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Japão tem número estável de coronavírus sem quarentena; como é possível?

Maquinista de metrô de máscara em Shinjuku, no Japão -  Matthieu Gouiffes/Unsplash
Maquinista de metrô de máscara em Shinjuku, no Japão Imagem: Matthieu Gouiffes/Unsplash

Nathan Lopes

Do UOL, em São Paulo

24/03/2020 16h00Atualizada em 25/03/2020 19h53

Apesar da pandemia de coronavírus, o Japão não impediu sua população de sair às ruas, medida adotada por diversos países atingidos ao redor do mundo. Isso mesmo tendo registrado seu primeiro caso há cerca de dois meses, antes de Itália e Espanha, nações mais afetadas no momento. O presidente brasileiro Jair Bolsonaro (sem partido) chegou a citar a situação do Japão como exemplo.

O Japão possui 1.128 casos do novo coronavírus, com 42 mortes registradas até hoje. No Brasil, são 1.891 casos e 34 mortes até ontem. A diferença é que o país asiático registrou seu primeiro caso um mês antes de nós.

Uma explicação para que o Japão tenha tomado medidas menos drásticas contra a covid-19 pode ser cultural. Além disso, o país não testa todos os pacientes para verificar a contaminação por coronavírus, o que pode ser um outro fator para explicar os números apresentados.

"O Japão, historicamente, tem uma cultura estabelecida de não-disseminação de vírus respiratórios a despeito de contextos epidêmicos, como o que a gente vive atualmente", diz o médico infectologista e professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) Mateus Westin.

No Japão, foram barrados em eventos que gerem aglomerações, o que afetou principalmente as áreas área cultural e esportiva. Aulas também foram suspensas em unidades de ensino.

Mas restaurantes, bares e centros comerciais estão abertos, e o metrô funciona normalmente. O governo japonês chegou a fazer um "apelo" à população para "abster-se voluntariamente de sair".

Apesar de eventos esportivos do Japão estarem suspensos, apenas hoje foi decidido o adiamento dos Jogos Olímpicos de Tóquio, que seriam realizados a partir do final de julho. Agora, eles deverão ser realizados apenas no ano que vem em razão da pandemia.

No Brasil, Bolsonaro disse que, vendo vídeos do Japão, observou "todo mundo na normalidade". Mas o fluxo de pessoas nas ruas é menor comparado com tempos normais. O governo de Tóquio, aliás, pede, mas não exige, que as pessoas fiquem em suas casas.

A medida mais drástica tomada está relacionada a viagens ao exterior. No Japão, há isolamento para seus cidadãos que chegam de países em que há os piores cenários do novo coronavírus, como Estados Unidos, China e nações europeias. Estrangeiros que estiveram nessas localidades são impedidos de entrar no país.

Cultura de resguardo

No Japão, é comum que pessoas que demonstram sintomas de doenças mantenham o "afastamento social", segundo o infectologista. "E, quando precisam sair, elas utilizam máscaras por estarem sintomáticas, tem uma etiqueta da tosse absolutamente bem estabelecida."

O próprio governo japonês isso apresentou essa cultura de prevenção ao dar dicas de prevenção à sua população.

"Tome medidas gerais de prevenção a infecções em público em instalações de transporte, paradas e outras instalações onde um grande número de pessoas se reúne", traz documento do governo.

Westin também pontua que a população mantém as ruas sempre higienizadas, "de cada um guardar seu lixo, e dispensa em casa tudo que acumula".

"Acho que tem uma questão cultural muito importante nesse aspecto, que faz com que a população, mesmo sem medidas rígidas do governo, tenha uma consciência individual de como lidar com o sintomático, de se isolar e proteger os demais
Mateus Westin, médico infectologista e professor da UFMG

Em fevereiro, o governo japonês apresentou recomendações para o combate ao novo coronavírus. O destaque fica por conta da recomendação de quem está doente evitar sair de casa.

Menos testes

A política de testes do Japão também é diferente. Nem todos são testados, mas apenas os pacientes que os médicos julgam necessário, com especial atenção para quem tem quadro de pneumonia.

O Japão tem uma população de cerca de 125 milhões de pessoas, contra cerca de 210 milhões no Brasil. O governo pede que "pacientes com sintomas leves de gripe fiquem em casa".

"Para idosos, a recomendação é de que idosos e quem tenha outras doenças procurem "atendimento médico adequado no estágio inicial, dada a sua vulnerabilidade à infecção". Um quarto da população japonesa é de idosos.

Desde o início dos casos no Japão, foram feitos cerca de 24.300 testes em pacientes, de acordo com dados levantados até 24 de março. Como comparação, na Coreia do Sul, cerca de 350 mil pessoas foram testadas. No Brasil, se prevê distribuir 10 milhões de testes de coronavírus.

A quantidade de testes já foi alvo de críticas, o que levou alguns especialistas ouvidos por agências de notícia internacionais a apostarem em um crescimento no número de casos.