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Brasil só atinge meta de uma vacina obrigatória e peca mais em 2ª dose

WILLIAN MOREIRA/FUTURA PRESS
Imagem: WILLIAN MOREIRA/FUTURA PRESS

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

08/09/2019 04h00Atualizada em 09/09/2019 17h12

A cobertura vacinal no Brasil está em queda nos últimos anos e preocupa autoridades sanitárias que temem o retorno de mais doenças erradicadas, como foi o caso do sarampo. No último ano, apenas a vacina de BCG atingiu a meta estabelecida de 95% do público-alvo imunizado. Todas as demais vacinas tiveram, em 2018, coberturas abaixo desse percentual (veja ao final do texto).

Segundo dados do PNI (Programa Nacional de Imunizações), disponibilizados pelo Datasus, uma das que têm percentual mais baixo, especialmente na segunda dose, é a vacina tríplice viral (que protege contra sarampo, rubéola e caxumba), que atingiu apenas 76,3% do público-alvo. De todos os estados, apenas Mato Grosso do Sul ficou acima da meta, com 97,3% do público-alvo vacinado.

"Quando é indicado duas doses, uma dose apenas não é suficiente para a imunidade requerida", explica a sanitarista Cristina Rocha, que atuou por mais de um década no Ministério da Saúde e hoje é superintendente de Vigilância em Saúde de Alagoas. "Apesar de necessárias, as segundas doses das vacinas sempre atingem números menores."

Para o presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, Juarez Cunha, a queda vacinal contribuiu decisivamente para o ressurgimento do sarampo. "Isso não só no Brasil, mas em todo o mundo —embora cada país tenha sua explicação", diz.

O sarampo está circulando em 182 países. O Brasil, diz o Ministério da Saúde, teve confirmados entre 9 de junho e 31 de agosto 2.753 casos de sarampo em todo o país, sendo mais de 98% no estado de São Paulo. No mesmo período, quatro pessoas morreram.

"A baixa cobertura vacinal pode acarretar a volta de qualquer uma dessas doenças que a gente tinha eliminado, como a poliomielite, porque ela acontece em outros países do mundo. A mobilidade fácil que se tem atualmente pode levar o vírus para outros países", afirma Cunha.

O presidente diz que há vários motivos para a queda vacinal. A primeira delas, diz, é a falsa segurança que as pessoas passaram a ter. "Os pais jovens e grande parte dos profissionais nunca viram a doença infectar. Aí as pessoas pensam: vou vacinar por quê, se uma doença não acontece?"

O outro ponto é a "hesitação", que ocorre por uma série de motivos. "O principal deles é o medo das reações adversas das reações das vacinas. Se antes eram quatro vacinas, agora são 15 no calendário, que protegem para mais de 20 doenças. Os pais acabam achando que são muitas picadas", explica destacando que movimento antivacina no Brasil é fraco, em comparação a países da Europa e EUA.

Diante disso, Juarez Cunha diz que é necessário capacitar os profissionais de saúde que atuam nas 40 mil salas de vacinação espalhadas pelo país. "Temos que formar eles para se sintam em condições de responder e informar de forma clara simples a população", explica.

O sarampo foi erradicado oficialmente do Brasil em 2016, quando o país ganhou o certificado. "Mas desde 2000 não circulava mais no Brasil, só casos esporádicos, importados de outros países", afirma.

Cristina Rocha ainda aponta dificuldade de acesso dos pais para explicar a queda na cobertura. "Às vezes alegam falta de um posto próximo, a restrição da vacinação ao horário tradicional, enquanto trabalham. O governo tem de reforçar a necessidade da vacinação para proteção, ter campanhas de informação na mídia nacional. Os horários da vacinação podem ser ampliados, montar postos temporários em locais de mais acesso da população. Só se combate o movimento de antivacina com um um movimento pró-vacina", diz.

Uma outra preocupação dela é com os grupos que ficam sem vacinação. "É o que chamamos de bolsões de suscetíveis. É preciso buscar essas pessoas que estão desprotegidas. Às vezes você tem uma cidade com grande cobertura, mas uma determinada localidade não tem taxa", finaliza.

Outro lado

Em nota enviada um dia após a publicação da reportagem, o Ministério da saúde informou que desde 2011 vem identificando queda das coberturas vacinais e que foi potencializada em 2016.

"Um dos fatores que pode ter contribuído para a queda nas coberturas vacinais identificada nos últimos anos é o próprio sucesso das ações do PNI como o fato de algumas doenças terem sido eliminadas, a exemplo da poliomielite, rubéola, síndrome da rubéola congênita e tétano neonatal ou ainda de terem baixa ocorrência como coqueluche e tétano acidental. Isso causou uma falsa sensação de que não há mais necessidade de se vacinar porque a população mais jovem não conhece o risco. A resistência à vacinação é uma preocupação para toda a sociedade. A difusão de informações equivocadas e sem baseamento científico (fake news) contribuem para a decisão de não vacinar. O perigo de ter baixas coberturas vacinais é o risco de reintrodução de doenças já eliminadas no país", informou.

A pasta informou que, por ano, são mais de 300 milhões de doses de vacina aplicadas na população nos postos de vacinação e explicou que vai tentar crescer as coberturas vacinais.

"Pela primeira vez, o governo federal estabeleceu a cobertura vacinal como meta prioritária para a gestão de saúde no país. O Movimento Vacina Brasil visa reverter o quadro de queda das coberturas vacinais no país, pensando inclusive em horários alternativos nas UBS [unidades básicas de saúde] para vacinação", finalizou.