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Faperj não paga nem pesquisadores de zika

13/04/2016 07h56

Rio de Janeiro - A crise financeira traz impactos à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). Os editais caíram a pouco mais de um terço em 2015, na comparação com os dois anos anteriores - de 45 para 18. A linha de financiamento, que garante incentivos para pesquisas sobre zika, dengue e chikungunya, lançada em dezembro, ainda não recebeu repasses. Os bolsistas estão há um mês com salários atrasados. "O jeito é canibalizar de outros financiamentos", disse o neurocientista Stevens Rehen, que tem seis linhas de pesquisa aprovadas pela Faperj - em um total de R$ 1,2 milhão. Ele ainda não iniciou todos os estudos porque não recebeu recursos.

Além do contingenciamento - de R$ 415 milhões do orçamento que deveria ter sido executado no ano passado, R$ 185 milhões caíram nos "restos a pagar" (despesas do ano anterior ainda não quitadas) -, a Faperj está sob ameaça desde o ano passado de ter o orçamento reduzido à metade. Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Estado tramita na Assembleia para que o repasse à fundação seja de 1% da receita líquida, até o fim deste governo, em vez dos 2% atuais.

Com o preço do barril do petróleo em alta e a estabilidade financeira do Estado, o repasse de 2% da receita para a Faperj vinha sendo cumprido desde 2007. "Quinze meses atrás, se me perguntassem se chegaríamos à situação atual, diria ser totalmente impossível. Foram quase dez anos com financiamento robusto. Não precisávamos fazer edital de emergência para infraestrutura de pesquisa; os artigos científicos publicados subiram 80% entre 2006 e 2014.

Passamos a fazer editais temáticos, como o da zika. Com a crise, o Estado passou a ter dificuldade de arcar com a própria folha de pagamento. A gente vem lutando muito em um trabalho de convencimento de deputados para a PEC não ir adiante, até porque a redução não resolverá os problemas do Estado", disse o diretor científico da Faperj, Jerson Lima Silva.

Conforme levantamento de Lima Silva, o Estado contribuiu com 36% da pesquisa sobre dengue no País e 20% dos estudos sobre doenças negligenciadas, como malária e tuberculose. "Tudo está sob risco", disse.

Só em julho

O neurocientista Pablo Trindade, bolsista de pós-doutorado, voltou recentemente dos Estados Unidos. Está com a bolsa em atraso há um mês. A previsão é de que a defasagem só será acertada em julho. Ele trabalha no Laboratório Nacional de Células Tronco Embrionárias (Lance), coordenado por Rehen, e fez parte do grupo que se revezou em turnos de 24 horas para acompanhar a infecção de zika em modelos que representam o cérebro de feto humano. A bolsa de fevereiro está prevista para ser depositada em 14 de abril.

"O laboratório retirou dinheiro da compra de insumos para me pagar. Quando receber, vou devolver. É humilhante ter de depender de ajuda da família a essa altura da vida", afirmou.

Presidente eleito da Academia Brasileira de Ciências, o físico Luiz Davidovich diz que a crise na Faperj preocupa muito. "A agência tem tido papel muito importante para o avanço da ciência no Rio, com ações muito variadas que trazem impactos à população, como a sobre zika, que já dá resultados."

Ele lembrou que a interrupção do financiamento tem consequências graves por desmantelar redes de pesquisa que levaram anos para serem formadas. "Essa crise ocorre porque o Estado do Rio tem dependência forte dos royalties. É mais uma razão para investir em pesquisa. É a ciência que vai levar a novas fontes de energia e agregar valor à produção."

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Clarissa Thomé