Boicotada no mundo, Huawei atua em áreas-chave no Brasil, da Copa ao 4G
A Huawei, líder em equipamentos de telecomunicações, enfrenta um boicote de vários países do mundo. Capitaneada pelos Estados Unidos, a investida pode comprometer a aposta da companhia chinesa no 5G, a nova tecnologia de internet móvel que vai revolucionar o celular. A turbulência no exterior não parece afetar sua atuação no Brasil, onde foi crucial para a chegada do 4G durante a Copa e atua na implantação do 5G.
Não pense, no entanto, que a pressão norte-americana é uma retaliação às piadas que a chinesa faz com a Apple. A coisa é mais séria: a Casa Branca suspeita (sem apresentar provas) de que a empresa facilite a espionagem cibernética da China e investiga se ela quebrou o embargo econômico imposto ao Irã - o último capítulo dessa novela foi a prisão de uma executiva do alto escalão da Huawei no Canadá e seu pedido de extradição para os EUA.
O pano de fundo de todo imbróglio é a guerra comercial entre EUA e China e a corrida entre os dois países para liderar a adoção do 5G no mundo.
Celular brasileiro com DNA chinês
No Brasil, no entanto, o cenário é diferente: a empresa pode até não aparecer tanto, já que não vende smartphones, um segmento em que é a segunda maior do mundo, mas aqui ela é peça chave para a infraestrutura de internet que chega ao seu celular, pois fornece equipamentos tanto para as grandes Vivo, Tim, Claro e Oi quanto para empresas menores.
Ela é importante, pois já vendeu para todos as grandes e é um fornecedor estratégico para as [empresas] competitivas
João Moura, presidente da Telcomp (associação das operadoras competitivas)
Quer um exemplo? Das mais de 86 mil estações rádio base (ERBs) em operação no Brasil, segundo a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), cerca de 70 mil foram fabricados pela Huawei. Isso quer dizer que 81% das antenas de celular têm o DNA da chinesa. Esses equipamentos são os responsáveis por transmitir sinal 2G, 3G e 4G a smartphones, modens, maquininhas de celular e todo tipo de aparelho que usa rede móvel.
Há 20 anos no Brasil, a chinesa ganhou espaço por aqui e no mundo cobrando preços mais competitivos que as rivais Ericsson, da Suécia, e Nokia, da Finlândia.
Isso a fez não só entrar no radar das grandes empresas como também ser a queridinha entre as firmas com capacidade mais modesta de investimento, como as representadas pela associação liderada por Moura.
"Hoje, ela é fundamental para as competitivas", diz o executivo. Ele cita, entre os equipamentos críticos fornecidos, sistemas que permitem abrir dezenas de canais de transmissão em uma única fibra óptica.
Se lá fora, há acusações de espionagem, por aqui, a reclamação é que, depois de ganhar mercado, a Huawei passou a cobrar mais. "A fatia da Huawei diminuiu pois ela passou a praticar preços mais altos. A vantagem em relação aos top caiu, e Nokia e Ericsson retomaram clientes", afirma Moura.
A empresa esteve envolvida nos bastidores de grandes eventos. Durante a chegada do 4G ao Brasil, as principais operadoras do Brasil recorreram à Huawei para cumprir a meta de levar a nova tecnologia a todas as cidades-sede da Copa do Mundo do Brasil, em 2014.
As impressões digitais da chinesa também estão nas redes que as operadoras vêm chamando de 4.5G ou 4G+ -- um nome todo trabalhado no marketing para embelezar o medonho LTE Advanced. No fundo, é uma evolução do 4G que permite a celulares transmitirem um volume maior de dados, usufruírem de diferentes faixas de frequência e ainda aumenta as antenas disponíveis para enviar dados.
Agora, às vésperas do 5G estrear no mundo, a chinesa é uma das fabricantes que estão abastecendo testes de compatibilidade. Há a possibilidade de haver interferência do novo tipo de conexão no sinal das antenas parabólicas no Brasil.
A empresa também produz em solo brasileiro. A fabricação é feita na fábrica de 34 mil m² da Flex, em Sorocaba (SP). Lá, a chinesa mantém ainda um laboratório de "internet das coisas".
Ainda que não informe seu faturamento no país, a companhia dá uma ideia de seu volume de negócios no país: calcula ter vendido R$ 1,9 bilhão em equipamentos nos últimos três anos. Para os executivos que a lideram, o Brasil é estratégico. Foi o que disse Wei Yao quando se tornou CEO da Huawei Brasil em 2016:
O mercado brasileiro é um dos mais importantes para a Huawei
Problemas mundiais
No mundo, a chinesa é uma gigante. Faturou US$ 92,6 bilhões em 2017 - a título de comparação, isso é mais de três vezes a receita auferida pela Alibaba, gigante do comércio online.
E é justamente sua expansão que preocupa os EUA. Desde pelo menos 2012, parlamentares norte-americanos pressionam a Casa Branca a abrir investigação contra a Huawei, acusada de romper o embargo contra o Irã e fornecer equipamentos ao país do Oriente Médio. De lá para cá, outra acusação passou a ser feita: a de que os equipamentos da companhia podem usados pelo governo chinês para espionagem.
A coisa esquentou mesmo neste ano devido à guerra comercial em que EUA e China impõem sanções bilionárias aos produtos um do outro. Em fevereiro, na esteira do conflito, os chefes das agências de segurança CIA, FBI e NSA passaram a boicotar o uso de equipamentos da Huawei dentro de suas unidades pois acreditavam que há grande risco de eles serem manipulados pela China.
Em abril, vieram dois duros golpes. Primeiro, o Departamento de Comércio proibiu que empresas norte-americanas vendessem componentes para outra chinesa também da área da telecomunicação, a ZTE, após acusá-la de infringir o embargo ao Irã. Sem equipamentos de Qualcomm, Microsoft e Intel, a empresa começou a ter problemas.
No dia seguinte, a Comissão Federal de Comunicação (FCC, na sigla em inglês) aprovou planos de impedir operadoras de telecomunicação que recebam subsídios do governo de adquirir equipamento de empresas que ameacem a segurança nacional.
Boicote de peso
Só que não parou por aí. Após iniciar um boicote interno, o governo dos EUA iniciou uma campanha junto a países aliados. Itália, Alemanha e Japão foram abordados, segundo o jornal "Wall Street Journal".
Deu resultado em partes. O governo japonês planeja proibir compras governamentais de aparelhos não só da Huawei como também da ZTE. O argumento, de acordo com a agência Reuters, é evitar vazamentos de informações e ataques cibernéticos. Já a Alemanha negou que vá impor qualquer tipo de veto.
Antes dos dois países se posicionarem, Austrália e Nova Zelândia já haviam anunciado que evitariam construir redes 5G com equipamentos da Huawei. No Reino Unido, a British Telecom informou que removeria a chinesa de seus sistemas.
A tensão chegou ao ápice em 1º de dezembro com a prisão de Weng Wanzhou, chefe de operações financeiras da Huawei, em Vancouver, no Canadá. A detenção da executiva, filha do fundador e CEO da empresa, foi feita a pedido dos EUA, para onde ela deve ser extraditada.
Como se a história já não precisasse de mais reviravoltas, o episódio ocorreu poucos dias após Donald Trump e Xi Jinping selarem uma trégua na guerra comercial. Não durou muito.
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