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Bento 16 reforçará papel mediador da Igreja em Cuba, dizem especialistas

Camila Souza Ramos

Em São Paulo

22/03/2012 18h02

Completados 14 anos da primeira visita de um papa a Cuba, o alemão Bento 16 viaja à ilha no próximo dia 26, com expectativa de reforçar a imagem de "mediadora" que a Igreja Católica possui no país, segundo especialistas consultados pela ANSA.

Inserida em um momento de reformas econômicas que estão permitindo a atuação da iniciativa privada na economia de Cuba, a visita papal deve se aproximar do campo político, em partes para reforçar a imagem diplomática da instituição, segundo o investigador da Anistia Internacional (AI) para Cuba, Gerardo Ducos.

Para ele, a Igreja Católica tende a ter cada vez mais um papel de "mediador diplomático" e deverá ser um "ator importante para os próximos anos" em uma eventual abertura política de Cuba.

Em sua opinião, o teor da mensagem de Bento 16 deverá ter foco na "importância para as liberdades fundamentais, como a liberdade de assembleia, de mobilização e de professar religião".

Atualmente, não há nenhuma proibição legal direta para que religiosos professem sua fé nas ruas cubanas. Porém, relata Ducos, muitos pastores evangélicos são detidos com base na norma que proíbe manifestações políticas de ativistas.

A liberdade religiosa e de professar a fé, segundo o teólogo Fernando Altmeyer Júnior, da PUC-SP, deverá ser o foco dos pronunciamentos de Bento 16. Para ele, "a expectativa [para a vista de Bento 16] é totalmente diferente" se comparada à de João Paulo 2, ainda que ele mantenha a diplomacia do Vaticano e insista em um "discurso direto sobre direitos humanos".

Porém, a expectativa de que o Pontífice denuncie violações neste campo é pouca, ao menos para o opositor cubano José Ferrer, da União Patriótica de Cuba, um dos ex-presos que foi libertado em 2010 na leva de 52 libertações mediadas pela Igreja e pelo governo espanhol.

"Eu, como católico praticante e ativista de uma organização da luta pacífica a favor da democratização, não espero muito da visita de Bento 16", declara. Ele atesta que o número de violações aos direitos humanos aumentou nos últimos anos e que, frente "ao que está acontecendo, nos faz esperar muito pouco da visita" com relação a eventuais pronunciamentos sobre o tema.

Para ele, o papel do Vaticano neste momento deveria ser o de "repudiar" as prisões que ocorrem "para que ninguém seja preso novamente", tornando-se um "mediador entre a oposição pacifica e sociedade geral para acabar com o horror".

No entanto, Ferrer reconhece que, para os cubanos, a passagem de Joseph Ratzinger já tem um significado de "esperança". Ele acredita que o que os cubanos precisam é "o fator da denúncia" para "animar sua fé".

Bloqueio econômico

A professora Ivenise Santinon, que leciona Teologia Pastoral na PUC de Campinas, recorda, por outro lado, que a visita pode ser um momento de reafirmação de um posicionamento contra o bloqueio econômico norte-americano imposto à ilha, uma vez que "tanto o Vaticano como o episcopado cubano são contrários ao isolamento de Cuba imposto pelos Estados Unidos" e sempre o rechaçaram.

O bloqueio econômico, inclusive, é considerado pelo investigador da Anistia Internacional como um fator que contribuiu negativamente para a situação dos direitos humanos na ilha.

A primeira condenação direta ao bloqueio por parte da Igreja ocorreu na visita de Karol Wojtyla ao país. Apesar de ter tido um papel na dissolução do regime comunista no Leste Europeu no fim da década de 1980, conforme admitiu o próprio ex-presidente soviético Mikhail Gorbachev, Boff diz que João Paulo 2 e Fidel Castro, então presidente de Cuba, "se encontraram como irmãos", em "uma sinalização positiva de que o Papa tem que estar acima da religião".