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USP faz primeira cirurgia para separar gêmeas siamesas unidas pelo crânio

Pais cuidam de Maria Ysabelle e Maria Ysadora em Ribeirão Preto - Marlene Bergamo/Folhapress
Pais cuidam de Maria Ysabelle e Maria Ysadora em Ribeirão Preto Imagem: Marlene Bergamo/Folhapress

Stefhanie Piovezan

Colaboração para o UOL, em São Carlos

17/02/2018 04h00

Um time composto por 30 profissionais realizará neste sábado (17), no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, a primeira de quatro cirurgias para separação de duas gêmeas que nasceram unidas pelo crânio.

O caso das meninas de 1 ano e 7 meses, Maria Ysabelle e Maria Ysadora, é raro. A incidência de craniópagos – siameses unidos pela cabeça – é de um a cada 2,5 milhões de nascimentos e, no Brasil, há apenas uma cirurgia de separação documentada. 

“Só temos publicado no país um caso e nele um dos gêmeos não tinha possibilidade de sobrevivência. No caso atual, as duas gêmeas são iguais, não há uma com mais condições do que a outra, e é a primeira vez que isso é registrado aqui”, diz o neurocirurgião Eduardo Jucá, um dos integrantes da equipe.

Coordenador da neurocirurgia no Hospital Infantil Albert Sabin, referência para casos de alta complexidade no Ceará, ele conheceu as crianças em julho de 2016, quando foram internadas na unidade. Foi dele a ideia de encaminhá-las para a FMRP-USP, onde se formou e se especializou.

"Ribeirão é um centro de excelência mundial em neurocirurgia pediátrica e, às vezes, não conhecemos as coisas aqui do nosso país. Como é o primeiro caso com essas características no Brasil, foi uma decisão lógica”, comenta.

O caso passou a ser analisado pelos profissionais da USP e foi definida a separação.

“Tem que haver um equilíbrio. Não se pode deixar ficar muito tarde porque senão as estruturas ficam muito rígidas para serem separadas, mas também não pode ser muito cedo porque senão as crianças têm dificuldade de suportar a cirurgia, que é de grande porte. Então o que tem sido feito nos poucos casos que já aconteceram no mundo é a operação por volta da faixa dos 2 anos de idade”, explica o médico.

Cirurgia - Getty Images - Getty Images
Imagem: Getty Images

Especialista já acompanhou 8 casos no mundo

A cirurgia será coordenada pelo neurocirurgião Hélio Rubens Machado e acompanhada pelo norte-americano James Goodrich, chefe do setor de neurocirurgia pediátrica do Montefiore Medical Center de Nova York e um dos maiores especialistas em craniópagos no mundo.

Ao longo da carreira, Goodrich foi consultado em 32 casos e em oito os gêmeos foram para cirurgia. “Cada caso tem sido único, com seus próprios desafios”, diz. 

Para se preparar, a equipe realizou diversas reuniões conjuntas, discussões de casos e análises de exames como ressonâncias e angiografias. Também estudou o molde tridimensional que foi confeccionado especialmente para a cirurgia e que mostra em detalhes como as cabeças estão unidas.

A parte mais difícil do processo é a separação dos vasos sanguíneos e, no final, lidar com o cérebro unido, o que pode ser bastante complexo.”

Uma de quatro cirurgias

A equipe optou por realizar a separação em quatro etapas. A primeira operação acontecerá neste sábado e as demais serão marcadas de acordo com a recuperação das crianças. Em média, o intervalo entre as cirurgias é de três meses.

“Nesse tipo de caso, se você faz uma separação gradual, o organismo tem mais tempo para se adaptar. O cérebro de cada paciente tem mais tempo de se adaptar à nova situação, em que tem que funcionar sozinho”, afirma Jucá.

Nas três primeiras cirurgias, a equipe realizará a separação gradual dos vasos sanguíneos e aplicará expansores de pele para que a região atualmente em contato possa se fechar. Na última, ocorrerá a separação de fato.

“Os riscos existem, é um desafio grande, mas o que precisava ser feito até agora do ponto de vista técnico foi feito. Se não houvesse chances reais de sucesso, a gente não tentaria fazer”, diz o neurocirurgião.