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Começa o Ramadã, uma celebração amarga nos países em guerra

06/06/2016 14h52

Beirute, 6 Jun 2016 (AFP) - Da Arábia Saudita à Indonésia, mais de um bilhão de muçulmanos começaram nesta segunda-feira a celebrar o Ramadã, uma festa que se anuncia novamente difícil nos países em guerra como a Síria.

Desde o amanhecer, muitos fiéis pararam de beber e de comer até o anoitecer, como estabelece o Alcorão para o mês sagrado do jejum e da oração.

O Ramadã, um dos cinco pilares do Islã, começou na maioria dos países sunitas, menos no Marrocos, onde terá início na terça-feira, e nos países xiitas, como no Irã.

Este mês de jejum é considerado um esforço espiritual e uma luta contra os prazeres terrestres durante o dia. Mas, quando o sol se põe, a festa começa com banquetes colossais onde famílias inteiras e amigos se reúnem.

Neste ano, mais uma vez, Ahmad Aswad, de 35 anos, não terá esta sorte em Aleppo, uma cidade síria bombardeada todos os dias.

"Aqui não há nada que se pareça com alegria. Este é o quinto Ramadã que passo durante a guerra", lamenta este pai de três crianças que vive em um bairro controlado pelos rebeldes.

"Sem crianças ou família"Além dos combates, a falta de alimentos e os preços astronômicos impedem a celebração do Ramadã nas cidades sírias cercadas, como em Madaya, onde uma simples alface custa 7.000 libras sírias (5 dólares).

"Há poucos produtos nos mercados e quando são encontrados estão tão caros que não é possível comprá-los", explica Mumina. Esta mulher, de 30 anos, se limita a preparar os alimentos com latas de conserva, "muito insípidas", enviadas pela ONU.

De qualquer forma, Mumina não está animada. Deverá passar o Ramadã "sem seus filhos e sua família", que precisaram fugir, como tantos outros sírios.

Em Daraya, outra cidade síria cercada, "os disparos para celebrar o Ramadã nunca param", diz sarcasticamente Shadi Matar, um militante, que conta que é preciso ser muito valente para sair e procurar comida.

Também não há clima de festa na cidade iraquiana de Fallujah, onde 50.000 pessoas estão bloqueadas no centro, enquanto as forças iraquianas e os jihadistas do grupo Estado Islâmico (EI) se enfrentam.

"Precisa se levantar às 05h00 e fazer fila para comprar um quilo de tomates por 5.000 dinares (mais de 3 dólares)", explica por telefone Abu Mohamed al Dulaimi, um pai de seis crianças.

Dois mil quilômetros ao sul, no Iêmen, Abdullah Sarhan também lamenta que, "pelo segundo ano consecutivo, a guerra tenha arruinado o Ramadã, que costumávamos celebrar com alegria e tranquilidade".

Este professor de 42 anos e sua família arriscam sua vida "a qualquer momento" com "os bombardeios quase diários" que caem em Taez, uma das cidades mais afetadas pela guerra no Iêmen.

Bares fechadosO contraste é absoluto com os outros países do Golfo. Nestes países, alguns dos quais são os mais ricos do mundo, hotéis e restaurantes competem para propor os mais caros "iftars", a refeição noturna para romper o jejum.

Em Riad, Dubai ou Abu Dhabi, o Ramadã é o mês do consumo e do excesso, apesar de algumas medidas de austeridade impostas pela queda dos preços do petróleo nos últimos meses.

Assim, o luxuoso hotel Burkh al Arab de Dubai propõe "uma variedade de iguarias tradicionais deliciosas" para o "iftar" a 400 dirhams (110 dólares) por pessoa.

O Ramadã também provoca fervor na Indonésia, o maior país muçulmano do mundo.

Na maioria do país é praticado um Islã moderado, mas em algumas regiões, vários grupos conservadores tentam impor regras rígidas durante este mês sagrado, como o fechamento de bares e de locais de lazer.

"Respeitem o caráter sagrado do Ramadã. Não nos opomos ao lazer, mas às vezes tende à imoralidade", declarou Khafar Shodiq, responsável da Frente de Defensores do Islã.

Na Tunísia, onde nenhuma lei proíbe de comer ou beber em público durante o Ramadã, o debate sobre a tolerância também está presente.

O Coletivo para as Liberdades Individuais, no qual participam várias ONGs, pediu às autoridades que "garantam as liberdades durante o Ramadã" e não fechem restaurantes ou cafés.

Na China, na região de Xinjiang (noroeste), onde vivem 10 milhões de uigures, muçulmanos de língua turca, o Partido Comunista no poder impôs restrições para celebrar este mês do jejum.

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