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Governo não responde a queixa de omissão de dados de covid feita na CGU

O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, em reunião com prefeitos  - Divulgação/MS
O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, em reunião com prefeitos Imagem: Divulgação/MS

Wanderley Preite Sobrinho

Do UOL, em São Paulo

25/02/2021 04h00Atualizada em 25/02/2021 04h28

O Ministério da Saúde perdeu o prazo e não respondeu em tempo a uma reclamação feita à CGU (Controladoria-Geral da União) de omissão de informações sobre a pandemia de covid-19 no Brasil.

A queixa foi protocolada há dois meses pelo Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, que reúne entidades e ONGs no país. A decisão da pasta de não se manifestar é passível de suspensão à exoneração dos servidores responsáveis pela prestação de contas, se for aberto um processo pela Advocacia-Geral da União.

De acordo com o Fórum, o ministério comete irregularidades na publicação de dados sobre a pandemia ao omitir dados sobre número de contaminados, a distribuição de testes e a atualização do número de leitos disponíveis em UTI (Unidade de Terapia Intensiva).

O documento foi entregue no dia 21 de dezembro à CGU, responsável pela transparência do governo federal. O órgão encaminhou a queixa à pasta, que não respondeu até a última sexta-feira (19), último dia do prazo.

Procurados pelo UOL, o Ministério da Saúde e a CGU não se manifestaram até a publicação desta reportagem.

"É preocupante que o órgão responsável por garantir a transparência no governo federal deixe de atender a uma demanda de tanta urgência e relevância", diz Marina Atoji, coordenadora do Fórum. "Sem informações atualizadas, não sabemos se há estrutura suficiente para atender essa alta de casos que estamos observando."

Falta de transparência

O documento do Fórum indica ao menos sete transgressões à transparência, "apesar de a Lei 13.979/2020 determinar que o ministério mantenha dados públicos e atualizados" sobre os casos de covid-19 no Brasil, segundo o Fórum.

Em 3 de dezembro de 2020, a plataforma com informações sobre a distribuição de testes só continha dados até 22 de agosto. Uma das consequências foi a descoberta, em novembro, de que 6,8 milhões de exames do tipo RT-PCR, o mais preciso de todos, estavam estocados com data perto do vencimento.

Reprodução do site, em 3 de dezembro, com os dados de testes distribuídos: Só há números até a 34ª semana epidemiolótica, de 16 a 22 de agosto - Reprodução - Reprodução
Em 3 de dezembro, só havia informações sobre distribuição de testes de covid-19 no site do governo até a 34ª semana epidemiolótica, de 16 a 22 de agosto
Imagem: Reprodução

Desde 26 de setembro, a pasta também não informava a quantidade de testes aplicados pela rede privada. Sobre medicamentos hospitalares a situação é semelhante: "atualizado pela última vez em 21 de outubro", diz a denúncia.

A primeira e única atualização dos dados sobre leitos disponíveis e ocupados —cujo preenchimento é obrigatório desde abril— foi feita em outubro. Já os boletins, antes semanais, são raramente publicados: A edição de 2 de dezembro trazia dados coletados até 17 de outubro, defasagem superior a um mês.

As entrevistas coletivas sobre a pandemia também rarearam: se no começo da crise sanitária o intervalo entre duas coletivas era de 1,6 dia, em média, a partir de 23 de maio passou a ser de 4,3 dias, com hiato de 13 dias sem coletivas entre 29 de outubro e 12 de novembro.

"A maioria das questões apontadas permanece", diz o Fórum. "O painel sobre leitos habilitados foi atualizado pela última vez antes do Natal e os painéis sobre distribuição de testes e medicamentos estão com mais de uma semana de atraso na atualização."

A falta de transparência federal sobre o tema levou à formação, no ano passado, de um consórcio de veículos de imprensa, do qual o UOL faz parte, que apura diariamente informações nacionais sobre a pandemia

Punições

Segundo a coordenadora da entidade, as punições podem atingir o Ministério da Saúde com base na Lei 8112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos da União. Enquanto o artigo 122 afirma que a "responsabilidade civil decorre de ato omissivo ou comissivo, doloso ou culposo, que resulte em prejuízo ao erário ou a terceiros", o artigo 127 trata das penalidades, que vão de advertência à suspensão e demissão.

Atoji explica que a punição se daria na esfera administrativa, "iniciativa da própria AGU" com base em uma reclamação sobre o descumprimento do prazo, enviada pelo Fórum em 23 de fevereiro. O rito seria:

  1. Abertura de um processo administrativo disciplinar
  2. Apuração da responsabilidade
  3. Defesa
  4. Definição de punição (se for o caso)

"As chances disso acontecer?", questiona Atoji. "Praticamente nenhuma", responde ela mesma. O motivo é raro histórico de procedimentos abertos pela AGU contra membros do governo.