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Venezuela chama ex-tesoureiro de Che Guevara para ajudar em 'nova revolução'

Daniel Pardo

Da BBC Mundo em Caracas

04/07/2014 17h53

O homem convidado pelo próprio presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, para conduzir uma "revolução dentro da revolução" no país é um economista que foi tesoureiro de Che Guevarra.

Trata-se de Orlando Borrego, um cubano que, aos 21 anos, entrou para as fileiras lideradas pelo revolucionário argentino nas montanhas da ilha, há pouco mais de meio século.

Após o triunfo da revolução cubana, em 1959, Borrego virou um dos homens fortes dentro do governo cubano, sobretudo na área econômica.

Agora que a Venezuela se encontra em sua pior situação econômica em décadas, o ex-guerrilheiro e hoje professor de economia chega para ajudar Maduro a enfrentar a crise.

"Borrego foi um funcionário leal e é uma ótima pessoa, comprometida com os princípios da revolução socialista, e incorruptível", disse à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, um dos biógrafo de Guevara, o americano Jon Lee Anderson.

Revolução dentro da revolução

O governo Maduro passa por um momento definidor, não apenas porque a economia está a caminho de uma recessão, mas porque vários dos assessores mais próximos do ex-presidente Hugo Chávez se tornaram os maiores críticos do "herdeiro" da revolução.

A três semanas do congresso do partido do governo, o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), as bases do chavismo parecem estar divididas entre facções, algumas mais radicais que outras.

A divisão existe há alguns meses, mas uma dura carta escrita pelo ministro de Planificação, Jorge Giordani, arquiteto do modelo econômico socialista instalado por Chávez, ao deixar o governo, deixou claros os rachas.

Maduro e seus partidários responderam às críticas com um chamado à lealdade e anunciaram uma restruturação do governo, qe será coordenada por Borrego.

"Orlando Borrego (...) foi chamado para fazer uma revolução total e profunda na administração pública, na administração do Estado, uma revolução dentro da revolução", disse Maduro na terça-feira em seu programa de rádio e televisão.

Com isso, rumores sobre trocas ministeriais explodiram.


De camponês a guerrilheiro e ministro

Borrego, também conhecido como "Vinagrete", nasceu no estado de Holguín, em Cuba, como o sétimo irmão de uma família cujo pai era taxista e a mãe, professora.

Quando jovem, trabalhava à noite após estudar contabilidade, até que se juntou à coluna liderada por Guevara nas montanhas de Escambray.

No livro de Anderson, Uma vida revolucionária, Borrego diz que, mais que ao socialismo ou ao comunismo, sua devoção era por líderes revolucionários como Fidel e Guevara.

"Queríamos uma revolução que fosse justa, que fosse honrada, voltada para os interesses do país, mas de comunismo nada", disse ao jornalista da revista The New Yorker.

Socialista crítico

Já com Fidel no poder, Borrego foi nomeado assessor de Guevara no Ministério das Indústrias.

Antes de ir para a Bolívia, onde morreu nas mãos do Exército boliviano, Che deixou com Borrego sua famosa crítica da política econômica soviética, um livro que, segundo Anderson, "Fidel não deixou que publicasse até recentemente".

Depois da morte de Guevara em 1967, Borrego dirigiu o Ministério do Açúcar.

Foi nessa época, em 1970, que Fidel lançou um plano prevendo uma safra de 10 milhões de toneladas de açúcar - o principal produto de exportação do país - para dar impulso à empobrecida economia cubana.

Segundo relatos de um jornalista cubano à BBC Mundo, Borrego "encarou Fidel, disse que isso era uma loucura, que o país não estava preparado".

"Qual foi a consequência? Destruíram-no (a Borrego), até na imprensa riam dele", conta.

O projeto das dez safras de fato não cumpriu seu objetivo: produziu 8 milhões de toneladas.

Atualmente, Borrego, de 78 anos, se dedica a escrever e dar aulas, embora tenha, nos últimos anos, segundo Anderson, sido usado como assessor informal dos ministérios do Transporte e do Turismo.

"É um apoiador incondicional da revolução. É próximo de Fidelito, o filho mais velho de Fidel, e do próprio Raul (Castro)."

Mas só o tempo dirá se este "apoiador incondicional da revolução cubana" é o home certo para fazer "uma revolução dentro da revolução bolivariana" na Venezuela.