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Homem morre após 11 consultas médicas; mãe vê negligência: "ele só piorava"

Junior Carrion morreu após 11 consultas; ele não foi diagnosticado com pneumonia - Reprodução/Facebook
Junior Carrion morreu após 11 consultas; ele não foi diagnosticado com pneumonia Imagem: Reprodução/Facebook

Lucas Borges Teixeira

Colaboração para o UOL

20/11/2017 13h13Atualizada em 20/11/2017 15h59

Um homem de 34 anos morreu após passar por 11 consultas e não ser diagnosticado com pneumonia, no interior de São Paulo, no começo de novembro. A família acusa hospitais de negligência médica no caso e o Conselho Regional de Medicina (CRM) diz que irá apurar as circunstâncias da morte de Junior César Pinheiro Carrion.

Ele começou a se sentir mal no final do mês de setembro. Acompanhado da mãe, Dalva, Carrion foi à Santa Casa de Guará, que fica a cerca de 430 km de São Paulo, onde foi diagnosticado com um resfriado.

Como o filho não melhorou após a primeira consulta, Dalva conta que o levou no dia 9 de outubro para o Hospital e Maternidade São Jorge, em Ituverava, cidade vizinha. “Ele estava com falta de ar e tossia muito”, lembra a mãe. De acordo com a empregada doméstica, lá, a médica afirmou que ele estava com a gripe H1N1.

“Ela disse que não precisava de exames por causa do seu olho clínico”, conta a mãe em entrevista ao UOL. Após algum tempo sem melhora, ela voltou a levá-lo, com febre, ao hospital de Ituverava. “Fizeram exames, que indicaram anemia”, relata.

Junior e Dalva voltaram mais duas vezes a mesma unidade médica, onde ela teve seus pedidos de internação para acompanhamento recusados. “Ele estava respirando bem mal, chegaram até a passar remédio para ansiedade”.

Dalva decidiu, então, voltar à Santa Casa de Guará, no final de outubro, onde o filho fez tratamento de inalação. No dia 2 de novembro, porém, mãe e filho já precisaram retornar ao hospital., quando, segundo ela, a internação de Junior foi negada por “ser uma gripe e não caso de urgência”.

Mãe de Junior Carrion acusa os médicos de negligência; caso é investigado pelo CRMESP - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
Mãe de Junior Carrion acusa os médicos de negligência; caso é investigado pelo Conselho
Imagem: Reprodução/Facebook

No dia seguinte, Carrion acordou mais uma vez com falta de ar. “Fui desesperada à Santa Casa. Um outro médico atendeu e decidiu dar encaminhamento: colocou soro, oxigênio. Mas, quando voltei de casa para pegar umas frutas, já havia uma maca esperando por ele”, conta Dalva.

De acordo com a mãe, o hospital alegou que o paciente precisava com urgência de um neurologista, que a unidade não tinha, e deveria ser encaminhado ou para Ituverava ou para a Santa Casa de São Joaquim da Barra, cidade também próxima de Guará. Ela escolheu a segunda opção.

“Eles o colocaram em uma ambulância muito simples. Ele estava com falta de ar e estava muito quente, não tinha nem ventilador”, acusa Dalva. “Ele falou para mim que não ia conseguir. Quando chegamos lá, desci correndo, mas não teve jeito.”

Junior César morreu no local. Segundo a mãe, só em São Joaquim da Barra o filho foi diagnosticado com broncopneumonia bilateral, o que consta no atestado de óbito. “Ele tinha mais de dois litros de água no pulmão”, conta Dalva. “A negligência foi tão grande que eles já chamaram a polícia para registrar as péssimas condições em que ele foi enviado ao hospital.”

Além do boletim de ocorrência registrado em São Joaquim da Barra, o corpo de Carrion foi enviado ao Serviço de Verificação de Óbito (SVO) de Ribeirão Preto.

Depois de 11 passagens por diferentes médicos em diferentes hospitais, “fora as idas para inalação”, Dalva acusa os profissionais de saúde de negligência e diz que pretende acionar os órgãos competentes pelo tratamento que seu filho sofreu.

“Foi um descaso total passar por tantos médicos e não descobrirem uma pneumonia”, protesta a mãe. “Por que a Santa Casa [de Guará] não transferiu no dia que eu pedi? Eu vi que ele só estava piorando.”

“Ele era meu único filho, minha vida, só morávamos eu e ele”, lamenta a mãe.

Caso em apuração

O Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) afirmou ao UOL por meio de nota que abrirá uma investigação para apurar as acusações de negligência da Santa Casa de Guará, que pode durar entre seis meses e dois anos.

“Se, durante a fase de sindicância forem constatados indícios de infração ética, que consiste no descumprimento de algum artigo do Código de Ética Médica, passa-se à segunda fase: a instauração do processo ético-profissional”, explica o órgão. Os médicos passam por julgamento e, caso sejam considerados culpados, as penas podem ir de advertência confidencial em aviso reservado à cassação do exercício profissional.

Procurada pelo UOL, a Santa Casa de Guará não respondeu à solicitação de entrevista até o fechamento da matéria. O hospital abriu uma sindicância para apurar o ocorrido.

Em nota enviada ao UOL, a Santa Casa de São Joaquim da Barra afirma que Junior chegou ao local "sem encaminhamento formal, sem aviso prévio da situação e sem o acompanhamento médico que o caso requeria, apresentando instabilidade hemodinâmica (hipotenso, taquicárdico, respiração agônica e saturação de oxigênio)".

"[O paciente] foi atendido em caráter de emergência sendo enviado diretamente para sala apropriada e, apesar de todos os esforços e tratamento instituídos, evoluiu rapidamente para parada cardiorrespiratória", conclui a nota.

Ao UOL, a administração do Hospital e Maternidade São Jorge afirmou ainda não estar a par do caso e disse que irá consultar a médica responsável pelas consultas para averiguação.

A reportagem procurou o Serviço de Verificação de Óbito de Ribeirão Preto, mas não obteve resposta até o fechamento da matéria.