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Terremoto de 2010 deixou chilenos especialistas em retirada

Crianças aprendem em sala de aula a ser proteger em caso de terremoto - Martin Bernetti/AFP
Crianças aprendem em sala de aula a ser proteger em caso de terremoto Imagem: Martin Bernetti/AFP

02/04/2014 07h35

A experiência do terremoto de fevereiro de 2010, quando mais de 500 pessoas morreram, contribuiu para a organização e rapidez com que os chilenos deixaram a orla do norte do país na noite desta terça-feira (1º)  logo após o tremor de 8,2 de magnitude, segundo analistas e autoridades locais.

Imagens veiculadas pela TV chilena mostraram momentos de apreensão, mas não houve pânico generalizado.

Além disso, os sucessivos tremores registrados em março, na mesma região do país, já tinham deixado a população atenta para a chegada de um "possível grande terremoto", como disse o especialista Marcelo Lagos à emissora TV Chile, de Santiago.

Segundo o Escritório Nacional de Emergência do Chile (Onemi), o terremoto foi de 8,2 de magnitude. Em 2010, foi de 8,8. Terremotos de magnitude 8 ou mais são considerados "grandes", com grande capacidade de destruição de áreas próximas ao seu epicentro.

O Chile é um país com forte atividade sísmica e, segundo especialistas da Universidade do Chile, fortes tremores ocorrem no país a cada 25 anos (1960, 1985 e 2010). No entanto, não se registrava nenhum terremoto de "alta intensidade" na região norte do país desde o século 19.

Na semana passada, Mario Pardo, doutor em física e sismologia, explicou à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, os motivos para o norte do país ter registrado mais de 400 tremores no mês passado.

"Esses mais de 400 eventos se concentram em uma área relativamente pequena da área de contato entre a placa de Nazca, sob o oceano Pacifico, e a placa da América do Sul. (...) Quando as placas avançam ocorre o terremoto. Mas aqui [elas] estão 'travadas' desde o terremoto seguido de tsunami de 1877 em Iquique, o que gera uma lacuna sísmica. O que importa é que o processo está ativo", disse Pardo.

Na noite de terça, o primeiro sinal de alerta, logo após o terremoto, foi dado pelos bombeiros. Com sirenes, eles alertaram os moradores das regiões próximas à costa que estes deveriam evacuar suas casas e buscar "áreas seguras" - os pontos mais altos da cidade, longe das possíveis ondas de tsunami.

Nesta madrugada, a costa norte do Chile reviveu as cenas ocorridas em Santiago, Valparaíso e outros pontos do centro e parte do sul do território chileno em 2010.

Regiões como Arica e Antofagasta ficaram às escuras, e a comunicação por celular também foi afetada em alguns pontos, de acordo com a imprensa local.

Famílias inteiras passaram a noite nas praças nos pontos altos das cidades após terem deixado a orla caminhando ou de carro, numa fila de engarrafamento.

Agasalhadas, conversando entre eles ou ouvindo o rádio, os chilenos esperavam o fim do alerta de tsunami para voltar para casa. Pouco depois do terremoto, o Onemi informou que o "alerta para toda a costa chilena duraria seis horas". A operação de prevenção incluiu a transferência de presos e de pessoas hospitalizadas para áreas afastadas do mar.

"Após ter sido declarado alerta de tsunami, 90% dos moradores da orla foram retirados. A saída das pessoas foi muito tranquila", disse o prefeito Valentin Volta, de Antofagasta.

Um dos pontos que mais sentiu o tremor foi Arica, que também ficou sem luz e registrou vários tremores secundários, segundo o Onemi.

"Aqui em Arica temos a cultura sísmica. Mas muita gente aqui na área alta, na parte segura, diz que não pretende voltar para casa tão cedo. Que vão esperar mesmo depois que seja suspenso o alerta de tsunami", disse um repórter do canal 24 horas, falando de Arica.

Em outro extremo, no arquipélago de Juan Fernández, casas foram evacuadas no fim da noite por temor a um tsnunami. "A verdade é que depois do que enfrentamos em 2010 agora estamos melhor preparados, tanto em termos de comunicação como de prevenção", disse o prefeito local, onde em 2010 ondas de quinze metros deixaram dez mortos.

Treinamento

Os chilenos aprendem desde pequenos como agir na hora do terremoto, lembrando que é "melhor dormir com documentos e dinheiro por perto, para não esquecer na hora de sair rápido do local, saber antecipadamente onde fica a porta da saída do hotel ou de casa e, se estiver em casa, encher a banheira e tanques com água, porque falta luz e depois falta água", como disse à BBC Brasil o analista político Ricardo Israel, logo após o terremoto de 2010.


Apesar deste conhecimento e dos prédios antissísmicos em grande parte do país, os tremores assustam. Duas das mortes relacionadas ao terremoto de terça-feira à noite ocorreram por paradas cardíacas.

Em 2010, o governo da então presidente Michelle Bachelet - reeleita há menos de um mês - foi criticado pela oposição, que a acusou de ter demorado a dar o alerta de tsunami e a convocar as Forças Armadas para, por exemplo, viabilizar a evacuação das casas e de outros locais perto da orla.

Na madrugada dessa quarta-feira, Bachelet falou aos chilenos por volta das 2h da manhã locais (2h de Brasília). Diante das câmeras de televisão, ela informou que estava acompanhando toda a situação.

"Declaramos alerta (para a região afetada pelo tremor). E declaramos estado de emergência para (as cidades de) Arica, Parinacota e Tarapacá, com o envio das Forças Armadas para a manutenção de ordem pública (nestes locais)", disse a presidente.

"E quero pedir às pessoas que mantenham a calma. E dizer que o governo vai continuar trabalhando", afirmou.

Em 2010, estabelecimentos comerciais das áreas afetadas pelo terremoto e tsunami foram saqueados. Dessa vez, o governo pediu a ajuda dos militares para evitar novos distúrbios, de acordo com a imprensa local.