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Por que os robôs não conseguem driblar as caixas "Não sou um robô"?

Helton Simões Gomes

Do UOL, em São Paulo

05/04/2019 04h00

Robôs já conseguem ligar para restaurantes e fazer uma reserva. São capazes de achar sua música preferida no YouTube e colocá-la para tocar. São bons em achar as ruas por onde você deve dirigir para fugir do trânsito pesado. Mas há uma tarefa simples que eles não conseguem cumprir tão facilmente: passar pelas caixas "Não sou um robô".

Parece algo banal, afinal você apenas clica naquele quadradinho e, pronto, comprovou ser alguém de carne e osso. Só que as máquinas fracassam miseravelmente nessa missão, porque sistemas destinados a pegar "bots" no pulo não estão apenas interessados que você coloque um tiquezinho no lugar certo ou que você dê a resposta correta para uma pergunta.

Eles querem constatar se você faz isso do jeito mais pessoal possível. E robôs, por incrível que pareça, não são muito bons em simular o comportamento de um ser humano.

Há diversas ferramentas criadas para flagrar ferramentas automatizadas na internet e impedir que elas acessem serviços destinados a pessoas. O mais famoso dele é o captcha, desenvolvido por uma empresa que foi comprada pelo Google. Você já deve ter topado com ele por aí.

'Não sou um robô'

Não é nada trabalhoso assinalar "Não sou um robô". Mas, quando você clica no quadradinho, coloca para rodar engrenagens bastante complexas, desenvolvidas para atestar se a sua resposta é verdadeira, segundo explicou Oliver Emberton, CEO da Silktirde, uma empresa britânica de software.

Ou seja, a missão delas é verificar se você não está mentindo ao dizer que é um humano.

Primeiro, o sistema faz uma série de operações criptográficas apenas para evitar que as conclusões a seu respeito possam ser interceptadas -- um robô poderia "roubar" a análise sobre você, usar como se fosse dele e passar incólume pelo teste.

O sistema também dá um jeito de fazer toda essa análise valer para apenas um site. Isso quer dizer que você terá que passar por todo escrutínio novamente assim que acessar outra página.

Até agora, foram feitos apenas os preparativos e nenhuma evidência que comprova que você é alguém de carne e osso foi levantada. Mas, afinal, o que faz parte dessa averiguação de humanidade?

'Impressões digitais'

Bom, para começar, o sistema do captcha coleta dados do seu navegador que possam ser usados como "impressões digitais", ou seja, informação que o torne único, explica Emberton. Depois disso, passa a guardar e analisar outras porções de dados do seu computador, como:

  • horário e o fuso horário;
  • endereço de IP e a localização aproximada;
  • tamanho da tela e resolução;
  • plugins instalados no navegador;
  • tempo para a página carregar;
  • quantidade de teclas pressionadas e cliques no mouse.

Na próxima etapa, o sistema faz algo bastante estranho, que parece coisa de ficção científica. Ele pede para o navegador desenhar imagens invisíveis e bastante esquisitas que são enviadas ao Google, para verificação. O processo não para por aí.

robô - Getty Images/iStockphoto - Getty Images/iStockphoto
Robôs tentam se passar por pessoas, mas não é fácil conseguir simular o comportamento humano
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Isso tudo é combinado com o conhecimento que o Google possui a seu respeito. E não são poucas as ferramentas da empresa capazes de coletar suas informações, já que ela é dona do Gmail, da busca, do Maps, do YouTube, do Android, do Chrome...

Para ficar em um só exemplo, Emberton afirma que um dos detalhes checados nessa etapa é o seu histórico de navegação. Não se preocupe, no entanto, se você quer manter sob sigilo os diversos acessos a sites de conteúdo adulto. O Google está interessado mesmo é em saber se seu histórico é "convincentemente humano".

Por que é difícil fingir ser alguém

Pronto. Depois de tudo isso, o sistema já possui um veredito sobre se você é um robô ou não. São todas essas etapas e o nível pessoal das informações requeridas que complicam a vida de uma máquina.

Há uma quantidade ridícula de comportamentos humanos desconexos para estimular, quase ininteligível e que fica mudando sem que você saiba quando
Oliver Emberton

O executivo até acredita haver um jeito de conseguir isso. Mas não é tão simples:

Seu bot terá de entrar em um serviço do Google e usá-lo de forma convincente em um só computador, que deverá se distinguir do computador de outros bots de uma forma que você não entende direito. Ele vai precisar de pausas convincentes, tropeçar entre uma tecla e outra, além de movimentos de rolar o mouse. Isso tudo é incrivelmente difícil de decompor e ensinar a um computador

Ainda assim, Emberton lembra que o captcha não é infalível, e alguns robôs já conseguiram enganá-lo. Mas ele afirma que o processo de criar uma máquina capaz de imitar o jeitinho humano com precisão é tão custoso que a tarefa chega a ser inviável caso o interessado não tenha bolsos bem fundos. Isso costuma barrar a atuação de spammers, pessoas interessadas em inundar um determinado serviço com acessos automatizados e que geralmente não dispõem de tantos recursos.

Emberton faz uma ressalva de que suas conclusões valem para a segunda versão da recaptcha, modelo liberado pelo Google a partir de 2014. Até aquele ano, o recaptcha pedia apenas que usuários identificassem letras retiradas de textos de revistas e jornais -- esse trabalho de reconhecimento, feito por internautas, era usado para digitalizar livros com tipologias difíceis de serem compreendias por máquinas.

Só que esse sistema já evoluiu. A partir de 2017, a empresa parou de exibir as caixas ?Eu não sou um robô? a todo mundo, o que não quer dizer que tenha abandonado a ferramenta. O que aconteceu é que ela passou a avaliar as pessoas silenciosamente. Apenas veem essa caixa aquelas pessoas sobre quem pesem dúvidas de se serem um robô. Isso acontece quando adotam, aos olhos do Google, algum comportamento suspeito de ser automatizado.

Ou seja, caso você tope com uma dessas caixas em algum site, pergunte-se: o que estou fazendo que faria de mim um robô?