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No embate com STF, Bolsonaro consegue esvaziar inquérito das fake news

O presidente Jair Bolsonaro concedeu perdão a Daniel Silveira, condenado a 8 anos e 9 meses de prisão - Anderson Riedel/PR
O presidente Jair Bolsonaro concedeu perdão a Daniel Silveira, condenado a 8 anos e 9 meses de prisão Imagem: Anderson Riedel/PR

Weslley Galzo

Brasília

26/04/2022 16h41

O embate entre o presidente Jair Bolsonaro e o Supremo Tribunal Federal (STF) em razão do perdão concedido pelo chefe do Executivo ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) tem o primeiro desdobramento político: esvaziar o inquérito das fake news. Conduzida pelo ministro Alexandre de Moraes, a investigação já levou bolsonaristas à prisão e conteve aliados no presidente que usaram as redes para atacar instituições públicas como o próprio STF. No Palácio do Planalto e na Corte, a avaliação é que o contexto político em ano eleitoral não abre espaço para novas ações que tenham como alvo os aliados de Bolsonaro.

A cúpula do governo comemora o decreto do perdão a Silveira, condenado a 8 anos e 9 meses de prisão, como um ato que, além de livrar o parlamentar aliado da cadeia, teria conseguido encurralar o STF. Por isso, dizem não acreditar em novas tentativas, já que Bolsonaro deixou claro que pode usar sua caneta.

Do lado da Corte, o episódio é considerado como mais um capítulo no discurso reincidente de Bolsonaro de prometer não cumprir decisões do STF. No 7 de Setembro do ano passado, em discurso inflamado, o presidente fez de Moraes seu alvo preferencial. Avisou que não iria cumprir decisões que o ministro viesse a proferir. "Sai, Alexandre de Moraes, deixe de ser canalha, deixe de oprimir o povo brasileiro, deixe de censurar o seu povo", discursou Bolsonaro na ocasião.

Ministros da Corte entendem que o presidente escolheu o STF como mote de discurso com intenção eleitoral clara, como mostrou o Estadão. Um ministro comentou que o governo parece querer adotar estratégia do "ganha-ganha". Ou seja, para cada ato da Corte que o contrariar ele pode contra-atacar com uma medida para enfrentar uma decisão judicial. A disposição de boa parte dos integrantes do Tribunal é agir de forma institucional, evitando abrir novas frentes que possam vir a ser usadas pelo presidente como plataforma de campanha.

Quem assessora Bolsonaro na disputa à reeleição tem relatórios de monitoramento indicando que bater no STF esquenta as redes e mantém ativos seus fiéis seguidores e naturais eleitores. Pesam nessa avaliação dos bolsonaristas que associam à imagem do Supremo a decisão de ter liberado o petista Luiz Inácio Lula da Silva dos processos da Lava Jato e, ao mesmo tempo, anulado sentenças proferidas pelo ex-juiz Sergio Moro. A condenação de Silveira, para os aliados do presidente, incluiu um terceiro elemento para reforçar a convicção nessa parcela do eleitoral que está com Bolsonaro de que o STF está contra o presidente.

O esvaziamento do inquérito das fake news não significa, porém, que Moraes está impedido de agir ou deixará de fazê-lo quando considerar que venha ser necessário para dar continuidade na investigação. Nesta terça-feira, 26, o ministro incluiu no processo do deputado bolsonarista um despacho sustentando que, independentemente do perdão de Bolsonaro, o parlamentar está impedido de disputar eleições por causa da condenação. Mas no STF avalia-se que é mais prudente, no momento, evitar adoção de medidas de maior impacto que pudessem resultar em prisão ou outras medidas coercitivas. O inquérito tramita em sigilo.

A investigação tem o poder de minar a atuação de Bolsonaro nas redes sociais. Neste ano, por determinação de Moraes, o Telegram suprimiu publicações feitas pelo presidente. Essa atuação do ministro de impor controle ao uso da internet toda vez que identificava ataques às instituições provocou a ira de Bolsonaro que, por diversas, atacou publicamente Moraes.

Em 2020, o plenário do Supremo, por dez votos a um, manteve o inquérito ativo. Na época, a apuração que fora instaurada por iniciativa da própria Corte sem o aval do Ministério Público Federal tinha sido questionada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). No mesmo ano, Moraes tinha direcionado a apuração para o chamado gabinete do ódio, revelado pelo Estadão, e que tinha como um dos articuladores o vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente.

Empresários ligados à família Bolsonaro foram objeto de investigação por suposta tentativa de financiar a disseminação de notícias falsas e ataques às instituições. Entre eles estava o dono da rede de lojas de departamento Havan, Luciano Hang. Moraes chegou a determinar busca e apreensão em gabinetes de parlamentares suspeitos de atuarem junto ao gabinete do ódio. As deputadas Bia Kicis (PL-DF) e Carla Zambelli (PL-SP) foram atingidas pelas investigações.

O influenciador bolsonarista Allan dos Santos também está no centro da apuração. Em relatório da Polícia Federal, foi acusado de tirar proveito do acesso ao presidente da República e a deputados ligados a ele para "influenciar e provocar um rompimento institucional". Allan dos Santos teve a prisão decretada, mas fugiu do País.