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Após viagem a países com zika, grávidas dos EUA temem consequências do vírus

Roxanne Forest passou o Natal na Costa Rica quando estava entrando no segundo mês de gestação. Ela é fotografada na sua casa em Atlanta (EUA) - Bryan Meltz/The New York Times
Roxanne Forest passou o Natal na Costa Rica quando estava entrando no segundo mês de gestação. Ela é fotografada na sua casa em Atlanta (EUA) Imagem: Bryan Meltz/The New York Times

Laura Beil

Do New York Times

23/03/2016 06h00

Em dezembro, Ami Levy e o marido, Jason, trocaram a gelada capital dos Estados Unidos, Washington, por duas semanas de férias na Argentina. Quando chegaram lá, seguiram na direção norte até a fronteira brasileira para passar alguns dias, atraídos pelas Cataratas do Iguaçu.

Ela se lembra da empolgação quando o GPS de seus telefones finalmente indicou que estavam no Brasil, e com as impressionantes paredes de águas, algumas com mais de 24 andares de altura.

E ela se lembra de que havia mosquitos por todo canto, que picavam suas pernas.

De volta em casa na primeira semana de janeiro, Amy descobriu estar na quarta semana de gravidez.

A primeira gravidez terminara com um aborto espontâneo em setembro, então foi com alguma hesitação que ela partiu em nova viagem, desta vez para Porto Rico, para se encontrar com a tia e a irmã.

Assim que chegaram, o noticiário local começou a alertar as mulheres grávidas sobre os perigos de uma infecção com o vírus da zika, transmitido por mosquitos e suspeito de causar malformações devastadoras nas crianças nascidas de mulheres infectadas.

Ela reservou o primeiro voo disponível para casa.

"Eu estava na praia há algumas horas e não havia passado nenhum repelente de insetos. Levei duas picadas quando cheguei em casa no domingo", disse Amy, psicoterapeuta de 35 anos.

Acho que meu pânico seria ainda maior se não me convencesse que precisava segurar a onda por causa do bebê.

Ainda não está confirmada a circulação do vírus da zika no território continental dos Estados Unidos. Entretanto, o medo da infecção se instalou em muitas grávidas e suas famílias que viajaram para o exterior antes de os riscos se tornarem conhecidos.

Nove grávidas infectadas

O Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC) informou que nove mulheres grávidas foram infectadas enquanto viajavam. E muitas mais estão enfrentando a possibilidade de exposição, procurando os médicos para fazer exames de sangue e ultrassom, obcecadas pelo noticiário e tentando administrar a preocupação.

O CDC recomenda que as grávidas façam exames de sangue de duas a 12 semanas depois de viajarem para uma área afetada para detectar se podem ter sido infectadas pelo vírus zika.

As que foram expostas são aconselhadas a fazer ultrassons extras em busca de defeitos congênitos no feto em desenvolvimento.

Nada é garantido; o teste com o anticorpo tem limites. Os ultrassons nem sempre detectam microcefalia fetal, doença que provoca cabeças disformes e lesões cerebrais ligadas à infecção pelo vírus.

Segundo o CDC, os exames são mais exatos no final do segundo trimestre ou começo do terceiro.

"O risco é pequeno, mas os efeitos são trágicos. Multiplique esses dois fatores e você terá algo ruim", disse Craig Forest, 37 anos, professor adjunto de bioengenharia do Instituto de Tecnologia da Geórgia, Atlanta.

Ele e sua esposa, Roxanne, 32 anos, passaram o feriado de Natal na Costa Rica quando ela entrava no segundo trimestre de gravidez. Eles escolherem esse destino porque, de todos os países na região, parecia oferecer o ambiente mais seguro para uma mulher grávida.

Despois de dez dias de caminhadas nas florestas tropicais e entardeceres preguiçosos na praia, Roxanne estava coberta de picadas de insetos.

Já em casa em janeiro, o casal começou a ouvir o noticiário sobre o vírus zika. A Costa Rica não foi mencionada.

