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Sem transporte público, morador tem de andar quilômetros até posto de saúde

Camila Neuman

Do UOL, em São Paulo

09/09/2013 06h00

Além da falta de médicos, os moradores do extenso distrito de Marsilac precisam enfrentar longas distâncias para conseguir atendimento médico. Isso porque, por ser predominantemente rural, os 8.258 moradores do distrito vivem espalhados por 200 km² dos 1.521 de km² da cidade de São Paulo, segundo o IBGE, onde em boa parte o transporte público não chega.

  • Arte UOL

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A desempregada Maria Rosembaun, 40, moradora da estrada da Ponte Seca, disse que precisa andar quilômetros se quiser ser atendida na UBS Dom Bergamini, mais conhecida como posto do Matão ou da Ponte Seca. O local é de difícil acesso, com rua de terra e uma subida bastante íngreme, que dá no alto da igreja Dom Bergamini – aberta somente nos fins de semana. A distância de sua casa até a UBS a faz muitas vezes desistir de cuidar da saúde.

“Se depender de eu ir lá no Matão, vai ser difícil. É muito longe. Se eu for sozinha, é uma hora e meia de caminhada, mas, se for com criança, é umas duas horas. Prefiro ir para Parelheiros”, disse.

Um de seus sete filhos apresentou um problema em um dos ouvidos há quatro anos, mas nunca recebeu um diagnóstico no posto de saúde local.

“Saia um líquido fedido da orelha dele, mas disseram que não era nada. Hoje ele está com 16 anos, está bem, mas acho que está meio surdinho”, disse.

Cheiro de novo

Mesmo de carro, não é nada fácil chegar à UBS Dom Bergamini. A reportagem demorou quase uma hora para encontrar a unidade, a partir do centro de Marsilac, depois de percorrer várias e estreitas ruas de terra molhada pela fina garoa que caía, na última quarta-feira (4). A sinalização também é precária, feita por placas de madeira e setas pintadas com tinta em árvores.

Por volta das 13h30 da quarta, não havia nenhum paciente na sala de espera nem no atendimento.

Durante a visita do UOL, havia uma enfermeira no local e outros três funcionários que não quiseram se identificar, além de um segurança. A recepção conta com quatro computadores e duas impressoras aparentemente novas. Tudo estava muito limpo, como se tivessem sido pouco usados - a placa de inauguração da UBS Dom Bergamini é de 20 de abril de 2001. Os dois consultórios estavam vazios.

A UBS é tão afastada que uma van da prefeitura leva e trás os funcionários de segunda a sexta-feira. Durante a visita do UOL, o motorista da van chegou às 14h30 e disse que os funcionários já estavam indo embora. A reportagem permaneceu no local até as 15h, e a unidade ainda estava aberta. Durante o período, ninguém apareceu para ser atendido.

Vizinha da UBS, a dona de casa Idelfina Rodrigues, 62, disse que o posto está sem médico há um mês e que “por isso que não estava mais cheio”. Mas, segundo ela, “geralmente o atendimento é tranquilo”.

Rodrigues disse que tinha marcado havia dois meses uma consulta com o médico para sexta-feira (6), às 9h. A reportagem entrou em contato com a dona de casa no mesmo dia e ela confirmou ter sido atendida às 11h. “Como tinha muita consulta agendada, acabou atrasando a minha. Mas o médico veio e é muito bonzinho”, disse.

Sem substituto

A Secretaria Municipal de Saúde confirmou que o médico da unidade estava de férias e que voltou ao trabalho na quinta-feira (5), um dia depois da visita do UOL. No período, os moradores da região ficaram sem atendimento médico, já que a unidade conta com apenas um profissional, que não foi substituído.

A falta de médico na região fez com que a dona de casa Gislene Aparecida, 42, moradora da ponte Seca, tivesse que ir a uma unidade de Parelheiros para receber atendimento. Para chegar até lá, ela precisou caminhar por uma hora e meia e percorrer por mais 35 minutos de ônibus.

“Sei que aqui está sem médico, então tive que ir à AMA [Assistência Médica Ambulatorial] de Parelheiros. Mas lá demorou muito para eu ser atendida, porque é muita gente para pouco médico”, disse.

Onde falta médico, faltam dentistas e enfermeiros, mostra pesquisa

A concentração de médicos nos grandes centros acompanha a de outros profissionais de saúde, como dentistas e enfermeiros, e a de unidades de saúde. Onde falta um, faltam os outros.

É o que o mostra um recorte da pesquisa Demografia Médica no Brasil, que se baseou em dados da AMS (Assistência Médico-Sanitária) do IBGE, que conta os postos de trabalho ocupados por profissionais de saúde