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Aquecimento, pragas e árvores mortas: o aumento dos incêndios florestais nos EUA

Em 2015, um incêndio atingiu a reserva florestal de Barton Flats, em San Bernardino, no estado da Califórnia; agência já contabilizou 71 incêndios neste ano nos EUA - John Valenzuela/AP
Em 2015, um incêndio atingiu a reserva florestal de Barton Flats, em San Bernardino, no estado da Califórnia; agência já contabilizou 71 incêndios neste ano nos EUA Imagem: John Valenzuela/AP

Da AFP, em Los Angeles

02/10/2018 16h27

A seca severa, a invasão de besouros e o manejo inadequado das florestas se combinaram para matar milhões de árvores nos últimos anos no oeste dos Estados Unidos, especialmente na Califórnia, abrindo caminho para um "incêndio maciço" sem precedentes.

A situação é ainda mais preocupante pelas centenas de milhares de hectares de florestas que já pereceram sob o fogo neste verão em diferentes partes dos Estados Unidos, com mais de uma dezena de mortos.

E a temporada de incêndios florestais está longe de terminar: da Califórnia ao Alasca, passando por Idaho e pelo estado de Washington, a agência nacional de incêndios contabilizou 71 até quinta-feira passada em 400.000 hectares no total.

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Isto poderia piorar em alguns anos. No início de 2018, os especialistas alertaram sobre o risco de um tipo de incêndio florestal potencialmente muito mais perigoso.

Isto se deve à galopante mortalidade das árvores, principalmente de coníferas, que dizimou as florestas como resultado da seca e de uma invasão de besouros. Em Sierra Nevada, na Califórnia, algumas zonas perderam 90% de suas árvores, obrigando as autoridades a decretarem "estado de emergência".

'Eruptivos e imprevisíveis' 

O que isto tem a ver com o aumento dos incêndios? Os fatores em jogo são "complexos" e algumas vezes enganosos, adverte Brandon  Collins, coautor de um estudo sobre este assunto.

"A simples interpretação é que tendo árvores mortas você tem muito mais combustível para os incêndios. Pode-se esperar que os incêndios queimem com maior intensidade e mais rápido", disse Collins à AFP.

Mas a natureza e o comportamento destes incêndios não muda fundamentalmente, acrescenta Collins, que faz pesquisas com o Serviço Florestal dos Estados Unidos e a Universidade da Califórnia em Berkeley.

"É em longo prazo, 10 ou 15 anos, que os problemas começam, quando um grande número de árvores cai ao solo em um curto período de tempo. Todos esses troncos criam condições muito diferentes das que conhecemos até agora, um acúmulo de combustível propício para 'fogos maciços' tão explosivos que podem criar sua própria interação com a atmosfera", advertiu Collins, que qualifica estes incêndios de "eruptivos e imprevisíveis", como nunca vimos antes.

É possível que esses incêndios não se propaguem de forma linear pelo dossel mas pelo solo, através de brasas e "bolsas" de combustível morto, explicou, e "não é um tipo de propagação de incêndios com o qual estamos acostumados. Sequer podemos manejá-lo em nossos modelos".

Regulação natural?

A mortalidade das árvores é resultado, principalmente, de um círculo vicioso que envolve o aquecimento do clima, que debilita a vegetação por conta das secas repetidas. As árvores também são muito vulneráveis às pragas, como o besouro de pinheiro, cujas larvas matam as coníferas em toda a costa do oeste, do Canadá à Califórnia.

"Mas além deste mecanismo, há o fato de que as florestas estão em mau estado há muito tempo", afirmou Brandon Collins, que aponta a má gestão humana.

Criticou o costume de "combater os incêndios a qualquer custo", o que, segundo ele, criou "uma densidade insustentável" para as florestas. "Se cedêssemos aos incêndios em pequena escala, isso permitiria limpar as florestas sem matar todas as árvores (...) como um mecanismo de regulação natural".

Assim como o pesquisador, outros atores envolvidos no combate de incêndios apoiam a ideia de retornar a um uso mais racional das florestas.

No ano passado, o serviço florestal americano anunciou que estava intensificando seus esforços para "reduzir as florestas densas demais e torná-las mais saudáveis e resistentes".

Ao ressaltar que 56% de seu orçamento anual havia sido consumido só na luta contra os incêndios, a agência federal pediu uma mudança estratégica, privilegiando especialmente "a restauração das florestas e a manutenção dos córregos", fatores de prevenção do fogo.