"Eu fiquei olhando a lista e pensando: 'São todos vizinhos da Costa Rica; conseguimos desviar dessa bala'", disse ela.

Em 1º de fevereiro, a Costa Rica foi incluída na lista de países no qual o zika está circulando. O vírus estava no país pelo menos desde dezembro.

O médico de Roxanne não pediu exame de sangue para a infecção porque ela não tinha os sintomas. O ultrassom mais recente parecia normal, e o casal vai pedir mais um no tempo limite para um aborto.

Eles ficam deitados na cama à noite discutindo a possibilidade, algo que seria impensável poucos meses atrás.

Eles sabem que os riscos são remotos – primeiro que ela possa ter sido picada por um mosquito infectado e, segundo, que a infecção possa levar a um defeito congênito.

Como pessoas de mente analítica, estamos tentando calcular as possibilidades

Roxanne, engenheira

Contudo quando tentam definir a probabilidade de um defeito congênito ligado ao vírus zika, tudo que podem concluir é que o resultado é "diferente de zero".

Não existe nada a fazer além de esperar. "Tentei parar de ler os jornais", contou Roxanne.

Quando uma mulher grávida está infectada, exames de sangue ou do líquido amniótico não podem determinar conclusivamente se o feto foi afetado, explicou o Dr. W. Ian Lipkin, especialista em doenças infecciosas da Faculdade Mailman de Saúde Pública da Universidade Columbia, que atualmente trabalha no desenvolvimento de uma alternativa mais confiável.

A microcefalia parece ser uma complicação relativamente rara. Todavia é também possível que o vírus cause "danos mais sutis que ainda não conseguimos avaliar", disse Lipkin.

Sydney Silverstein, 35 anos, doutoranda da Universidade Emory, mora em Iquitos, Peru, desde julho. Ela está na 34ª semana de gravidez.

zika EUA - The New York Times - The New York Times
Ami Levy soube que estava grávida de quatro semanas após passar duas semanas de férias na Argentina e no Brasil. Ela está preocupada com a associação entre o vírus da zika e casos de microcefalia
Imagem: The New York Times
 Não existe uma epidemia disseminada de zika no Peru, mas o vírus pode ser encontrado em Lima. Além disso, ela esteve no Brasil no final do ano passado, no começo da gestação.

Sydney fez exames extras de ultrassom a pedido da médica, e o feto parece não ter sido afetado.

O marido, Nick, vive viajando em função do trabalho em Ohio, e os pais dela pedem que volte antes que o vírus atinja a parte do país em que ela está. "Tenho uma família incrível e que me apoia muito – e que está um pouco desesperada", declarou ela.

Sydney decidiu ficar no Peru, acreditando que os riscos para o filho são pequenos e desejando terminar a pesquisa que iniciou.

Ainda assim, a diferença entre as condições dela, como norte-americana, e das mulheres locais "são um tapa na cara".

"Bem no fundo, eu sabia que tinha a opção de ir embora se assim decidisse." A maioria das mulheres na América Latina não pode fazer isso.

No final de fevereiro, logo depois que Ami Levy ouviu pela primeira vez as batidas do coração do neném no consultório médico, o resultado do anticorpo para o zika deu negativo. "Pela primeira vez em semanas, eu pude relaxar um pouco."

Ela passou um mês ansiosa, se preocupando se havia colocado em risco o bebê, ainda que pensasse que a culpa era ilógica. Mesmo agora, Amy se sente importunada por saber que os exames não são totalmente seguros. Ela pretende pedir um ultrassom extra dentro de algumas semanas.

Ela não está correndo nenhum tipo de risco. Por sugestão da médica, Amy cancelou uma viagem à Flórida porque as autoridades sanitárias locais declararam uma emergência de saúde pública no condado de Miami-Dade.

"Eu vejo as imagens e me sinto ligada àquelas mães no Brasil. É uma situação horrorosa", declarou.