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Prefeitos de cidades do interior ameaçam não acatar fase vermelha de Doria

Prefeito de Ribeirão Preto, Duarte Nogueira (PSDB) disse que vai liberar o comércio para funcionar em regime de delivery, e academias e salões de beleza continuarão funcionando - RENATO LOPES RP/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
Prefeito de Ribeirão Preto, Duarte Nogueira (PSDB) disse que vai liberar o comércio para funcionar em regime de delivery, e academias e salões de beleza continuarão funcionando Imagem: RENATO LOPES RP/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

Daniel César

Colaboração ao UOL, em Pereira Barreto (SP)

03/03/2021 22h45Atualizada em 04/03/2021 13h54

Quando o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), anunciava na tarde de hoje que o estado todo entrará na fase vermelha do Plano SP de combate à pandemia do coronavírus a partir de sábado (6), prefeitos conversavam em grupos de WhatsApp sobre o assunto. Eles questionavam a decisão do governo de adotar medidas mais restritivas — na fase vermelha, apenas serviços essenciais, como mercado e farmácias, ficam abertos, mas com capacidade reduzida.

"Não ficou decidido nada neste sentido, apenas o aumento das restrições", disse um prefeito ao UOL, sob a condição de anonimato, ao comentar sobre a reunião que ocorreu ontem, por videoconferência, entre Doria e gestores municipais.

Ao menos dois deles lembraram que, na reunião, foi solicitada ao governo estadual uma ação de restrição, mas não esperavam algo tão radical, e alguns temem a reação popular e de comerciantes. Em caso de não respeito às medidas estabelecidas pelo estado, a Justiça deve ser acionada pela gestão Doria.

Ribeirão Preto vai abrandar regras

O prefeito de Ribeirão Preto, Duarte Nogueira (PSDB), mesmo sendo do mesmo partido de Doria, afirmou que não pretende acatar a decisão do governador e que irá expedir um decreto mais brando do que o do estado.

Em coletiva de imprensa no final da tarde, Nogueira explicou que a cidade seguirá na fase vermelha, onde já está, mas com restrições diferentes em relação ao que foi determinado pelo governo estadual. A prefeitura vai liberar o comércio para funcionar em regime de delivery, e academias e salões de beleza continuarão funcionando. Sobre o toque de recolher a partir das 20h, o prefeito explicou que irá avaliar antes de tomar uma decisão — o governo estadual também não confirmou a medida.

A taxa de ocupação de leitos de UTIs para pacientes com covid nos hospitais em Ribeirão Preto é de 89,7%. Atualmente os dados mostram 41.032 casos confirmados de covid-19 e 1.244 mortes. A média móvel está em 197,07, mais do que os 190 de duas semanas atrás, um crescimento de 4%, o que indica estabilidade.

"Bolsonaro caipira" só acatará se Justiça mandar

O prefeito de Mirandópolis, Everton Sodario (PSL), conhecido como "Bolsonaro caipira" e que vem desafiando Doria desde o início da pandemia, ameaça dar trabalho ao governador.

Ele se manifestou nas redes sociais minutos após o início da coletiva do governador para anunciar as restrições. "João Doria está avaliando decretar mais uma vez o fechamento total do estado de SP nos próximos dias. O que a gente gostaria de ouvir é que o João Doria está avaliando renunciar o cargo de governador e mudar de vez pra Miami", escreveu.

Sodario já anunciou à sua equipe que quer resistir ao decreto e que somente irá fechar Mirandópolis se a Justiça determinar. Oficialmente a Prefeitura não vai se manifestar, mas a cidade está com ocupação de 85% dos leitos e 891 casos confirmados da doença, além de 15 mortes. A média móvel está em 3,6 casos por dia, 60% a mais que os 2,2 de duas semanas atrás.

Maioria diz que respeitará decisão de Doria

A maioria dos prefeitos, no entanto, disse que adotará as medidas estabelecidas pelo governador. São José do Rio Preto, a maior cidade da região noroeste do estado, já vinha adotando uma série de restrições devido ao avanço dos casos e das mortes.

O prefeito Edinho Araújo (MDB) prepara um decreto para manter as restrições seguindo o Plano SP. Dados fornecidos pelo município indicam que São José do Rio Preto está com taxa de ocupação de 84% dos leitos UTI-covid. O município conta com 48.165 casos da doença e 1.139 mortes. A média móvel chegou a 177,07 ontem.

Cidades de menor porte, como Ilha Solteira, que faz divisa com o Mato Grosso do Sul e tem pouco mais de 25 mil habitantes, deverão acatar a decisão do governador. O prefeito Otávio Gomes (PSDB) migrou recentemente para o partido de Doria e busca uma vaga para sair como candidato a deputado, por isso a avaliação da equipe dele é de que não pegaria bem um desacatar o governador, até porque a cidade está com 100% de taxa de ocupação de leitos neste momento, com 1.165 casos e 38 mortes. O município não vai comentar a decisão do governador publicamente.

Problema na fiscalização

Tanto Ilha Solteira como a vizinha Andradina sofrem de um mesmo problema: a fiscalização. Os dois municípios fizeram decretos idênticos no início de janeiro, quando a região de Araçatuba foi levada para a fase laranja, mas praticamente ninguém cumpriu.

"O número de funcionários de fiscalização é baixo na comparação com a quantidade de comércio para se observar", afirmou um servidor da Vigilância Sanitária de Andradina, responsável por multar o comércio que desobedece às regras.

Ao UOL, este funcionário confirmou que a fase vermelha dificilmente será cumprida à risca. "Os comerciantes abrem às escondidas e não temos material humano para cobrir a cidade toda", explica.

Prefeitos querem isolar populistas

Embora parte dos prefeitos do interior considere que João Dória exagerou ao colocar todo o estado na fase vermelha e poderia ter optado pela laranja, a avaliação da maioria é que, neste momento, o recado para a população deve ser de concordar com as medidas restritivas.

"As pessoas precisam entender que devem ficar em casa e evitar aglomerações neste momento, senão iremos viver dias de terror", disse um prefeito no grupo de WhatsApp. Por isso, a ideia deles é isolar os que forem considerados radicais e decidirem não acatar o plano do governador.

O assessor de um deputado estadual e que trabalha diretamente com prefeitos do interior deu a conclusão deles. "Para a ciência, a decisão vai ajudar, e o preço político será pago pelo governador, não por eles", conta.