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Jovem portador de HIV encara vírus sem drama com diário na web

Felipe Pinheiro

Do UOL, em São Paulo

01/12/2016 06h00

"Eu acabei de descobrir que tenho HIV". Era dia da mentira, o 1º de abril, quando Gabriel Comicholi, de 21 anos, inaugurou seu diário online para contar o irrefutável resultado de dois exames.

O ator acreditava que poderia estar com caxumba, suspeita que o levou a pedir uma série de exames - inclusive o que apontaria a presença do vírus da Aids. A espera pelo resultado foi difícil, ainda mais do que a descoberta.

"Foi meio tenso. Entrava todos os dias na internet para olhar o site do laboratório e não saía nunca [o exame conclusivo]. Depois que saiu, foi tudo mais tranquilo. [A descoberta] não foi tão difícil porque eu já estava esperando que isso fosse acontecer. Eu soube que quando dá reagente da primeira vez, a possibilidade do segundo [exame] também dar é muito grande. Por isso já estava psicologicamente preparado", conta.

De temperamento tranquilo, Gabriel encontrou uma maneira "sem drama", como ele gosta de dizer, de lidar com a notícia. Três dias depois de confirmar que era soropositivo, publicou seu primeiro "HDiário" (como chama seus vídeos) no canal que leva seu nome no YouTube.

"Eu falei: tenho que fazer alguma coisa. [A descoberta do vírus] veio para mim como uma missão mesmo. Eu sempre penso que, se alguma coisa veio para a sua vida é por alguma razão. Eu ia fazer o quê? Ficar trancado em casa? Essa foi a melhor maneira que eu encontrei para lidar com isso", diz.

O canal é meu psicólogo. Eu interajo com as pessoas, leio muita coisa e isso me ajuda muito. Eu vejo que não estou sozinho nessa. Essa troca é muito boa”

O primeiro vídeo alcançou mais de 150 mil visualizações em um intervalo de sete meses, sendo disparado o mais acessado do canal que traz o dia a dia de Gabriel. O assunto principal é a divulgação de informações sobre o HIV, com temas como o tratamento, vida amorosa e qual a melhor maneira de contar para um "crush" que é um portador do vírus.

"Eu nunca precisei chegar em alguém e falar, 'olha, tenho HIV'. Isso nunca aconteceu por conta do canal. Mas as pessoas têm muito receito de falar, não sabem se contam antes do encontro ou depois... Existe muita dúvida", afirma.

A dica do jovem ator para um portador do vírus é contar a verdade de maneira leve, que não pareça o anúncio de uma tragédia. Essa foi a forma que ele encontrou para contar aos pais, os únicos que souberam que ele havia contraído HIV antes do canal.

"Como eu sou muito tranquilo, eu não ia marcar uma reunião e fazer todo mundo sentar em uma mesa redonda para falar: Estou com HIV. Eu morava no Rio e chamei minha mãe, que é de Curitiba, pelo Skype. Disse para ela, tenho uma coisa para falar: preciso ir ao dentista, estou com uma cárie e estou com HIV. No dia seguinte fui a Curitiba e contei para o meu pai", lembra.

Além de se mudar para a capital paranaense e virar um youtuber, diz que sua vida praticamente não mudou após o vírus do HIV. "Não posso mais cortar meus pulsos e dar para os amigos beberem o meu sangue (risos). Não tem mudanças drásticas", diz ele.

Os haters não contam

Gabriel Comicholi espera com seu canal ajudar a manter em debate o assunto, que ele acredita ser lembrado menos do que deveria pelos meios de comunicação.

"Em pleno século 21, as pessoas se fecham para alguns assuntos, e o HIV é um deles. Ninguém fala mais desse assunto. A mídia esqueceu. Só se fala antes do Carnaval. É um assunto que não pode morrer e que precisa ser falado o ano inteiro", avalia. 

Ele diz que até hoje não sofreu preconceito e não leva em consideração o que lê de haters: "O que eles falam não deve nem ser categorizado como preconceito porque estão ali para isso, eles nunca vão mudar de opinião. Então, eles não contam".