Testes genéticos para prever resposta a medicamentos ainda são incipientes no Brasil

Tatiana Pronin

Do UOL, em São Paulo

  • SXC

    Desde o sequenciamento do genoma humano surgem estudos que associam variações genéticas à resposta do organismo a determinados medicamentos

    Desde o sequenciamento do genoma humano surgem estudos que associam variações genéticas à resposta do organismo a determinados medicamentos

Um remédio que funciona bem para uma pessoa nem sempre produz o mesmo efeito em outra. E a mesma substância pode causar efeitos colaterais graves a uma parcela da população. Há muitos fatores envolvidos nessa diferenciação, mas, em alguns casos, a explicação pode estar na genética.

Desde o sequenciamento do genoma humano surgem estudos que associam variações genéticas à resposta do organismo a medicamentos. A partir dessas pesquisas, são desenvolvidos exames para guiar os médicos na prescrição – são os chamados testes farmacogenéticos. Muitos deles já estão disponíveis no Brasil e são de grande utilidade no tratamento do câncer, da Aids e de doenças cardiovasculares.

Embora o potencial seja enorme, a área ainda é incipiente, especialmente no país. "Apenas sete medicamentos contêm recomendações para que seu uso seja acompanhado de testes farmacogenéticos nos Estados Unidos, nenhum no Brasil", comenta o geneticista Sérgio Pena, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e proprietário do Laboratório Gene – Núcleo de Genética Médica.

Há alguns anos, o laboratório de Pena oferece testes genéticos para identificar o risco de complicações com o uso de drogas como a varfarina (anticoagulante), o clopidogrel (para prevenir coágulos sanguíneos e evitar ataques cardíacos) e as estatinas (para baixar os níveis de colesterol).

Existem variações genéticas que comprovadamente fazem com que essas substâncias provoquem reações indesejadas em alguns pacientes. No caso da varfarina, o teste pode trazer mais segurança aos médicos na hora de prescrever a droga, que em doses elevadas pode causar sangramentos. "Estudos estimam que metade dos pacientes que poderiam se beneficiar com a terapia não está recebendo uma dosagem suficiente", afirma o médico Guido May, diretor da GnTech Tests.

Ocorre que os medicamentos são metabolizados por enzimas, que por sua vez agem de acordo com o que prevê o código genético. "Tem gente que toma um remédio e ele não produz o efeito esperado porque a pessoa o elimina muito rápido. Já outras eliminam devagar e se intoxicam com a substância", resume o infectologista Ricardo Diaz, diretor médico do Centro de Genomas.

Câncer e Aids

Uma das áreas que tem se beneficiado da farmacogenética é a oncologia. Um dos exames já feitos no país é o que identifica uma variação que aumenta o risco de efeitos adversos com o irinotecano, usado em casos de câncer de colo e de reto. Em relação a tumores de mama, há testes como o que avalia a sensibilidade ao trastuzumab.

Diaz também cita os exames realizados na área de infectologia, como os testes para avaliar a metabolização de drogas anti-HIV. É o caso de um exame que afere uma variação genética, comum a cerca de 5% da população, que gera uma reação alérgica grave ao abacavir.  Diaz conta que também já há testes para outros fármacos usados no tratamento da Aids, como o efavirenz, o atazanavir e o tenofovir.

Apesar da utilidade inquestionável desses testes, é preciso considerar um fator importante: ter uma variação genética que foi associada ao câncer, por exemplo, não significa que a pessoa desenvolverá a doença ao longo da vida. E isso também é válido na área de farmacogenética. "Se você tem um gene que determina que seu olho será azul, você terá olho azul. Já a doença você pode ter ou não", simplifica Diaz. "Isso às vezes deixa o médico inseguro em relação ao teste."

Os preços, bastante elevados, são outro obstáculo – eles ainda não são cobertos pelo governo ou por planos de saúde.

Também existe uma série de outros fatores envolvidos na metabolização dos medicamentos que não necessariamente dependem da genética, como a interação com outras drogas e problemas gastrointestinais, só para citar alguns exemplos.

Por último, é preciso levar em conta que, de tempos em tempos, os cientistas descobrem novas variações genéticas associadas à metabolização dos fármacos – o que pode eventualmente exigir o aperfeiçoamento de um teste disponível no mercado. A qualidade do laboratório, nesse caso, é fundamental para garantir resultados mais precisos.

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