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Com pressão do comércio, prefeitos do litoral de SP flexibilizam restrições

Maurício Businari

Colaboração para o UOL, em Santos

03/04/2021 17h03Atualizada em 03/04/2021 19h08

Pressionados por comerciantes e políticos locais, prefeitos da Região Metropolitana da Baixada Santista (RMBS), litoral de São Paulo, estão flexibilizando as restrições durante o lockdown estabelecido em comum acordo com os nove municípios que compõem a região.

Itanhaém cedeu às pressões na última segunda-feira (29), e agora foi a vez de Praia Grande autorizar a flexibilização do comércio neste final de semana, depois de um protesto realizado em frente à Câmara de Vereadores, na última quarta-feira (31). Em São Vicente, apesar das manifestações que ocorreram na terça-feira (30) em frente ao Paço Municipal, não houve recuo até o momento.

Com o objetivo de conter o acelerado avanço da covid-19, a Baixada Santista está em lockdown desde o dia 23 de março. A previsão do acordo firmado entre os nove prefeitos era de que as restrições só seriam flexibilizadas a partir do dia 4 de abril, quando então seria realizada uma nova rodada de conversas.

Comerciantes não aceitam restrições

Comerciantes afetados pelas restrições, porém, não aceitaram a decisão. Em Itanhaém, o primeiro protesto ocorreu no dia 25, em frente à Prefeitura. Com cartazes e faixas com os dizeres "os impostos não param, os comércios também não podem parar", "lockdown parcial sim, lockdown total nunca", os manifestantes aguardavam um posicionamento do prefeito, Tiago Cervantes (PSDB), que não cedeu à pressão.

Outra manifestação então foi marcada para a última segunda-feira (29), em frente ao posto de gasolina de propriedade da família de Cervantes. Os manifestantes, em nada preocupados com a aglomeração, deram as mãos e formaram uma corrente humana ao redor do estabelecimento, para impedir a entrada de clientes.

"Eu estava lá no momento em que eles começaram esse protesto, precisava abastecer o carro", conta a advogada Sueli Pereira, 59, moradora da cidade. "Eles gritavam, gesticulavam. Tinha muita gente sem máscara e eu fechei correndo o vidro do carro para eles não chegarem perto. Vai saber, né? Essa gente nunca protesta por falta de leitos ou de oxigênio. Só estão preocupados com o próprio negócio".

No mesmo dia, a prefeitura de Itanhaém divulgou alterações nas regras de restrição para petshops no período definido como lockdown pelo Conselho de Desenvolvimento da Baixada Santista (CONDESB). Entre as novas medidas, a cidade flexibilizou ainda a circulação de pessoas nas vias públicas em horários determinados para a prática de atividades físicas individuais.

"Quero sempre acreditar que questões políticas não estejam balizando os que realmente estão preocupados em buscar uma solução para os seus anseios", afirmou o prefeito. "Enquanto a população não entender de fato o seu papel, nós estaremos sujeitos aos aumentos de casos. Por isso, a decisão de sermos menos restritivos só será positiva se todos fizerem a sua parte, ou seja, utilizando máscaras, higienizando as mãos e, principalmente, mantendo o distanciamento social quando possível".

Gritaria em Praia Grande assusta moradores

Em Praia Grande, os manifestantes que pediam a flexibilização das restrições, em protesto realizado na última quarta-feira (31), assustou os moradores. Reunidos em carreata, os comerciantes percorreram a cidade seguindo um carro de som que tocava o hino nacional enquanto um manifestante gritava ao microfone palavras de ordem contra o governador João Dória (PSDB) e a prefeita da cidade, Raquel Chini (PSDB).

"Eu estava trabalhando no computador quando me assustei com o barulho das buzinas e da gritaria em frente à minha casa", contou ao UOL a jornalista Josi Castro, moradora do bairro do Boqueirão. "Eles empunhavam bandeiras do Brasil e, o que me chamou muito a atenção, aquela bandeira amarela estranha, que traz uma cobra estampada. Já vi o Eduardo Bolsonaro várias vezes com ela", afirmou, referindo-se à bandeira de Gadsden, um dos símbolos da extrema-direita norte-americana.

Terminada a carreata, os manifestantes pararam em frente à Câmara de Vereadores da cidade para protestar. O que culminou, nesta sexta-feira (02), com a flexibilização do comércio de alimentos, autorizando o atendimento presencial durante o final de semana em hipermercados, supermercados, mercados, açougues, padarias, mercearias, peixarias, quitandas, distribuidoras de gás e lojas de venda de água mineral. Nas cidades que seguem o acordo de lockdown, esse atendimento só é permitido pelo sistema de entregas (delivery).

A prefeita de Praia Grande, Rachel Chini, disse ao UOL que a decisão de abertura dos comércios essenciais neste final de semana é baseada em orientação do Governo do Estado e em dados técnicos que foram analisados e avaliados pelo Comitê Técnico Científico da Secretaria de Saúde Pública (Sesap) da Cidade. Segundo ela ainda, a decisão não tem nenhuma ligação com possíveis pressões de vereadores ou com a manifestação que ocorreu.

"Entendo como legítima a realização dessas manifestações, desde que ocorram de forma pacífica. O lockdown foi necessário, principalmente, por conta do megaferiado em São Paulo e demais cidades de outras regiões como do Grande ABC. Se a Baixada Santista não tivesse tomado esta atitude, com certeza receberíamos um grande número de turistas, algo inaceitável para este momento tão delicado da pandemia. Passado este período, se faz necessária a retomada gradual dos setores da economia e é isso que terá início na próxima semana", disse.

Em São Vicente, manifestantes deitam no chão

Em São Vicente, os protestos se arrastam desde a semana retrasada, com o primeiro realizado no dia 25. Na última terça-feira (30), a manifestação estava marcada para ocorrer em frente à Câmara Municipal da cidade, mas foi cancelada porque as sessões presenciais foram suspensas devido aos casos confirmados e suspeitos de covid-19 entre servidores públicos.

O jeito foi se reunir em frente à prefeitura. Gritando palavras de ordem contra governadores e prefeitos, os comerciantes chegaram a se deitar no chão para chamar a atenção das autoridades e da imprensa local. Mas o prefeito Kayo Amado (Pode) não recuou no acordo do lockdown.

"Todo serviço é essencial. Não é o comércio que propaga o vírus. É fila de bancos e lotéricas, são ônibus superlotados", disse durante transmissão ao vivo o comerciante Merre Arabi, um dos líderes dos protestos. Merre foi candidato a vereador do município pelo DEM, nas últimas eleições municipais.

O UOL encaminhou algumas questões ao prefeito, mas até o fechamento desta matéria, ele não havia respondido. O presidente do Conselho de Desenvolvimento da Baixada Santista (Condesb), que coordenou o lockdown regional, Rogério Santos (PSDB), também foi procurado, mas não quis comentar sobre as ações dos colegas. Ele é prefeito da cidade de Santos, onde as restrições continuam neste final de semana.