Topo

Maduro tenta acalmar ânimos com promessa de referendo

Presidência de Venezuela/Xinhua
Imagem: Presidência de Venezuela/Xinhua

Em Caracas

02/06/2017 17h57

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, propôs que a Carta Magna resultante de sua polêmica Constituinte seja aprovada nas urnas, movimento com o qual - dizem analistas - tenta evitar deserções no chavismo, embora nada garanta um referendo.

De forma inesperada, Maduro fez esse anúncio horas depois de a procuradora-geral da Venezuela, Luisa Ortega, ter pedido ao Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) esclarecimento sobre a ordem, por meio da qual autorizou Maduro a convocar a Assembleia Constituinte sem consulta por meio de referendo.

"Vou propor de maneira expressa, aberta e taxativa, que da nova Constituição saia o referendo consultivo para que o povo diga se está de acordo com a nova Constituição reforçada, ou não", disse o presidente na quinta-feira à noite.

Lideranças da oposição rejeitaram a oferta.

Analistas receberam a declaração com cautela, já que a Assembleia Nacional Constituinte teria poder de dissolver todos os demais poderes - incluindo o Parlamento dominado pela oposição e a Procuradoria-Geral - e decidir se se vota, ou não, o resultado de seu trabalho.

"A Assembleia Constituinte está acima do presidente, de maneira que ele não pode garantir isso. É uma jogada política", comentou o analista Luis Vicente León, em entrevista à AFP.

O especialista em assuntos eleitorais Eugenio Martínez lembrou que a Constituição proíbe "que se imponha uma agenda" à Constituinte e, por isso, Maduro "não pode dizer que haverá referendo aprobatório".

"Promessa fraudulenta: quem decide se a Constituição será consultada é a fraudulenta Assembleia Constituinte", disse o constitucionalista José Ignacio Hernández.

Termina nesta sexta-feira (2) a inscrição de candidaturas para a eleição da Constituinte que será realizada no final de julho. O poderoso líder chavista Diosdado Cabello e a mulher de Maduro, Cilia Flores, estão entre os aspirantes.

A oposição decidiu não participar por considerar todo o processo "fraudulento". Os opositores alegam que, ao adotar um polêmico método de atribuição de cadeiras, o chavismo busca garantir o controle da Constituinte para se perpetuar no poder.

Nesse contexto, a oposição insiste em manter seus protestos nas ruas. Em dois meses, os confrontos relacionados às manifestações já deixaram 62 mortos.

Nesta sexta, fizeram uma passeata até a emissora estatal VTV para rejeitar o que chamam de informações "desequilibradas" e "inverídicas". As autoridades permitiram que estudantes ligados à oposição entrassem no prédio da VTV, onde trocaram acusações com o ministro da Comunicação, Ernesto Villegas.

 'Monstros internos'

A procuradora-geral, uma chavista histórica, considera que a sentença emitida na quarta-feira, na qual o TSJ validou o processo sem uma consulta popular, é um "retrocesso" em direitos humanos e na democracia participativa.

Sua posição aprofundou o racha com o governo. Embora não a tenha mencionado, Maduro lamentou que existam "setores vacilantes".

"Não é a primeira vez, nem a última que vão surgir traidores, e sua traição começa com sua vacilação diante da necessidade de processos transformadores", manifestou Maduro, sem citá-la diretamente.

Depois disso, as vozes de chavistas que questionam a Constituinte cresceram. Dois magistrados, a ex-defensora do Povo Gabriela Ramírez e outros ex-funcionários do governo também manifestaram suas reservas.

León disse à AFP que a promessa de um referendo "rompe, em princípio, com a crítica principal" à Constituinte que existe inclusive dentro do chavismo. O objetivo seria buscar "baixar a tensão e acalmar seus monstros internos".

"Mas a probabilidade de que isso passe é baixa. A Assembleia é autônoma e decidirá o que quiser", afirmou León, acrescentando que, se decidir que não há referendo, Maduro aparecerá como aquele que "não é culpado".

Segundo analistas, a condição antidemocrática do processo não diminui, já que a convocação foi feita sem consulta popular.

Para a procuradora, a "participação popular foi reduzida à sua expressão mínima" neste caso, ao compará-la com o processo da Carta Magna vigente, de 1999, para a qual o então presidente Hugo Chávez convocou referendo.

Ela também questionou que Maduro tenha convocado a Constituinte, alegando que esse poder cabe "ao povo". Segundo a sentença do TSJ, o presidente insistiu em que a convocação "é constitucional e legal", segundo a sentença do TSJ.