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Brasileiro vê sódio como principal "vilão" da dieta, mostra pesquisa

Ana Sachs

Do UOL, em São Paulo

09/08/2012 07h00Atualizada em 09/08/2012 12h26

Culpa, peso na consciência, ansiedade. Todo mundo já sentiu algo assim ao se deparar com pratos gordurosos, calóricos ou cheios de açúcar. Mas mais do que algo momentâneo, a preocupação com o que se coloca no prato está virando uma tendência entre os consumidores brasileiros.

A conclusão é da segunda edição da pesquisa Os Hábitos Alimentares dos Brasileiros, feita em 2011 pela consultoria de estudos comportamentais sobre o consumidor Toledo Associados em parceria com mais de 20 empresas. Foram 28 grupos de discussão e 3.000 estudos de caso, em 10 capitais. Participaram homens e mulheres de 17 a 65 anos, em igual proporção, das classes A, B, C e D.

Há uma maior consciência de que o que se come hoje poderá refletir em risco de doenças futuras e o sódio é visto como o grande “vilão” do momento – no levantamento anterior, feito em 2006, essa posição era ocupada pelo açúcar.

Entre as doenças que mais preocupam estão: a hipertensão (65%), o diabetes (63%) e o colesterol alto (54%), em especial entre os mais velhos. A obesidade, por sua vez, ficou em quarto lugar, com 45%, e preocupa mais os mais jovens.

Com acesso a mais e melhores alimentos graças ao incremento da classe C, o brasileiro está comendo de forma mais consciente. O aumento da obesidade em todo o país, que já atinge cerca de 48% da população, segundo dados do Ministério da Saúde, e a preocupação com a saúde e qualidade de vida, em especial entre idosos, delineiam este atual cenário.

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    O brasileiro está mais consciente de que o que coloca no prato pode ter impacto na sua saúde

“A alimentação deixou de ser um ato automático e tradicional para se tornar consciente e reflexivo”, avalia a antropóloga Lívia Barbosa, especialista em comportamento do consumidor. “Mesmo quem não quer se preocupar, acaba se preocupando. O prato é hoje um campo de batalha e o brasileiro está a todo tempo tentando contrabalancear as diversas pressões em relação à alimentação”, continua ela.

Outra grande mudança foi na forma como se encara a alimentação. “Ela passou de um ato cotidiano para um momento ritualístico, ligado ao prazer”, diz. Comer se transformou em lazer, virou um programa, e o gasto da população com comida chega a patamares da Europa e dos EUA nas classes A e B.

Segundo o levantamento, 70% dos entrevistados disseram comer fora de casa, contra 54% em 2006. Há uma diferença, no entanto, entre as refeições fora de casa no fim de semana, que é vista como lazer, e a durante a semana, que é vista como obrigação.

Essa tendência de alimentação como lazer é evidenciada pela maior preocupação com a qualidade e a forma com que se come do que antigamente, com o surgimento de novos utensílios para cozinha e toda uma estética ligada ao local. “Antes ali era uma área meio abandonado da casa. Hoje, é um dos primeiros locais que se reforma”, afirma a antropóloga.

Para os brasileiros, o café da manhã ainda é a refeição mais importante do dia e, graças ao crescimento da classe C no país, a mesa do desjejum no país ganhou novos itens, como queijos, cereais e frios.

Já o almoço é uma refeição central, que precisa ter sustância, segundo a pesquisa. O quilo ganhou novo status, como uma opção de comida mais leve e saudável para quem não pode comer em casa durante o expediente. Já no final de semana o que se procura é lazer e sociabilidade, sem tanto controle do que se irá comer.

O jantar precisa ser prático, mas não por isso menos saudável, aponta a pesquisa. Cerca de 40% dos entrevistados disseram substituí-lo por lanches e derivados de leite, como queijo e iogurte, e pratos congelados de fácil preparo. A comida processada, tida como vilã no passado, hoje é vista de forma mais amistosa, como uma aliada. No levantamento, 48% disseram comprar comida fora e levar para a casa.

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    A questão da obesidade tem impulsionado o brasileiro a pensar melhor no que come

Em todas as faixas etárias, os entrevistados notaram melhora em sua alimentação nos últimos cinco anos. A exceção fica por conta da faixa entre 17 e 24 anos, que diz se alimentar de forma pouco saudável. É nesta fase que alguns jovens saem de casa, tem de “se virar” para se alimentar e acabam comendo na rua, sem horário.

Segundo a pesquisa, a televisão é o meio pelo qual 66% dos brasileiros mais se informam sobre alimentação. Atualmente, há na TV 25 shows semanais de alimentação e gastronomia na TV brasileira.

Obesidade

A questão da obesidade crescente fica evidente quando se avalia o percentual dos que fazem dietas: 24% das mulheres e 16% dos homens.

Outros dados também revelam essa preocupação cada vez maior dos brasileiros com a balança. Dos entrevistados, 34% fazem alguma atividade física, sendo a caminhada a mais praticada (63%), principalmente entre as mulheres mais velhas, seguida de futebol (25%) e musculação (19%).

Cresceu também a noção de que uma comida saudável também pode ser gostosa, algo que não se notava no levantamento anterior.  “Em 2006, saudabilidade era o oposto de gostoso na visão dos entrevistados. Agora a percepção é de que é possível ter prazer com um alimento saudável, o que sinaliza uma mudança de postura, menos radical”, observa Lívia.

O homem, que em 2006 dizia ter entrado no mundo da alimentação pelo prazer, agora também participa do dia a dia na cozinha de casa. Hoje, 34% ajudam a mulher a fazer o jantar em casa, contra 13% no levantamento anterior. E 58% participam da compra dos alimentos, contra apenas 14% em 2006.

Ato político

Hoje, se alimentar deixou de ser apenas um ato para suprir uma necessidade biológica, mas tem implicações políticas. “A alimentação adquiriu centralidade, pois tem ligação com políticas públicas, agricultura familiar, emissão de carbono na atmosfera. O Estado está na mesa da nossa cozinha, discutindo com os movimentos sociais o que se deve comer”, fala a antropóloga.

O Estado deixou de ter um papel passivo e restrito para um papel pró-ativo, definindo o que é boa alimentação e o que se deve comer. O fato é comprovado pela pesquisa: 87% dos entrevistados avaliam como positiva a atuação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), órgão citado pela primeira vez no levantamento.

O brasileiro se apresenta mais flexível quando o assunto é comida. Em outros países, vegetarianos têm seus próprios restaurantes, sem se misturar. No Brasil, é possível comer em um único local comida vegetariana, carnes, massas, pizza, sushi, tudo isso para agradar a família toda.  “Aqui, mistura-se diferentes tradições alimentares para todos poderem ir juntos a um restaurante, algo impensável na Europa, por exemplo”, explica Lívia. “O brasileiro não é radical. Ele opta pela sociabilidade em detrimento da ideologia”, diz.