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Conheça Anavra, o rico vilarejo grego que não quer sair da Europa

Vilarejo de Anavra, no norte da Grécia - BBC
Vilarejo de Anavra, no norte da Grécia Imagem: BBC

Joe Miller

Da BBC News, em Anavra

02/07/2015 17h55

Nos anos 1970, quando Dimitris Tsoukalas era adolescente, mulas eram o único meio de transporte disponível em seu vilarejo, Anavra.

Escondida em um declive do monte Ótris, no nordeste da Grécia, Anavra não tinha ruas asfaltadas e seus métodos de agricultura quase não haviam mudado em séculos.

A escola mais próxima do vilarejo ficava na cidade grega de Lamia --uma viagem de seis horas na mula--, o que forçava todas as crianças, a partir de certa idade, a deixarem sua cidade natal.

As coisas, no entanto, são bem diferentes hoje em dia.

Anavra é famosa por ser um dos vilarejos agrícolas mais prósperos de todo o sul da Europa, com uma renda média anual de 70 mil euros por domicílio (o equivalente a R$ 242 mil).

Diferentemente do resto dos gregos, ninguém na cidadezinha está desempregado.

"A maior parte dos moradores daqui votarão 'sim' no domingo", diz Dimitris. E não é difícil enxergar por que os habitantes locais querem que a Grécia aceite o pacote de austeridade proposto pela Europa e pelo FMI, que será votado em referendo no próximo dia 5 de julho.

Oportunidade

Ao caminhar por Anavra hoje, é possível ver uma escola moderna, uma biblioteca, uma academia de ginástica, campos de futebol e de basquete, um punhado de cafés, uma igreja resplandecente e até mesmo um museu.

As estradas estão pavimentadas e a maioria dos habitantes dirige picapes. Eles também têm TV por assinatura e conexão rápida à internet.

"Agora os jovens ficam aqui", diz Dimitris.

Muito disso é um resultado direto da entrada da Grécia na União Europeia --além do empreendedorismo de Dimitris.

No início dos anos 1990, depois de trabalhar em uma empresa de eletricidade em Atenas por 35 anos, Dimitris retornou para Anavra com o objetivo de reformar sua economia rústica.

Depois de ser eleito prefeito, ele viajou a Bruxelas, onde encontrou-se com todos os funcionários da UE que aceitaram conversar com ele e reuniu informações sobre todos os subsídios disponíveis para comunidades rurais.

De volta à Grécia, ele contornou a burocracia local e fez pedidos de fundos europeus por meio dos ministérios relevantes em Atenas. Isso, diz ele, "não foi muito grego".

Rapidamente, Dimitris percebeu que muitos dos programas de desenvolvimento da UE tinham foco no meio ambiente. Para conseguir qualificar Anavra, ele estimulou os fazendeiros locais a se dedicarem à produção de orgânicos e a adotarem fontes de energia limpa.

Logo, a União Europeia financiou um moinho de vento na cidadezinha e, em seguida, estradas, estábulos, linhas de telefone e até um parque ambiental.

As 30 mil vacas, cabras e porcos de Anavra eram criados soltos no vilarejo, o que causava problemas de saúde. Quando técnicas modernas de criação foram introduzidas, a qualidade do gado e dos produtos locais aumentou --e também o preço que cobravam por eles.

Professores foram para Anavra e também um médico.

"Se não estivéssemos na União Europeia, isso não teria acontecido", afirma Dimitris, apontando para uma pequena, mas bem construída, praça central. "O projeto europeu foi uma bênção para nós."

Dimitris Tsoukalas, morador do vilarejo de Anavra, no norte da Grécia - BBC - BBC
Dimitris Tsoukalas, morador do vilarejo de Anavra, no norte da Grécia
Imagem: BBC

Receio

Mas se a Europa foi o motor da ascensão extraordinária de Anavra, a tão criticada burocracia da Grécia ameaça puxá-la novamente para o chão.

Em 2011, reformas realizadas como parte do "Plano Kallikratis", do primeiro-ministro George Papandreou, condensaram o número de municípios do país de mais de mil para apenas 325.

Anavra, que tinha administração própria, passou a ser subordinada ao município de Almyros, cuja sede fica a uma hora de carro do vilarejo.

A nova municipalidade é composta de 43 vilarejos e tem uma população de 21 mil pessoas espalhada por mais de 900 quilômetros quadrados.

"Eles estão lá perto do mar. Não sabem nada sobre a vida nas montanhas", lamenta Dimitris.

Consequentemente, o "milagre de Anavra", como é conhecido o sucesso da cidadezinha, estagnou nos últimos anos.

O financiamento para a construção planejada de uma hidrelétrica não chegou e uma usina de energia que seria alimentada por esterco e lascas de madeira padeceu do mesmo problema.

"Quando Dimitris era prefeito, a neve era limpa todos os dias no inverno e continuávamos a fazer negócios", diz Machi, um imigrante albanês que administra um café em Anavra. "Agora, ela é deixada lá até que derreta."

Surpreendentemente, no entanto, Dimitris é um dos poucos habitantes de Anavra que diz que votará "não" no referendo. Mas só porque, após ler as propostas da União Europeia, teme que elas estejam enganadas.

"Se não houver amortização da dívida, os gregos sofrerão por duas ou três gerações", afirma.

Perguntado se está preocupado que uma vitória do "não" signifique a saída da Grécia da zona do euro --como alertou o presidente da Comissão Europeia Jean-Claude Juncker--, Dimitris nega.

"Eu nunca votaria para sair da Europa."