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Dupla de 'super-heróis' ganha fama combatendo má educação urbana no México

Os Supercívicos, dupla formada por Arturo Hernández e Alex Marin y Kall, denuncia com vídeos de humor problemas de atitude cívica na Cidade do México - BBC
Os Supercívicos, dupla formada por Arturo Hernández e Alex Marin y Kall, denuncia com vídeos de humor problemas de atitude cívica na Cidade do México Imagem: BBC

Juan Paullier

Da BBC Mundo, na Cidade do México (México)

31/07/2015 07h59

Meio-dia de sexta-feira. Sul da Cidade do México. Avenida dos Insurgentes. Um buraco enorme na rua. Trânsito pesado. E uma pessoa dentro do buraco, de túnica branca, foice na mão e caveira no rosto.

Assim atuam os Supercívicos, a dupla formada por Arturo Hernández e Alex Marin y Kall. Com humor e diversão, eles procuram expor problemas na atitude cívica dos mexicanos e gerar um sentimento de comunidade entre os cidadãos. Fazem isso de diferentes formas: tomam o metrô para denunciar homens em vagões exclusivos para mulheres, gritam com megafone para motoristas parados em fila dupla e usam o celular para flagrar quem estaciona em vagas de deficientes de forma irregular.

A BBC Mundo acompanhou a dupla em um dia de 'happenings' (acontecimentos, em tradução livre), como eles classificam as ações, que realizam uma vez por semana. Os happenings são divulgados no canal dos Supercívicos no YouTube, na página da dupla no Facebook e no programa de TV El Incorrecto (O Incorreto, em tradução livre).

Dia de agir

A ação começa nos escritórios da dupla em Coyoacán, sul da capital mexicana. O plano é mostrar quatro locais perigosos para os moradores da cidade e registrar tudo. "A cultura da denúncia no México é muito pobre", afirma Hernández, de 45 anos.

Dois carros funerários alugados acompanham a equipe até a primeira parada do dia. A dinâmica da dupla envolve uma gravação rápida diante de um enorme buraco aberto há mais de duas semanas numa avenida. Sinalizado apenas com escombros, paus e fitas, é um risco para milhares de motoristas que passam pela via todos os dias.

Hernández se disfarça de morte, e Marin y Kall, também conhecido como "Ese Wey", de diretor de funerária. A câmera grava, e dias depois o vídeo estará na internet, onde será visto por milhares de pessoas. O político responsável pelo buraco se envergonhará. E o buraco será tampado --ao menos é o que eles esperam.

Em seguida, a dupla vai até a Avenida dos Poetas, na região de Santa Fé, onde há um ponto de ônibus em local inadequado, que ameaça pedestres. Uma mulher chegou a morrer nesse local. Eles começam então a filmar; em poucos minutos a polícia chega e a dupla mantêm uma conversa respeitosa com os oficiais. Eles vão embora esperando que as autoridades façam logo algo a respeito. Pelo menos deram visibilidade ao problema. Isso é o que buscam os Supercívicos.

"Procuramos mostrar coisas absurdas que ocorrem todos os dias na Cidade do México, para que as pessoas entendam que é possível fazer as coisas de outra maneira", explica Marin y Kall, comediante, locutor e produtor de 38 anos. "O denominador comum da mente do mexicano, de gente de bem que comete muitos erros cívicos, é o 'só um pouquinho', um verdadeiro câncer", opina Hernández. "A guimba de cigarro é 'um lixozinho'. Bloquear a rampa para um deficiente, 'só um pouquinho enquanto estou almoçando', parar em fila dupla, 'só um pouquinho'", ele completa.

'O mexicano é reprimido'

Esse produtor e diretor, conhecido do público latino pelo trabalho como apresentador da MTV nos anos 1990, está embarcando numa cruzada: empoderar as pessoas para que usem o celular como meio de denúncia. Para ele, isso é algo natural, que faz quase todo dia.

Os mexicanos têm medo e não levantam a voz, provoca Hernández. "As pessoas acreditam que o mexicano é aguerrido, e isso não é verdade. O mexicano, na maioria das vezes, é medroso, uma pessoa reprimida."

Os primórdios

Os Supercívicos nasceram há dez anos, quando Hernández andava de carro com um amigo pela Cidade do México e quase sofreu um acidente por imprudência de outro motorista. Comprou, então, um carro Valiant Duster de 1969 por cerca de US$ 260, enfeitou o veículo, instalou um periscópio e alto-falantes. Percorria as ruas e chamava a atenção das pessoas quando encontrava alguma situação inadequada,

Fez um programa piloto que atraiu a TV Azteca, mas a relação durou apenas quatro meses porque "censuravam tudo", afirma. Oito anos depois, foram para o canal MVS, mas também acabaram sendo tirados do ar.

O último sucesso da dupla foi um vídeo em que aparecem retirando propaganda eleitoral das ruas. O material não foi ao ar no programa El Incorrecto, mas superou 9 milhões de visualizações na página dos Supercívicos no Facebook.

Para além da popularidade e do entretenimento, ambos dizem acreditar que podem, aos poucos, impactar as pessoas.

"O que mais importa para nós é mudar essa 'chavinha' das pessoas para que acreditem que sim, é possível", aponta Ese Wey. "Talvez a mudança seja mínima, mas é uma mudança", afirma Hernández, "e isso já é positivo".

Conscientes de que não podem resolver todos os problemas, eles buscam, contudo, deixar uma mensagem: é possível fazer as coisas de um jeito melhor.