve apenas 19 casos registrados e oito mortes pelo ebola. O último caso relatado no país foi descoberto no dia 5 de setembro.

A OMS pode declarar o fim oficial de uma epidemia de ebola se dois períodos de incubação de 21 dias passarem sem novos casos.

Logo que Sawyer chegou e foi diagnosticado com a doença, a Nigéria declarou emergência nacional pública de saúde.

Sawyer morreu devido à doença junto com outros sete nigerianos, incluindo Ameyo Stella Adadevoh, a médica que diagnosticou o primeiro caso no país e é apontada como a responsável por ajudar a conter a epidemia.

John Vertefeuille, do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC, na sigla em inglês), disse que a Nigéria tomou as medidas certas para conter a epidemia.

"A Nigéria agiu cedo, rapidamente e em larga escala. Eles agiram de forma agressiva, especialmente em termos de contato-rastreamento (da doença)", disse à agência de notícias AFP.

Na sexta-feira, a OMS declarou outro país da África Ocidental, o Senegal, oficialmente livre do ebola.

A epidemia da doença já matou mais de 4,5 mil pessoas na África Ocidental, principalmente na Libéria, Guiné e Serra Leoa.

Suspeita de malária

Em meio ao número crescente de casos da doença e da crise na África Ocidental, a Nigéria mostrou que as técnicas certas e a velocidade de resposta podem dar resultados bem positivos no combate ao ebola.

Com uma população de mais de 170 milhões de pessoas, havia o temor de que o vírus se espalhasse rapidamente pelo país. O fato de o país estar livre do ebola se deve a um incrível trabalho investigativo dos médicos, comparável ao de detetives.

O começo de tudo foi a chegada de Patrick Sawyer no aeoroporto de Lagos, onde ele apresentou sintomas que levaram as autoridades a desconfiar de malária.

Levado para uma clínica particular, Sawyer passou por exames e, durante a espera pelos resultados, vários funcionários foram infectados.

No momento em que o ebola foi confirmado, a infecção já tinha se espalhado para 11 funcionários; quatro deles morreram. E este foi o momento em que tudo poderia ter saído errado.

Mas, por sorte, uma equipe de especialistas que combatia a poliomielite estava na região e foi rapidamente redirecionada.

O que se seguiu foi um trabalho minucioso de identificação e rastreamento de todos os que poderiam ter tido contato com o paciente. Começou com os funcionários médicos e suas famílias e foi se estendendo.

Uma lista de contatos inicial tinha 281 pessoas e logo aumentou para 894. Cada uma destas pessoas foi visitada e passou por várias checagens para verificar sinais da doença.

Mas o trabalho não acabou aí. Especialistas calcularam quantas pessoas viviam em um raio particular a partir do local onde estas 894 pessoas monitoradas viviam.

Com isso, autoridades e voluntários fizeram visitas a um total de 26 mil residências.

Comunidades

Uma política importante das autoridades de saúde da Nigéria foi envolver as comunidades em todo este processo e estimular as pessoas a serem honestas sobre os lugares onde iam e com quem tiveram contato.

No total, foram 19 casos confirmados da doença no país, com oito mortes. Um número muito menor do que poderia ter sido.

Em um mundo ideal, países como Libéria, Guiné e Serra Leoa aplicariam os mesmos procedimentos, no entanto, a probabilidade de isto acontecer é baixa.

Segundo o editor de ciência da BBC David Shukman, a Nigéria, apesar da fama de corrupção no serviços públicos, tem uma burocracia que funcionou de forma eficiente como estratégia contra o ebola. Uma situação diferente da vivida nos três países mais afetados pela doença - que enfrentam pobreza extrema e sofrem as consequências de conflitos internos.

Mas é preciso ter cautela, ter certeza de que a "tempestade" passou mesmo. O diretor do CDC, Tom Freiden, comparou o ebola a um combate de incêndio na floresta - "deixe um pedaço de carvão aceso, ou um caso sem ter sido detectado, e a epidemia pode ser reacesa".

A Nigéria entretanto, completou os 42 dias necessários sem registros de novos casos.

A OMS acredita, entretanto, que até 15 países africanos correm o risco de ser atingidos pela epidemia.

E uma nova preocupação está surgindo entre especialistas: de que a escala da epidemia agora seja tão grande - e ela esteja tão espalhada -, que seria impossível seguir o exemplo da Nigéria, de rastrear literalmente casa caso ou suspeita. Isso significa que a doença pode permanecer "escondida", sem registros, talvez até durante as próximas décadas.