Topo

RJ só cumpre calendário de Paes se ritmo de vacinação aumentar em quase 50%

O prefeito do Rio, Eduardo Paes - Reprodução/Youtube
O prefeito do Rio, Eduardo Paes Imagem: Reprodução/Youtube

Lola Ferreira

Do UOL, no Rio

21/05/2021 04h00

Para o Rio de Janeiro cumprir calendário apresentado pelo prefeito Eduardo Paes e vacinar todos acima de 18 anos até outubro, a média diária de vacinação tem de aumentar em ao menos 47%, conforme levantamento com base em dados da Secretaria Municipal de Saúde e do Ministério da Saúde feito pelo UOL.

Isso depende contudo da produção de vacinas —que sofre hoje redução da capacidade em razão da instabilidade no envio de insumos da China. Em meio a esse cenário de incertezas, especialistas encaram a meta com cautela e veem um gesto político, e eleitoral, na divulgação do calendário.

Nos primeiros quatro meses de vacinação, até 16 de maio, o Rio teve uma média de 17 mil pessoas recebendo a 1ª dose diariamente, cerca de 1,7 milhão no total, de acordo com o Vacinômetro do Ministério da Saúde.

Para que a meta de Paes, divulgada no dia 12, seja cumprida até outubro, a média diária deve aumentar para 25 mil vacinados. A análise —que exclui os domingos— não abrange as segundas doses.

Excluindo pessoas com menos de 60 anos já vacinadas por serem profissionais de saúde ou fazerem parte dos grupos prioritários, o Rio tem que aplicar a 1ª dose em cerca de 3,2 milhões de pessoas entre junho e outubro para atingir a meta.

O número abarca pessoas entre 20 e 59 anos, único recorte possível de faixa etária disponibilizado em dados abertos pelo Ministério da Saúde e enviados pela Secretaria Municipal de Saúde ao UOL.

A vacinação dessa faixa etária, de acordo com a proposta de Paes, começa em 31 de maio, com pessoas de 59 anos, e vai até 16 de outubro, com os de 20. O calendário ainda prevê a vacinação de jovens com 18 e 19 anos na última quinzena de outubro.

'Beijão na boca'

Na divulgação do calendário (veja abaixo), Paes afirmou que o total de pessoas vacinadas diariamente diminuiu após a interrupção da vacinação por idade, já que há menos pessoas que se encaixam nos grupos prioritários.

Sobre cumprir o calendário, o prefeito disse que "depende da chegada do imunizante".

"Nos últimos tempos, a quantidade de pessoas que vacinamos por dia é muito menor do que poderíamos estar vacinando. Tirando o problema da segunda dose da Coronavac, a gente vacina menos gente do que temos capacidade. (...) A gente pode alcançar mais, e é isso que a gente quer que seja compreendido por todos."

Após a divulgação do calendário, o prefeito virou um dos assuntos mais comentados no Twitter. A cantora Clarice Falcão comemorou a meta e prometeu "um beijão na boca" do prefeito, em tom de brincadeira, caso seja cumprida.

Paes respondeu: "Alegria é tanta que a 'patroa' aqui é até capaz de liberar. Depois faz as contas aí e confirma a data, por favor".

'Entregas imprevisíveis de doses'

Diante dos atrasos de recebimentos de insumos e interrupção na produção do Instituto Butantan, que faz a Coronavac, e da Fiocruz, que produz a Oxford/Astrazeneca, infectologistas ouvidos pelo UOL dizem que a promessa de Paes tem de ser vista com cuidado.

"O cronograma de um município não difere do cronograma nacional. Ele não vai arrumar doses diferentes do que o país tem. Toda a vacinação é dependente das entregas, que atualmente é imprevisível: não sabemos quanto a China vai mandar [de insumos] pelos próximos meses, ninguém pode prever isso", diz Renato Kfouri, infectologista e diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações.

Numa outra perspectiva, a política, o sociólogo Paulo Baía vê um gesto "político-eleitoral" no calendário de Paes.

"Essa estratégia é boa para ele. Há o anúncio do calendário, mas [ele] não pode garantir a vacinação, porque depende do ritmo de entregas do governo federal e da produção das vacinas. Problemas que não são do controle do Paes", afirma Baía.

Para o sociólogo, a divulgação do calendário tem o objetivo de pressionar o governo federal.

"Ao anunciar esse calendário numa cidade com o porte do Rio, ele força politicamente o governo a acelerar os processos. A população passa a pressionar o governo federal."

Para Alberto Chebabo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, a divulgação do calendário envolve transparência. Ele diz acreditar ser possível cumprir, desde que tenha vacina.

"No Rio, há uma cobertura vacinal bastante alta, mas não sabemos se vai conseguir manter isso. Há uma estrutura de vacinação que está subutilizada. Então se aumentar a oferta de vacina, a estrutura está aí. O Rio tem condições de vacinar."

E completa: "O papel do gestor é dividir com a população em cima do que foi prometido a ele. Esse calendário foi feito em cima do cronograma do Ministério da Saúde, cabe ao ministério cumprir o que apresentou."