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MP denuncia médico suspeito de cobrar R$ 420 por cirurgias no SUS na Bahia

Para realizar cirurgias pelo SUS, médico é acusado de cobrar até R$ 400 em clínica no interior da Bahia - FangXiaNuo / 	Getty Images
Para realizar cirurgias pelo SUS, médico é acusado de cobrar até R$ 400 em clínica no interior da Bahia Imagem: FangXiaNuo / Getty Images

Alexandre Santos

Colaboração para o UOL, de Salvador

12/06/2018 18h35

O MP-BA (Ministério Público da Bahia) denunciou à Justiça na última segunda-feira (11) um ortopedista acusado de cobrar por cirurgias realizadas pelo SUS (Sistema Único de Saúde) em uma clínica de Feira de Santana, a 115 km de Salvador.

Segundo a Promotoria, o médico Samuel Artur Cardoso de Souza, 55, exigia “valores simbólicos” sob a justificativa de que o SUS “cobria, mas não pagava” tais procedimentos.

Em um dos episódios apurados pelo MP, Souza teria cobrado R$ 300 por uma cirurgia de braço e R$ 400 por outra. Para uma intervenção cirúrgica no punho, cobrou R$ 420.

Conforme a denúncia, os casos ocorreram em 23 de agosto de 2010 e em 2 de setembro de 2013, na Casa de Saúde Santana, unidade particular que mantém contrato com a prefeitura local para atender por meio do SUS.

Ao UOL, o médico negou as irregularidades e diz ter sido pego de surpresa diante das acusações.

O promotor Tiago Quadros, autor da denúncia, afirma que a ação do MP é resultado de um inquérito de 2015. Segundo ele, os relatos acerca das cobranças irregulares eram recorrentes desde 2010, mas só agora, com a oitiva das supostas vítimas, a Promotoria reuniu provas para levar o caso à Justiça.

“Esses pacientes, cujos relatos foram mais enfáticos, demonstram como o médico agia. No início, não conseguíamos identificar os profissionais, uma vez que as pessoas, muitas delas simples, tinham receio de apontar. Esses pacientes buscavam atendimento como normalmente ocorre no SUS: acordavam de madrugada, passavam horas na fila e, depois, ouviam que tinham de arcar com esses 'pagamentos simbólicos'”, afirmou Quadros.

Diante das denúncias, a clínica foi alvo de um TAC (Termo de Ajuste de Conduta) assinado no fim de 2017 para que fixasse no interior da unidade informações sobre as duas modalidades de atendimento: particular e pelo SUS. Mas isso também teria sido descumprido.

Além da conduta atribuída ao ortopedista, outros profissionais da casa de saúde são acusados de agir da mesma forma, de acordo com o MP.

R$ 40 por consulta no SUS

Pacientes contaram ao MP que também eram coagidos a pagar por consultas e exames. Um deles disse que um funcionário cobrou R$ 40 alegando que, sem a “taxa”, o atendimento não aconteceria, ou ainda, que o valor seria três vezes mais caro em uma clínica particular.

Conforme a denúncia, em uma das consultas Souza chegou a dizer que, sem pagar a taxa, a paciente esperaria tanto pelo procedimento que poderia ter “paralisia no braço direito”.

Para outra paciente, de acordo com o MP baiano, o ortopedista teria escrito em um papel o valor a ser pago e o nome da pessoa que deveria recebê-lo.

Se condenado, o médico poderá responder pelo crime de concussão – quando um funcionário público exige vantagem indevida, aproveitando-se do cargo. A prática está prevista no artigo 316 do Código Penal.

‘Sou uma pessoa bem reputada’, defende-se médico

O médico Samuel Artur Cardoso de Souza disse que, embora trabalhe na clínica há cerca de 20 anos, está desvinculado do SUS há mais de dez.

“Sou uma pessoa muito bem reputada na minha profissão. Não consigo entender o motivo da acusação. Não atendo pelo SUS há mais de dez anos. Tenho várias pessoas lá na casa de saúde que podem afirmar isso”, diz o ortopedista, que sustenta atender somente pacientes conveniados e particulares.

“Falo aos meus filhos que não é verdade. Estou me sentido condenado de antemão. Quem me conhece sabe que eu nunca seria capaz de uma coisa desse nível. Não fui ouvido em nenhum momento. Só a palavra do acusador tem valor”, disse.

Conselho de medicina vai abrir sindicância

Em nota, o Cremeb (Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia) informa que “irá instaurar uma sindicância para apurar possíveis infrações ao Código de Ética Médica”.

A Secretaria de Saúde de Feira de Santana informou, também por nota, que vê com "otimismo" a investigação do Ministério Público. "Afinal, se trata de uma conduta totalmente condenável, que prejudica principalmente as pessoas mais carentes, que têm direito à gratuidade nos atendimentos pagos pelo Sistema Único de Saúde, conforme a legislação”, diz o texto.

Segundo o comunicado, a pasta tem realizado constantes auditorias nas instituições conveniadas a fim de banir irregularidades. Afirma, ainda, que as empresas prestadoras de serviços são orientadas a reforçar, com placas afixadas em locais de fácil visibilidade, a gratuidade dos procedimentos e os direitos do cidadão.

A reportagem não conseguiu localizar representantes da clínica.