O charuto cubano: um mito distante dos sonhos dos fumantes americanos

Em Washington

  • Eduardo Vessoni/UOL

Durante mais de um século, Cuba produziu os mais finos e cobiçados charutos, a tal ponto que eram chamados de "habanos", mas desde que Washington impôs o embargo comercial à ilha em 1962, estes 'puros', como são chamados, são um fruto proibido para os americanos.

Hoje, graças a um grande investimento estrangeiro, procedimentos melhorados e especialistas em tabaco que fugiram da ilha, muitos dos melhores charutos não são mais produzidos em Cuba.

A revista Cigar Aficionado publica uma lista --considerada um padrão da indústria-- dos melhores puros do ano. Entre os 25 melhores charutos de 2014, somente dois são cubanos.

Tradicionalmente "os americanos sempre tiveram a fantasia de ter o verdadeiro charuto cubano", diz Bob Materazzi, proprietário do Shelly's Back Room, uma taberna em um movimentado cruzamento entre o bairro de negócios, faculdades de direito e escritórios do governo em Washington.

"Mas há toda uma geração que não teve charutos cubanos e gosta dos dominicanos" e de outras origens, disse em entrevista à AFP.

Fruto proibido e de menor qualidade

Materazzi acredita que vai demorar cinco anos para que os cubanos cheguem ao mercado, e mesmo quando isso acontecer eles estarão em desvantagem.

"Não têm controle de qualidade. Exigem muito de suas plantas", afirma Materazzi, que chama atenção para os desafios enfrentados pelos produtores cubanos. "Grande parte de sua produção está perdendo caráter", acrescenta.

Outro problema: já que os Estados Unidos não reconhecem as marcas cubanas, várias empresas têm os direitos de marcas estrangeiras sobre sobre famosas marcas originais, como Montecristo e Cohiba.

"Este vai ser um desafio para o mercado de charutos, decidir quem tem o direito sobre essas marcas", adverte Justin Russell, colega de Materazzi.

O que os fumantes americanos gostam é da camaradagem encontrada no mundo dos fumantes de 'puros', independentemente da marca, diz Russell.

"Posso pedir um charuto de US$ 8 e sentar em frente a alguém que prefere um de US$ 50, acendê-lo e falar sobre o que quisermos", continua.

Alguns fumantes claramente apreciam os charutos de luxo. Shelly's vende uma caixa de seis 'puros' de uma produção limitada do Arturo Fuente Opus 22, dominicanos, por US$ 325.

Ainda que os charutos cubanos finalmente cheguem ao mercado americano, terão que conquistar os fumantes acostumados a outros sabores.

"Durante os últimos 50 anos as pessoas conheceram a Nicarágua,a República Dominicana e Honduras" como produtores de puros, diz o empresário de tabacaria Matt Krimm.

"É claro que as pessoas vão comprar os produtos cubanos", em parte por curiosidade, diz. "Se vão se adaptar ao gosto atual, é outro debate", explica.

Mas um cliente da tabacaria Draper diz que os puros cubanos são conhecidos pelos bons fumantes.

"A maioria de nós tem (charutos) cubanos em nossos umidificadores", admite.

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Indiferença dos fumantes

"Matt nunca me deu um cigarro que eu não gostasse e não vende cubanos", afirma Nicholas Stefanelli, um chef que inaugura seu restaurante na capital ao mesmo tempo em que sonha com seu puro no W. Curtis Draper Tobacconist, considerada a terceira tabacaria mais antiga da nação.

Matt é Matt Krimm, coproprietário da Draper, que em sua loja de paredes revestidas de madeira a poucos metros da Casa Branca -e dos ricos lobistas da K Street- é testemunha da resistência do mercado de 'puros', diante da queda da venda de cigarros.

Entre os clientes da Draper e da Shelly's estão políticos e celebridades.

Krimm considera que os fumantes americanos atualmente estão impressionados com a ampla oferta vinda de nações que dominam o amplo mercado local na ausência de Cuba: República Dominicana, Honduras e Nicarágua.

Ele e seus clientes não necessariamente sonham com a chegada dos charutos cubanos.

"Meu entusiasmo continua sendo o mesmo de sempre", diz Krimm ao ver o presidente Barack Obama anunciar na televisão a histórica abertura das relações EUA-Cuba.

Se eventualmente a venda de charutos cubanos "se adapta a nosso modelo de negócios, faremos", acrescenta.

"Mas estamos nesse negócio há 127 anos e nos últimos 50 anos ou mais não pudemos vender nada cubano, mas continuamos (no negócio). Obviamente isso vai mudar nossa vida", destaca.

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