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Mais de três décadas após ditadura, irmãos argentinos se reencontram

Ramiro Menna (centro), irmão do 121º neto encontrado pelas Avós da Praça de Maio, gesticula ao dar entrevista em Buenos Aires, na Argentina - Eitan Abramovich/AFP
Ramiro Menna (centro), irmão do 121º neto encontrado pelas Avós da Praça de Maio, gesticula ao dar entrevista em Buenos Aires, na Argentina Imagem: Eitan Abramovich/AFP

Em Buenos Aires

05/10/2016 18h56

O neto 121 encontrado nesta semana pela ONG argentina Avós da Praça de Maio descobriu ser filho de desaparecidos da ditadura (1976-1983) e pediu um tempo para se reencontrar com suas raízes. "Temos 40 anos de amor para te dar", disse seu irmão nesta quarta-feira (5).

Sem dar detalhes de sua identidade ou pistas de seu presente, as Avós e a família biológica do neto 121 recuperado estavam felizes e ansiosos pelo novo encontro da organização. "Mais um passo na reconstrução da pátria", disse Ramiro Menna, 42 anos, irmão do então bebê roubado.

Os Menna são filhos dos desaparecidos Ana María Lanzillotto, Ani, e Domingo Menna, "El Gringo", ambos militantes do Partido Revolucionário dos Trabalhadores (PRT, marxista), cuja facção armada, o ERP, foi um dois principais agrupamentos guerrilheiros argentinos nos anos 1960 e 1970.

"O que quero dizer é que aqui há uma família que tem 40 anos de amor para te dar, somos incondicionais, não colocaremos condições em nada, queremos te abraçar, estamos te esperando", lançou Ramiro em uma coletiva de imprensa na sede da ONG em Buenos Aires, acompanhado de sua tia Alba Lanzillotto.

As avós destes jovens, hoje falecidas, participaram da luta da ONG presidida por Estela de Carlotto para procurar pelo filho que "Ani" carregava, aos oito meses de gestação, quando foi presa em 1976.

"Sabemos que o que você está passando não é fácil, se precisar de nós para algo, estamos aqui para o que for. A ansiedade é imensa e sabemos que o caminho que você tem que percorrer é difícil, mas quanto antes, melhor", disse o irmão quebrando a emoção com uma gargalhada.

Ramiro Menna, hoje professor, espera que o tempo passe rápido para conhecer seu irmão, dois anos mais novo, que segundo a imprensa seria um médico de Buenos Aires.

Perto de completar 13 anos, Ramiro soube de sua verdadeira história através de seus tios que conseguiram resgatá-lo, depois de ter sido sequestrado com seus pais, quando tinha apenas dois anos de idade.

"Aos 15 ou 16 [anos] soube que minha mãe havia sido sequestrada grávida. Foi aí que a busca mudou. Porque até então o que eu procurava era um destino, (saber sobre) o fim da minha mãe e do meu pai. Depois que soube que poderia ter um irmão, começou a busca de uma vida", disse na terça-feira (4) ao jornal "Página 12".

Com quem ele se parecerá?

Buscando essas semelhanças como qualquer tia diante de um recém-nascido da família, Alba Lanzillotto, ex-secretária das Avós da Praça de Maio, não escondeu sua ansiedade de se encontrar com quem sua irmã levava no ventre quando desapareceu há quarenta anos.

"Irmão de Ramiro, filho de Ani e 'El Gringo', onde quer que eles estejam, estão muito felizes por termos te encontrado. Estamos ansiando por um grande abraço", disse em uma mensagem durante a coletiva de imprensa que não foi transmitida pelos meios de comunicação, diferente de outras reuniões similares desta ONG.

A tia reiterou que dariam todo o tempo que fosse necessário para que ele decidisse o momento do reencontro, sem esconder que espera que esse prazo "seja mais curto do que longo".

"Quero te ver porque queremos ver parte do Gringo, parte de Ani; porque sempre há um sorriso, um sorriso que te faz relembrar esses entes queridos que já não estão mais aqui", admitiu.

Ramiro Menna, que foi missionário salesiano durante cinco anos na Etiópia, onde conheceu sua esposa, com quem agora vive em La Rioja, terra de sua mãe, é hoje um ativo militante das causas sociais.

Ressaltou que acharem seu irmão não é um assunto particular, mas uma "conquista em nossa pátria que se reconstrói, que dá passos muito importantes no auge de uma luta que sempre foi pela reivindicação da justiça".

"O que deve ser festejado é que temos a maior democracia de nossa história. Essa ditadura de 1976 tem que ser a última e isso só depende de nós", destacou Carlotto.