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Austrália usa o tsunami para pressionar Indonésia por clemência a traficantes

9.fev.2015 - Irmão e mãe apelam para as autoridades indonésias executem o australiano Andrew Chan, acusado de tráfico de drogas - Romeo Gacad/AFP
9.fev.2015 - Irmão e mãe apelam para as autoridades indonésias executem o australiano Andrew Chan, acusado de tráfico de drogas Imagem: Romeo Gacad/AFP

18/02/2015 08h23Atualizada em 18/02/2015 08h40

O governo da Austrália elevou a pressão sobre a Indonésia ao usar a ajuda humanitária prestada ao país após o tsunami de 2004 como uma razão para que as autoridades indonésias não executem dois australianos condenados à morte por tráfico de drogas.

Mas a manobra gerou uma forte reação de Jacarta.

A Indonésia pretende executar oito prisioneiros ainda este ano, entre eles os australianos Andrew Chan e Myuran Sukumaran e o brasileiro Rodrigo Muxfeldt Gularte.

A transferência dos australianos para a prisão onde as execuções são realizadas foi adiada, mas as autoridades não estipularam uma data.

Já a família de Gularte tenta que o paranaense seja transferido para um hospital psiquiátrico, após um diagnóstico de esquizofrenia. Segundo seu advogado de defesa, a lei indonésia proíbe a morte de um prisioneiro que não esteja em plenas condições mentais. A execução do brasileiro também foi adiada.

O primeiro-ministro australiano, Tony Abbott, disse que seu país enviou US$ 780 mi em ajuda à Indonésia após o tsunami de 2004, que deixou cerca de 200 mil mortos e desaparecidos somente no país.

"Eu diria ao povo e ao governo indonésios: nós da Austrália sempre estivemos aqui para ajudá-los, e esperamos que vocês retribuam", disse ele a repórteres.

Abbott sugeriu que haverá consequências caso os pedidos australianos sejam ignorados. "Deixaremos clara a nossa insatisfação... em termos absolutamente inequívocos".

Mas o governo da Indonésia reagiu fortemente, dizendo que "ameaças não fazem parte da linguagem diplomática e que ninguém responde bem a ameaças".

A Indonésia tem uma das legislações mais duras do mundo contra o tráfico e pôs fim a uma moratória de quatro anos a execuções em 2013.

As mortes são por fuzilamento e, no mês passado, o carioca Marco Archer se tornou o primeiro ocidental a ser executado no país.

O presidente indonésio, Joko Widodo, disse que não concederá clemência a condenados por tráfico, argumentando que milhares de indonésios morrem todos os anos por envolvimento com drogas.

Último recurso

Chan e Sukumaran foram condenados em 2006 como líderes de um grupo de tráfico de drogas conhecido como "Os Nove de Bali". Eles foram presos em 2005 ao tentar embarcar com 8,3 kg de heroína para a Austrália.

A defesa dos australianos recorrereu da condenação à morte alegando que eles se transformaram na prisão - Chan coordena sessões de leitura bíblia e dá aulas de culinária na prisão. Sukumaran teria virado artista.

Eles deveriam ser transferidos nesta semana para a prisão de Nusakambangan, onde as execuções são realizadas, mas esse processo foi adiado.

Autoridades disseram que o adiamento foi decidido para que os condenados passem mais tempo com suas famílias. Tony Spontana, porta-voz do procurador-geral da Indonésia, disse à BBC ser improvável que as execuções ocorram neste mês, já que os preparativos na prisão atrasaram.

A execução de Gularte, de 42 anos, também foi adiada, disse Spontana. A família do brasileiro foi informada do adiamento, disse à BBC Angelita Muxfeldt, prima de Gularte, que está na Indonésia.

O brasileiro foi diagnosticado com esquizofrenia por um médico do governo local e a família aguarda uma decisão ao pedido de transferência para um hospital.

Este é o último recurso para evitar a morte do paranaense, já que seus dois pedidos de clemência foram negados. Ele está preso desde julho de 2004, após tentar entrar na Indonésia com 6kg de cocaína escondidos em pranchas de surfe. Foi condenado à morte no ano seguinte.

Os outros prisioneiros que deverão ser executados são de França, Gana, Nigéria e Indonésia e uma mulher das Filipinas.

Marco Archer foi executado com outros cinco prisioneiros, apesar do pedido por clemência feito pela presidente Dilma Rousseff.

Na ocasião, o governo brasileiro disse que a execução criaria "uma sombra nas relações entre os dois países".

'Boicote a Bali'

A pressão sobre a Indonésia aumentou também na internet, onde a campanha "#BoycottBali" nas redes sociais tem pedido para que australianos boicotem a popular ilha de Bali.

Os indonésios reagiram, dizendo que a campanha é uma "reação exagerada" e que Bali poderá sobreviver sem o turismo de australianos.

O vice-presidente indonésio, Jusuf Kalla, disse que pedidos de boicote ao país não influenciarão a decisão de executar ou não os prisioneiros.

O grupo de direitos humanos Anistia Internacional também tem pedido que todas as execuções sejam canceladas e que a pena capital seja abolida.