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Beijaços são um favor e aumentam minha votação, diz Eduardo Cunha

Presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) - Jorge Araujo/Folhapress
Presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) Imagem: Jorge Araujo/Folhapress

Jefferson Puff e Paula Adamo Idoeta

Da BBC Brasil, no Rio de Janeiro e em São Paulo

31/03/2015 15h59

O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), disse que protestos e "beijaços" realizados contra ele por movimentos de defesa dos direitos de gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros o beneficiam e são "um favor".

"Imagina se 20 pessoas gritando ou me agredindo vão mudar minha posição. Isso justamente só me faz crescer, porque à medida que eles fazem isso, eles só aumentam o meu conceito e a minha votação do outro lado [conservador]", disse Cunha em entrevista à BBC Brasil no último sábado (28), em evento na favela de Rio das Pedras, Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio.

Um dia antes, cerca de 50 manifestantes haviam recebido Cunha com beijaços e gritos de "homofóbico" e "machista" na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp). Na última segunda-feira (30), o deputado também foi alvo do mesmo tipo de protesto durante um evento na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre.

"O que eles estão fazendo para mim é um favor. Eu adoro quando sai uma manchete dessa, de dois caras se beijando, é ótimo para mim. Se eles soubessem como isso me faz bem, não fariam. Espero que eles continuem fazendo isso em todos os lugares por onde eu passar, e que vocês da mídia fotografem e publiquem."

Cunha, que é evangélico, já se declarou contrário a projetos de criminalização da homofobia e de legalização do aborto. Também é investigado pela Procuradoria-Geral da República na chamada operação Lava-Jato, que apura denúncias de corrupção na Petrobras - ele nega as acusações.

'Prepotência'

"A declaração dele está alinhada com a prepotência que é a marca de Eduardo Cunha", respondeu à BBC Brasil nesta terça-feira Pedro Serrano, representante do Juntos!, movimento jovem ligado ao PSOL que participou da manifestação contra Cunha na Alesp.

"O problema é que essa declaração subestima a capacidade da população de se mobilizar em torno de pautas democráticas por uma sociedade mais justa e igualitária", disse, citando o recuo - após os protestos de 2013 - da Câmara dos Deputados com relação ao projeto da "cura gay", patrocinado pelo então presidente da Comissão de Direitos Humanos da Casa, Marco Feliciano (PSC-SP).

"Nosso plano é ampliar os protestos", disse Serrano, afirmando que o objetivo é mostrar que "a luta pelo direito democrático" faz parte também da "luta pela moralização da política".

Para o cientista político Wagner de Melo Romão, professor da Unicamp, polarizar em temas polêmicos realmente costuma beneficiar políticos que disputam eleições proporcionais, como as para a Câmara, em que os votos de grupos de interesse ou com determinadas ideologias acabam sendo suficientes para eleger deputados.

Segundo ele, no entanto, tais polêmicas podem ser prejudiciais em eventuais disputas a cargos executivos, em que a votação é majoritária. "Nessas disputas, em que os políticos tentam agradar um perfil de eleitorado bastante amplo, eles costumam evitar essas bolas divididas (temas polêmicos)", explica.

Por um lado, opina o cientista político, Cunha parece adotar a estratégia de tomar posições duras para mostrar uma imagem de "autenticidade" perante o público.

Por outro, diz Romão, a reincidência de protestos do tipo poderia acabar trazendo algum desgaste ao deputado, que hoje ocupa "um posto institucional na linha sucessória [da Presidência da República]"

Votos

Outros políticos conservadores já se beneficiaram ao apostar em temas polêmicos, como o próprio deputado Marco Feliciano, pastor evangélico e alvo de protestos por posturas consideradas racistas e homofóbicas.

Em 2013, o também pastor Silas Malafaia, líder da igreja Assembleia de Deus, disse, segundo a Folha de S. Paulo, que queria "agradecer ao movimento gay": "Quanto mais tempo perderem com o Feliciano, maior será a bancada evangélica em 2014. (...) Se Feliciano tiver menos de 400 mil votos na próxima eleição (referindo-se à de 2014), eu estou mudando de nome".

Feliciano, que havia sido eleito com 212 mil votos em 2010, conquistou 398 mil no pleito do ano passado, sendo o terceiro candidato a deputado federal mais votado de São Paulo.