Topo

Esse conteúdo é antigo

Sem aval da Anvisa para testes, Butantan começa hoje a produzir ButanVac

Beatriz Gomes, Lucas Borges Teixeira e Rafael Bragança

Do UOL, em São Paulo

28/04/2021 04h00Atualizada em 28/04/2021 15h45

O Instituto Butantan começa hoje a produzir as primeiras doses da ButanVac, a vacina contra a covid-19 que deve ter produção 100% nacional, sem a necessidade da importação de matéria-prima. O instituto, porém, ainda precisa de um aval da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para iniciar os testes clínicos do imunizante em humanos.

Ontem, a agência negou a autorização e pediu o complemento de documentação por parte do Butantan, que se comprometeu em atender às exigências. Antes disso, o UOL havia adiantado que o instituto pretendia começar a produção da ButanVac ainda nesta semana.

Segundo o diretor do Butantan, Dimas Covas, a instituição começará a produzir inicialmente um primeiro lote com um milhão de doses, mas tem a expectativa de produzir 18 milhões de doses até junho.

O anúncio do início da produção vem num momento em que o país enfrenta uma escassez de oferta de doses da CoronaVac, a vacina contra a covid-19 envasada pelo Butantan com insumos importados da China. Há problemas em diversas cidades brasileiras, principalmente, com a aplicação da dose de reforço.

Linha de produção da vacina contra a gripe

O Butantan alega que a distribuição das doses é de responsabilidade do Ministério da Saúde, que chegou a orientar os municípios a não guardarem a segunda dose e usarem todo o estoque.

Durante a coletiva realizada hoje no Instituto Butantan, com a equipe do governador João Doria (PSDB), a coordenadora do programa estadual de imunização, Regiane de Paula, repetiu que não há falta de doses no estado de São Paulo.

Planejamento é fundamental e, no estado de São Paulo, o Plano Estadual de Imunização vem fazendo com que nós tenhamos estoque estratégico e não tenhamos falta em nenhum momento de d2 [segunda dose] de nenhuma vacina.
Regiane de Paula, coordenadora de Controle de Doenças da Secretaria Estadual da Saúde


De acordo com o Butantan, a fabricação da ButanVac vai ocorrer em uma linha de produção que vinha sendo utilizada para a vacina contra a gripe. A CoronaVac é produzida e envasada em outro maquinário.

Assim como a vacina da gripe, o Butantan utilizará para a ButanVac a técnica de obtenção do IFA (Insumo Farmacêutico Ativo) a partir do cultivo de cepas do vírus em ovos de galinha. A instituição tem hoje um primeiro lote com 520 mil ovos que receberão o vírus, rendendo depois duas doses da vacina cada um.

No anúncio da ButanVac, há cerca de um mês, o governo paulista e o Butantan chegaram a classificar a vacina como "100% brasileira". Logo depois, porém, a instituição admitiu que usou uma tecnologia criada no Hospital Mount Sinai, de Nova York, nos Estados Unidos.

A ButanVac é desenvolvida por um consórcio internacional, mas poderá ser produzida integralmente no Butantan, com custo mais baixo.

Aplicação em junho

Doria projetou o início da aplicação da ButanVac para junho, caso a Anvisa autorize o início dos testes clínicos e depois o seu uso. A previsão, no entanto, dificilmente será cumprida —o primeiro passo do processo, que está em curso, já foi interrompido.

O Butantan, nesta primeira etapa, vai produzir 18 milhões de doses da vacina pronta para o uso já na primeira quinzena de junho, quando o processo de aprovação da Anvisa for concluído. Evidentemente, vamos aguardar a aprovação da Anvisa, mas poderemos aplicar imediatamente a vacina ButanVac em todo o Brasil com a eficácia e a capacidade de proteger as pessoas contra a covid-19.
João Doria, governador de São Paulo

Doria também cobrou "senso de urgência" da agência federal para a análise sobre os pedidos da vacina, como já havia feito anteriormente. Dimas Covas, por sua vez, já projetou uma produção de até 150 milhões de doses no segundo semestre do ano.

Não dependemos nada de importação, licenciamento. Vamos ser autossuficientes, vamos atender o Brasil e parte do mundo porque nossa capacidade de produção é muito grande. Podemos chegar a 100 milhões, 150 milhões de vacinas a partir do segundo semestre deste ano.
Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan

Novo impasse na Anvisa

A recusa da Anvisa para liberar os testes clínicos em humanos da ButanVac é mais um capítulo numa série de impasses que o Instituto Butantan tem tido com a agência federal durante a pandemia do coronavírus.

Sobre a ButanVac, a Anvisa alega que os dados fornecidos pelo Butantan estão incompletos e fez uma relação com mais de 40 tópicos que devem ser incluídos na documentação.

Há pouco mais de um mês, a agência federal deu o aval para os testes clínicos do soro anticovid do Butantan, mas a autorização só veio após troca de acusações entre a Anvisa e a instituição ligada ao governo paulista.

Quanto à CoronaVac, a tensão foi ainda maior porque em janeiro o Butantan já tinha 10,8 milhões de doses disponíveis para aplicação, mas ainda não havia fornecido toda a documentação necessária à agência para que tivesse a autorização para uso.

No dia do aval concedido pela Anvisa, em 17 de janeiro, o gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa, Gustavo Mendes, afirmou que os dados de imunogenicidade —a capacidade do imunizante de estimular a produção de anticorpos— não eram adequados, mas a agência autorizou o uso emergencial considerando também o cenário da pandemia.

Nova entrega da CoronaVac

O governo paulista e o Butantan informaram a próxima entrega de doses da Coronavac deve ocorrer nesta sexta-feira (30). O Ministério da Saúde deve receber mais 600 mil doses, totalizando assim 42 milhões de doses, desde o início deste ano.

O primeiro contrato firmado entre o Butantan e o governo federal prevê a entrega de 46 milhões de doses até o fim de abril, mas haverá atraso. Um segundo acordo foi fechado para a produção de mais 54 milhões de doses.

Dimas Covas admitiu atribuiu o atraso à demora da chegada de insumos. De acordo com ele, o Butantan tenta aumentar o quantitativo dos próximos lotes de matéria-prima para que seja adiantada a produção das próximas doses.

Nós deveríamos entregar 46 milhões até o dia 30 [de abril]. Estamos entregando até sexta 42,3 milhões e o restante na próxima semana. Então houve de fato um pequeno atraso. Estamos trabalhando com a Sinovac [laboratório chinês] para que o lote de 3 mil chegue ainda na primeira quinzena de maio e estamos pedindo, além de 3 mil [litros], a possibilidade de vir 6 mil.
Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan