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Para os cubanos da ilha, qualquer presidente é melhor que Trump

08/11/2020 11h53

Havana, 8 Nov 2020 (AFP) - Para a maioria dos cubanos que vivem na ilha, o democrata Joe Biden é um estranho, um desconhecido, mas eles têm certeza de que qualquer presidente dos Estados Unidos será melhor do que Donald Trump.

"Não devo confiar em nenhum presidente americano, mas, do jeito que as coisas estão, prefiro o outro e não Trump", disse Pablo Zaldívar, motorista de 57 anos, à AFP.

Após a histórica política de abertura com Cuba promovida por Barack Obama, o governo Trump foi um balde de água fria para o país socialista.

Sua reeleição teria sido "um desastre ou uma ameaça de Armagedom" para Cuba, diz o cientista político Jorge Gómez Barata.

Em quatro anos, Trump aplicou 130 medidas para reforçar o bloqueio, muitas das quais afetam diretamente a população e o setor privado emergente, como a restrição de remessas familiares, a suspensão de viagens de cruzeiro e a maioria dos voos diretos, além do fechamento do consulado em Havana.

Trump, "nem em pintura"

"Não quero Trump nem em pintura, como dizemos os cubanos. Que ele (Biden) vença para que possamos melhorar", disse Aidelvis Blanco, funcionário do restaurante "El Mandarín".

Segundo Oniel Díaz, diretor da consultoria privada Auge, a vitória de Biden é "uma notícia extremamente bem-vinda para a comunidade empresarial cubana. O setor privado foi um dos mais afetados pela política do governo Trump".

Mas os cubanos não esquecem que desde o triunfo de Fidel Castro em 1959, sua revolução enfrentou 12 líderes norte-americanos e as medidas mais fortes contra a ilha foram impostas por democratas.

John F. Kennedy (1961-63) autorizou a invasão da Baía dos Porcos, impôs o embargo em 1962 e estrelou a crise dos mísseis que levou o mundo à beira de uma guerra nuclear.

Bill Clinton (1993-2001) assinou a Lei Helms-Burton, endurecendo o embargo.

Apesar de pouco conhecido na ilha, Biden tem um grande ponto a seu favor: foi vice de Barack Obama, fomentou a colaboração em diversos setores após o restabelecimento das relações em 2015 e contribuiu para a unificação familiar dos cubanos em ambos os lados do estreito da Flórida.

Sua eleição "significa uma volta ao equilíbrio da política externa iniciada com Obama, na qual o compromisso de apoiar a democracia é compatível com o diálogo político, o não-isolamento e o fluir das relações entre os dois países", diz o opositor Manuel Cuesta Morúa.

Biden, "uma oportunidade a se aproveitar"

O aparelho oficial cubano se absteve de comentar até agora, porque embora quisesse se livrar de Trump, evitou colocar grandes expectativas em Biden.

"Biden não vai insistir em levantar o embargo", prevê Jorge Duany, diretor do Instituto de Pesquisas Cubanas da Florida International University.

Seu propósito será "dar poder ao povo cubano e promover a democracia na ilha", acrescenta.

Mas o que "não está claro exatamente é quais compromissos ou concessões (Biden) exigirão desse governo para melhorar as relações entre Cuba e os Estados Unidos".

Em entrevista anterior à votação para a mídia digital de oposição CiberCuba, Biden anunciou a pronta "retirada das restrições de Trump às remessas e viagens, que prejudicam o povo cubano e mantêm famílias separadas".

"Exigirei a libertação dos presos políticos e defenderei os direitos humanos em Cuba", disse também.

Se as acusações de Trump de que Biden é socialista repercutiram entre os hispânicos da Flórida que votaram no republicano, em Cuba, com seis décadas de socialismo, ninguém duvida das posições e interesses do novo presidente.

Mas Biden é "uma oportunidade que devemos saber aproveitar", diz Gómez Barata, referindo-se aos avanços que Cuba pode fazer, especialmente em matéria econômica, com relações mais relaxadas.

"A chegada de Biden à Casa Branca, junto com as recentes medidas econômicas anunciadas pelo governo cubano que abrem mais espaço para o setor privado no país, tem potencial para gerar uma situação extremamente benéfica", afirma o consultor Díaz.