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Pará confirma morte de criança por raiva humana; 11 casos são suspeitos

Sespa confirma caso de raiva humana em criança de cinco anos, que morreu na sexta - Divulgação/Sespa
Sespa confirma caso de raiva humana em criança de cinco anos, que morreu na sexta Imagem: Divulgação/Sespa

Jéssica Nascimento

Colaboração para o UOL

16/05/2018 09h26

Morreu no fim desta terça-feira (15) a sexta criança com suspeita de raiva humana no Pará. O paciente estava internado no Hospital Regional de Breves. Todas as vítimas, que têm entre dois e 11 anos, foram mordidas por morcegos em uma comunidade rural do município de Melgaço, em Marajó. Até o momento, a Sespa (Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará) confirma a causa da morte pela doença em apenas uma criança de cinco anos, que morreu na última sexta-feira (11). Este é o primeiro caso confirmado desde 2005.

Quatro crianças seguem internadas na Santa Casa de Misericórdia, em Belém, e mais dois no Hospital Regional de Breves, sendo um adulto. A maioria em estado grave. As coletas de sangue de todas as vítimas, inclusive as que morreram, já foram encaminhadas para o Instituto Pasteur, em São Paulo, referência no diagnóstico de raiva.

Ao UOL, a Sespa informou que todos os 12 pacientes apresentaram quadro semelhante, com sinais e sintomas como febre, dispneia, cefaleia, dor abdominal e sinais neurológicos - paralisia flácida ascendente, convulsão, disfagia (dificuldade de deglutir), desorientação, hidrofobia e hiperacusia (sensibilidade a sons, principalmente agudos). Inicialmente, a hipótese diagnosticada foi meningite. Porém, com as últimas atualizações e histórico dos casos, foi levantada a suspeita de raiva humana.

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Prevenção reforçada

Na segunda-feira (14), a Sespa encaminhou mil doses de vacinas antirrábicas e 300 frascos de soro antirrábico. As ações se concentram na localidade de Rio Laguna, a 70 km de Melgaço, onde moram cerca de mil pessoas. Até o momento, 500 moradores já haviam sido imunizados. Mosquiteiros também foram entregues.

Desde o dia 4 de maio, equipes da Vigilância Epidemiológica e Vigilância em Saúde estão no local para investigar as suspeitas, em parceria com a Adepará (Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará) e Ministério da Saúde.

Ao UOL, o Ministério da Saúde disse que presta apoio à Secretaria Estadual de Saúde do Pará nas ações de prevenção e avaliação de risco da população exposta no local, inclusive com a ida de um técnico. Por meio de nota, o órgão garantiu que também é feito o bloqueio de foco, com a vacinação antirrábica para cães e gatos, assim como, a captura e identificação de morcegos.

“Cabe ressaltar que a raiva é uma doença infecciosa aguda causada por um vírus que acomete mamíferos, inclusive o homem, transmitida principalmente por meio da mordida de animais infectados, o que inclui os morcegos”, diz o texto.

Ainda segundo o Ministério da Saúde, em 2017, foram registrados seis casos em todo o país, sendo um em Pernambuco, um em Tocantins, um na Bahia e três no Amazonas, todos com a identificação do vírus que circula em morcegos.

13 anos sem raiva

Casos confirmados de raiva humana no Pará não aconteciam desde 2005, quando 15 foram registrados no município de Augusto Corrêa e 3 em Viseu (nordeste paraense) – todos por transmissão de morcego hematófago. No caso de Portel (município do Marajó), os últimos casos de raiva humana ocorreram em 2004, atingindo 15 pessoas – também todas transmitidas por morcegos hematófagos, assim como os seis casos confirmados em Viseu, no mesmo ano.

Raiva não vai se espalhar, diz infectologista

Para a médica infectologista Joana D’arc Gonçalves da Silva, a doença não irá se espalhar pelo país. Ao UOL, a especialista destaca que dados do Ministério da Saúde e dos serviços de vigilância epidemiológica mostram que os casos de raiva humana reduziram consideravelmente no Brasil. “São situações esporádicas e geralmente silvestres, associados à mordedura de morcegos.”

A médica também ressalta: a principal forma de se prevenir a doença é se vacinando, principalmente se for uma pessoa com risco de exposição ao vírus. ”Além de se vacinar, os donos também não devem esquecer de imunizar cachorros, gatos e furões. É uma importante forma de prevenção, tanto para você quanto para eles. Uma dica importante também é não mexer em animais silvestres.”

A raiva, segundo a especialista, é transmitida ao homem pela saliva e secreções de animais mamíferos infectados, principalmente pela mordida. Mais raramente, por arranhões e lambidas de mucosas e/ou pele lesionada.

“No Brasil, o morcego é o principal responsável pela manutenção do ciclo silvestre; mas o macaco, cachorro-do-mato, raposa, gato-do-mato, mão-pelada, guaxinim, entre outros, também podem infectar o homem. No núcleo urbano o cão, em alguns municípios, continua sendo fonte de infecção importante.”

Apesar de ser conhecida desde a antiguidade, a raiva humana ainda representa um grave problema de saúde pública pela gravidade dos casos e letalidade que chega a 100%, segundo a especialista.

“O vírus da raiva tem predileção pelo sistema nervoso central, onde se replica e causa quadro de encefalomielite aguda e não há tratamento comprovadamente eficaz para a raiva”, pontua.

Os estágios da doença, segundo especialista

Nos primeiros dias (2-10) os sintomas são inespecíficos : mal-estar, febre, cefaleia, tontura e dor generalizada. Alteração de sensibilidade local, geralmente ao redor da ferida, coceira com formigamento e sensação de queimação são outros sinais. A doença evolui com dificuldade para engolir, salivação intensa e desidratação. Diminuição auditiva e visão turva também podem surgir, assim como incontinência urinária e primarismo.

A fase Neurológica Aguda tem duração de dois a sete dias. Nesta etapa, as alterações provocadas pela proliferação do vírus da raiva nas estruturas do sistema nervoso central se intensificam, causando ansiedade, nervosismo, insônia, apreensão, agitação, agressividade e depressão. Manifestação de “fobias”, como hidrofobia, aerofobia e fotofobia também podem ocorrer, pois estímulos podem provocar “convulsões” e rigidez na nuca. 

O quadro vai se agravando, com sons e odores parecendo exacerbados, espasmos faríngeos, confusão, delírio, alucinações, evidente presença de hiperatividade e espasmos ou convulsões locais ou generalizadas. Os espasmos são involuntários e podem atingir a musculatura respiratória. A doença segue com intensa agitação psicomotora, crises convulsivas alternadas com torpor.

O paciente entra em coma, podendo ocorrer hipoventilação, apneia, pneumotórax, infecções secundárias, hipotensão arterial e arritmia cardíaca. A doença pode resultar em morte.

Ao ser mordido por um mamífero o que devo fazer?

A primeira preocupação, de acordo com a especialista, deve ser observar o grau de gravidade e, se possível, lavar com água corrente e sabão o local do ferimento. Depois, o paciente deve receber o esquema profilático completo (soro e vacina). A profilaxia contra a raiva deve ser iniciada o mais precocemente possível.

“Nas agressões por morcegos ou qualquer outra espécie de animal silvestre, deve-se proceder à sorovacinação, independentemente do tipo de morcego agressor, do tempo decorrido e da gravidade da lesão. Em caso de reexposição, seguir as orientações específicas, conforme cada caso,”, complementa médica infectologista Joana D’arc Gonçalves da Silva.