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Índia formada em medicina quer atuar em reservas porque "são rejeitadas"

Wilses Tapajós (centro) recebe o diploma de medicina das mãos do cacique de sua aldeia (de cocar)  - Bianca Zanella/Dicom-UFT
Wilses Tapajós (centro) recebe o diploma de medicina das mãos do cacique de sua aldeia (de cocar) Imagem: Bianca Zanella/Dicom-UFT

Camila Neuman

Do UOL, em São Paulo

04/09/2013 07h00

A primeira índia formada em medicina pela UFT (Universidade Federal do Tocantins), Wilses de Sousa Tapajós, 44, quer participar do Programa Mais Médicos do governo federal para atuar em territórios indígenas que, segundo ela, são rejeitados.

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“Apesar de não concordar 100% com o programa, porque acho que teria que priorizar a estrutura [das cidades], como não vou querer um programa que vai para as áreas indígenas que todo mundo rejeita?”, afirmou.

Recém-formada em medicina --a formatura foi em 22 de agosto--, Wilses teve de esperar o recebimento do registro profissional para tentar um lugar no Mais Médicos.

“Recebi meu CRM na sexta-feira (31) e quando tentei me inscrever, a seleção da primeira fase já tinha acabado. Mas vou tentar de novo”, disse.

Foco nas minorias: "é de onde vim"

Wilses é uma índia tapajó, nascida no território Cobra Grande, no Pará, região às margens do rio Tapajós, a cinco horas de barco de Santarém --a principal cidade do oeste do Pará e a terceira mais populosa do Estado, segundo o IBGE.

Apesar da origem, a médica foi estudar em Santarém aos sete anos, onde completou o estudo fundamental e médio, até se mudar para Belém, onde se formou em enfermagem na Universidade Estadual do Pará em 1995.

Dois anos depois, já trabalhando como enfermeira de um hospital público de Nova Rosalândia, no Tocantins, o sonho de fazer medicina se tornou possível quando a UFT abriu cotas para indígenas.

“Minha ideia não era fazer medicina para ganhar dinheiro e ficar rica, mas era de trabalhar com dignidade e focar nas minorias, que é de onde eu vim”, contou.

Engajamento ajuda programa

No programa que recruta médicos brasileiros e estrangeiros para municípios onde faltam doutores, 1.096 profissionais serão enviados para unidades básicas de saúde em 454 municípios e 16 distritos de saúde indígena do país, segundo o Ministério da Saúde.

O Tocantins vai receber 40 médicos que serão distribuídos por 11 municípios e em um DSEI (Distrito Sanitário Especial Indígena). Destes, 20 são estrangeiros, dos quais 16 cubanos, e 19 brasileiros.

Para Wilses que, além das duas faculdades, é especialista em Saúde Indígena, a atuação do profissional pode ser fundamental para o êxito do Mais Médicos.

“Só levar médico não resolve. Mas se o profissional for envolvido com a comunidade, começar a solicitar, cobrar autoridades, pode ser um lado positivo do programa”, disse.

Onde falta médico, faltam dentistas e enfermeiros, mostra pesquisa

A concentração de médicos nos grandes centros acompanha a de outros profissionais de saúde, como dentistas e enfermeiros, e a de unidades de saúde. Onde falta um, faltam os outros.

É o que o mostra um recorte da pesquisa Demografia Médica no Brasil, que se baseou em dados da AMS (Assistência Médico-Sanitária) do IBGE, que conta os postos de trabalho ocupados por profissionais de saúde