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Justiça condena prefeitura a indenizar mãe de jovem que morreu de dengue

Daiana Ingrid Najara Bastos - Acervo pessoal
Daiana Ingrid Najara Bastos Imagem: Acervo pessoal

Thiago Varella

Colaboração para o UOL, em Campinas (SP)

21/02/2018 04h00

A Justiça condenou a Prefeitura de Sumaré (cidade a 119 km de São Paulo) a pagar uma indenização de R$ 100 mil, por dano moral, à mãe de uma adolescente de 17 anos que morreu de dengue, em abril de 2014, por negligência médica.

A decisão foi proferida pelo juiz da 1a. Vara Cível da cidade, Gilberto Vasconcelos Pereira Neto, em primeira instância, no último dia 31 de janeiro. 

Além disso, a camareira Narjara Leal Moura, 41, também vai receber uma pensão de meio salário mínimo por sete anos, período em que sua filha, Daiana Ingrid Najara Bastos, continuaria morando com os pais, entre 18 e 25 anos de idade. A Prefeitura vai recorrer da decisão.

Segundo Narjara, no dia 23 de abril de 2014, a adolescente se queixou de dores de cabeça e foi levada até a UPA (Unidade de Pronto Atendimento) do Jardim Macarenko, em Sumaré, de responsabilidade do governo municipal. No local, a jovem foi medicada com dipirona e soro e liberada.

Mais tarde, no mesmo dia, Daiana voltou à UPA, pois não apresentou melhoras. Desta vez, a médica de plantão aplicou uma injeção e novamente liberou a adolescente. Sentindo-se fraca, a jovem teve de se deitar em um banco de praça, próximo à unidade, por cerca de 40 minutos, antes de voltar para casa, segundo a mãe.

No fim da noite, Narjara foi até o quarto da filha e a encontrou convulsionando. Ela contou com ajuda de um vizinho para levar a jovem novamente para a UPA. Encontraram a unidade, que fica aberta 24 horas, fechada. Uma enfermeira atendeu a família, mas disse que como o caso era dengue, que a paciente deveria esperar em casa.

Desesperada, a mãe exigiu que a adolescente fosse atendida. Segundo o processo, a médica de plantão agiu de maneira ríspida.

"A médica foi grossa, estúpida. Expliquei o caso para ela e ela, desprezando o caso, disse para a enfermeira deixar entrar. Mas eu jamais imaginaria que ela deixaria entrar, mas sem fazer nada por ela", disse a mãe.

Narjara passou um longo período sem ter notícias da filha e questionou uma outra médica sobre o estado da jovem. No entanto, a profissional não encontrou nenhum prontuário da adolescente. Uma faxineira foi quem contou à mãe que Daiana estava passando mal, sem receber nenhum tipo de auxílio.

Somente às 6h do dia 24, na troca de plantão, a médica que assumiu a UPA constatou que a jovem estava em estado grave e a transferiu ao Hospital Estadual de Sumaré. Daiana passou dois dias internada, mas não resistiu e morreu.

Narjara contou que Daiana era estudante do terceiro ano do magistério e trabalhava, aos fins de semana, em um buffet. A jovem tinha prestado concurso para trabalhar na Caixa e no Banco do Brasil e sonhava em comprar uma casa para morar com a mãe e a irmã.

"Ela era uma mãe pra Sara, a irmã dela. O outro irmão já era casado. A gente era muito unido. A Daiana sonhava em trabalhar no banco. Queria financiar uma casa. O sonho de trabalhar no banco era para conseguir comprar uma casa para a família", contou.

"Não tem indenização que vai me tirar esse vazio, essa saudade. Eu vivo um deserto", contou.

A decisão

Na sentença, o juiz Gilberto Vasconcelos Pereira Neto afirma que "no presente caso, ficou demonstrado o nexo de causalidade entre o dano (morte da paciente)  e  o  ato  omissivo  de  seus  agentes,  que  agiram  na  qualidade  de  representantes  da Administração Pública. O ato praticado pelos agentes foi ilícito, na forma omissiva. 

"Não se pode aceitar que a paciente tenha sido esquecida em uma maca nos corredores do pronto-socorro municipal sem qualquer atendimento, o que decorreu seu lamentável falecimento", completou.

Para o advogado de Narjara, Heitor Carvalho Silva, "a condenação acalma o coração da mãe e traz o sentimento de que a justica foi feita". "As provas que juntamos no processo vão de encontro com a versão da minha cliente. Ainda cabe recurso desta sentença mas estamos confiantes que ela não será reformada nas superiores instâncias. Daiana descansa em paz agora.", afirmou.

Prefeitura vai recorrer

Em nota, a Prefeitura de Sumaré diz que recorrerá da decisão. Além disso, o governo municipal afirma que a a responsabilidade pelo atendimento da jovem era da organização social (OS) que fazia a gestão da UPA do Jardim Macarenko na época.

"Desde 2014, houve algumas mudanças de gestão. A princípio, o governo do prefeito Luiz Dalben, assim que assumiu a Prefeitura, passou a gerir a UPA por meio de uma intervenção, garantindo de forma emergencial o atendimento para toda a população. Atualmente, quem gere a unidade, assim como o PA Matão, é a OS ISSRV (Instituto Social Saúde Resgate à Vida)", diz a nota.

"Trata-se de uma questão que aconteceu durante a gestão anterior e, como o caso está sub judice, a prefeitura não considera adequado comentar sobre o assunto", completa.

Para o advogado da família, mesmo que a gestão da UPA tenha sido transferida para uma UPA, a prefeitura, ainda assim, tem responsabilidade na morte de Daiana.