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Mulher deve ser informada sobre riscos do parto normal, diz especialista

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Thiago Varella

Colaboração para o UOL, em Campinas (SP)

02/09/2016 06h00

Desde 2010, o número de cesáreas superou o de partos normais no Brasil, o que supera muito o recomendado pela OMS (Organização Mundial de Saúde), que é de 15%. Por isso, de uns tempos para cá, existe um movimento muito forte de defesa do parto vaginal. 

Mas, o parto normal é sempre a melhor opção para se ter um filho? É isso que questiona o médico alemão Hans Peter Dietz. Esse professor da Universidade de Sydney, na Austrália, é PhD em uroginecologia e estuda as disfunções no assoalho pélvico. Em entrevista ao UOL, ele afirmou que existem vários riscos para a mulher que escolher dar à luz por parto normal e que isso também deveria ser dito a elas.

Segundo o médico, existe a chance de a mulher sofrer laceração no assoalho pélvico, que é o músculo que sustenta os órgãos da pélvis, causando incontinência de urina ou fezes, além de dor. A chance é maior no primeiro filho e, quanto mais velha for a mãe, maior será o risco da lesão.

De 15% a 25% das mulheres, que tiveram seu parto normal, apresentam sérias lesões no músculo do assoalho pélvico. Mas 90% dos casos não são visíveis para o médico" Hans Peter Dietz

Dietz diz que essa é uma descoberta recente e ainda não está na maioria dos livros didáticos. O mais comum é falar do trauma perineal, que é a laceração da entrada da vagina. Segundo o especialista alemão, até 20% das mulheres que optam por parto normal sofrem disso.

A decisão é da mulher

No Reino Unido, pela primeira vez, as grávidas serão informadas sobre os riscos do parto normal e da cesárea. A decisão vem na esteira do caso de um bebê que sofreu danos cerebrais durante o parto vaginal. A mãe corria perigo pois tinha pélvis pequena e sofria de diabetes, mas não foi informada sobre os riscos.

Para Dietz, as mulheres que sofrem mais risco durante o parto normal são as acima de 30 anos, as diabéticas, ou as que têm bebês grandes. Essas precisam ser informadas do perigo que podem sofrer. No entanto, segundo o médico, informar sobre possíveis problemas, não significa tomar a decisão no lugar da mãe.

"Eu não acho que os médicos devem dizer às mulheres como elas devem parir. As mulheres devem tomar essa decisão. Mas para tomar uma decisão baseada em informação científica. Por isso, elas precisam ser informadas corretamente e precisam ter a oportunidade de questionar quem entende do assunto. Sempre vai ter alguém com 40 anos e um bebê de mais de 3 quilos que quer parto normal. E também mulheres jovens com bebês pequenos que optam por uma cesárea marcada. É estúpido convencer uma mulher sobre o parto. Essa é uma decisão que não deveria ser tomada por políticos ou militantes ou sei lá qual tipo de administrador. Só as mulheres podem decidir", diz.

"Existem mulheres para as quais o parto normal é a melhor opção. Mulheres jovens, que não estão com sobrepeso, que tem bebês pequenos, que não tem complicações médicas" Hans Peter Dietz

Exercício para assoalho pélvico - Reinaldo Canato/UOL - Reinaldo Canato/UOL
Existem diversos exercícios que trabalham o assoalho pélvico
Imagem: Reinaldo Canato/UOL
O obstetra Eduardo Cordioli concorda que a mulher deve ser informada sobre todos os riscos, tanto do parto normal quanto da cesárea. No entanto, para ele, não é possível definir qual parto é melhor a partir apenas da idade da mulher.

"O grande problema da medicina é colocar rótulos. Às vezes uma mulher de 36 anos ativa é muito mais saudável. Não dá para rotular. Aí é que entra a figura do médico de verdade", afirmou.

Para Cordioli, o problema da falta de informação não se restringe apenas aos partos. "Todo paciente aqui no Brasil, seja cardíaco ou ortopédico, recebe informações restritas. Precisamos promover educação do paciente, empoderar o paciente para ele tomar a decisão e arcar com os riscos dessa decisão", disse.

Ainda segundo o médico, o problema no Brasil não é a quantidade de partos normais ou de cesáreas. A espetacularização do parto é o que mais preocupa.

"O que existe hoje é que algumas pessoas estão preocupadas em ter um parto mais exótico do que dar um parto saudável. Algumas pessoas estão preocupando mais com a experiência do que com o resultado. A gente quer que a mãe e o bebê estejam bem no final do processo reprodutivo. E tenham tido a melhor experiência possível. Algumas pessoas invertem, criticou.

Dietz pensa de maneira parecida. "Na obstetrícia, parece que o momento do parto é mágica. Ciência e pensamento racional não importam. Por exemplo, há a questão da dor. Em todas as áreas médicas, a gente sempre tenta evitar a dor em todos os casos. Mas no parto, as mulheres devem aguentar a dor porque assim seriam fortes. Isso é nonsense. Não faz o menor sentido", afirmou.