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Por mais saúde e menos trânsito, paulistanos cruzam a cidade a pé e de bike

O técnico em informática Roberson Miguel, 34, perdeu 20 kg ao trocar o carro pela bike - Arquivo pessoal
O técnico em informática Roberson Miguel, 34, perdeu 20 kg ao trocar o carro pela bike Imagem: Arquivo pessoal

Camila Neumam

Do UOL, em São Paulo

16/09/2014 06h00

Por motivos de saúde e para ter mais qualidade de vida, alguns paulistanos deixaram de depender do carro para se locomover pela cidade. Seja de metrô, ônibus, bicicleta ou a pé, cada um achou formas de fugir do trânsito e do estresse que ele causa. O novo estilo de vida trouxe mudanças na aparência, no modo de se vestir e de ver o melhor e o pior da cidade.

O técnico de informática Roberson Miguel, 34, usa a bicicleta como seu principal meio de transporte para o trabalho e lazer. Ele se desloca todos os dias do Jardim Peri, bairro na zona norte de São Paulo, até a empresa onde trabalha, na Lapa, zona oeste, onde seu expediente começa às 7h. Faz o trajeto de 12 km em meia hora na magrela. Quando usava o carro, gastava quase o triplo do tempo.

A troca foi feita, primeiramente, para economizar, pois o financiamento do veículo comprometia boa parte de sua renda. Quando começou a perder peso, ele percebeu o quanto as pedaladas estavam sendo benéficas à sua saúde. Em três anos, o técnico de informática perdeu 20 kg, foi de 108 kg para 88 kg.

“Eu utilizo a bicicleta em quase 100% dos meus trajetos. Faço atendimento aos meus clientes com ela, transportando alguns materiais para trocar peças. Tenho bagageiro, instalei paralamas e uso um poncho de gaúcho como capa de chuva", diz.

O hábito o fez conhecer outros ciclistas e, com eles, mudar também hábitos e alimentação.

“Durante a semana fico no frango, no peixe e nos legumes. Carne vermelha eu aboli da minha dieta. Percebi que minha alimentação é meu combustível”, diz Roberson Miguel.

O jornalista Marcos de Sousa, 60, também adotou a bicicleta por causa de uma artrose no joelho, consequência de horas diárias parado em congestionamentos da Serra da Cantareira, na zona norte de São Paulo, até a região central e seu retorno.

"Os médicos diziam que eu tinha de andar menos de carro. Eu me mudei para perto de um metrô, comecei a andar de bicicleta, fazer hidroginástica e as dores desapareceram. Tudo isso mudou a minha vida e a minha percepção de cidade", afirma.

Hoje, o jornalista trabalha no portal Mobilize Brasil, que divulga estudos e projetos sobre mobilidade urbana.

Mais tolerância

Paula Souza, 31, turismóloga, anda mais de 10 km no trajeto do trabalho na USP, zona oeste de São Paulo, até o Itaim Bibi, na zona sul - Arquivo pessoal/Paula Souza - Arquivo pessoal/Paula Souza
Pedestre convicta, Paula Souza, 31, emagreceu e tem mais disposição após criar o hábito
Imagem: Arquivo pessoal/Paula Souza

A turismóloga Paula Vianna Souza, 31, prefere andar quilômetros do Itaim Bibi, na zona sul, até a Cidade Universitária, onde está localizada a USP (Universidade de São Paulo), na zona oeste, do que enfrentar horas dentro de um ônibus ou metrô lotados. Tudo por convicção, pois vendeu o carro que havia ganho dos pais e deixou o salto alto para trás. O hábito a fez emagrecer, se sentir melhor e mais tolerante com os percalços no caminho.

“Perdi peso, me sinto mais disposta", diz. "Mas há uma questão mais psicológica do que fisiológica porque me sinto menos estressada e mais positiva do que quando tinha carro. Fico mais tolerante até com o buraco na calçada, com a pessoa que jogou o carro em cima de mim, com o ônibus quebrado do que quando estou dentro de um carro”.

Os caminhos são escolhidos a dedo por ela. Paula tem de se preocupar com o sol, chuva e vias que estejam cheias de carros. Por isso, não raro alterna as caminhadas com o uso do transporte público.

Convivência difícil

O jornalista Marcos de Sousa, 60, adotou a bicicleta por causa de uma artose no joelho, consequência de horas diárias parado em congestionamentos São Paulo. Recuperado, nunca mais deixou a magrela - Arquivo pessoal/Marcos Sousa - Arquivo pessoal/Marcos Sousa
O jornalista Marcos de Sousa, 60, curou uma artose no joelho após adotar a magrela
Imagem: Arquivo pessoal/Marcos Sousa

Embora haja menos estresse nas ruas do que dentro do carro parado, segundo alguns motoristas, a convivência com os automóveis nas avenidas de São Paulo ainda é considerada perigosa e difícil.

O técnico em informática Roberson Miguel diz se sentir ameaçado ao passar por avenidas onde há pouco espaço --ou nenhum-- voltado a bicicletas.

"É difícil a convivência em avenidas com pouco espaço, mas no restante [da cidade] há alguma convivência pacífica. São poucos que atentam contra os ciclistas e os que fazem isso vão virar manchete de jornal", diz.

Para Paula Souza, pedestre convicta, a cidade ainda não se preocupa com quem anda a pé. Ela torce para que haja mais engajamento, como o que vem sendo demonstrado pelos ciclistas, que veem suas reivindicações serem concretizadas nas ciclovias inauguradas pela capital paulista.

“O pedestre é invisível nas políticas urbanas. As pessoas ainda não respeitam a faixa, não enxergam o pedestre como um ser mais vulnerável na escala da mobilidade. Sinto isso na pele todos os dias. Você se sente ameaçado. Os ciclistas já conseguiram outro status”, afirma. 

Para o jornalista Marcos de Sousa, encarar a cidade ainda soa como um desafio, mas é a melhor maneira de conhecê-la.

“[Ao andar pela rua] você enxerga tudo de bom e ruim em São Paulo; vê a dificuldade de atravessar as pontes, por exemplo. Talvez a maneira mais efetiva de as pessoas ganharem consciência é fazer pequenas caminhadas até o cabeleireiro, à academia. Parece difícil porque a cidade é muito agressiva no começo, você se sente ameaçado, mas é uma experiência fundamental para ganhar consciência e aprender sobre a cidade em que se vive”.