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Milhares se engajam em busca por garoto sírio de 5 anos perdido na Europa

Mobilização pelo menino nas redes sociais começou após programa da BBC mostrar Azam, 5, acompanhado por homem suspeito que dizia ser seu pai - BBC/Reprodução
Mobilização pelo menino nas redes sociais começou após programa da BBC mostrar Azam, 5, acompanhado por homem suspeito que dizia ser seu pai Imagem: BBC/Reprodução

09/10/2015 09h05

Um garoto de cinco anos chamado Azam está entre os milhares de refugiados em trânsito pela Europa. O menino se feriu gravemente, em um provável acidente de carro, e ainda deve estar precisando de ajuda médica.

Após o garoto aparecer no programa Panorama, da BBC, europeus começaram a usar uma hashtag no Twitter para tentar localizá-lo.

A busca começou por iniciativa do público. Depois da exibição da história do garoto na TV, em 30 de setembro, #Find Azam (Encontre Azam) foi lançada pela usuária do Twitter Rosie Bloom, que escreveu: "Um garotinho, Azam, está por aí com a mandíbula quebrada e sem pais. Essa era a história a ser seguida, Panorama".

Durante a noite, usuários começaram a enviar tuítes para a conta do BBC Panorama e para o apresentador do programa, John Sweeney.

A hashtag entrou na lista de mais usadas no Reino Unido em 1º de outubro. Desde então já foi empregada mais de 8.000 vezes, em locais como Áustria, Alemanha, França e Suécia.

Havia algo claramente perturbador nas imagens do menino. O pequeno Azam, de grandes olhos castanhos e cabelos negros, tinha um olho roxo e uma grande atadura na mandíbula inchada.

A equipe do BBC Panorama estava em um centro de recepção - um eufemismo para uma espécie de caos em câmera lenta - em uma cidade de fronteira na Sérvia.

O homem que conduzia Azam vestia uma jaqueta de couro e disse à equipe, em árabe, que o menino havia se machucado em um acidente com um carro na Macedônia: "Ele estava dormindo no chão e um táxi o atropelou."

O homem da jaqueta de couro disse que a mãe de Azam estava na Turquia. E o pai? Ele apontou para um outro homem, que vestia uma camiseta rosa. Azam e seu suposto pai viajavam em um grupo de 13 homens.

O apresentador John Sweeney disse ter imaginado que o menino tivesse fraturado o queixo, mas ouviu de seus acompanhantes que ele passara por um raio-X na Macedônia e que não havia fratura. Então o grupo seguiu para os trâmites de registro pelas autoridades sérvias.

A guerra na Síria já causou 250 mil mortes, e muitas dessas vítimas são crianças. Para quem vê de fora, é quase impossível imaginar o quão sombrio o conflito pode ser.

Versão questionada

No dia seguinte, a equipe da BBC estava em Belgrado, capital da Sérvia, e chovia muito. Um parque ao lado da estação de ônibus da cidade, o ponto de parada para pessoas na estrada, era uma confusão de lama e gente.

Foi quando a equipe encontrou Azam de novo, urrando de dor enquanto um médico sérvio limpava sua mandíbula. "Quero minha mamãe", disse o menino. Ele estava sozinho.

A médica Radmila Kosic coordenava um centro médico improvisado numa barraca. E disse a Sweeney: "Vamos apenas tratar esse machucado e enviá-lo numa ambulância a um hospital."

Sweeney perguntou pelo pai de Azam, e a médica disse que ele estava por ali havia um minuto. O apresentador estranhou o fato de um pai não estar por perto enquanto seu filho chorava de dor.

O intérprete da equipe conversou com Azam e algo não batia. Ele não falava claramente pela mandíbula machucada, mas a questão é que seu "pai" não era seu pai, mas um "tio". O pai real ainda estava na Turquia.

Daí o homem que dizia ser pai de Azam apareceu. Preocupado, o intérprete questionou o homem a respeito, e ele disse: "Sou o pai dele."

A equipe não teve como comprovar o que o homem dizia. Seja quem fosse, pai ou tio, ele não parecia disposto a esperar Azam ser tratado em um hospital por muito tempo.

Afirmou ao intérprete que iria pressionar os médicos para poder ir logo ao norte da Europa: "Vou ver como as coisas andam, mas vou embora amanhã de qualquer jeito."

Sumiço

No caos do momento, a última frase do homem não foi traduzida ao pé da letra, e claramente a atitude dele mudou quando ele e Azam entraram na ambulância rumo ao hospital. Foi a última vez que o apresentador viu Azam.

Cerca de uma hora depois a equipe teve uma atualização sobre o estado do menino. Um raio-X havia confirmado que sua mandíbula estava quebrada. A médica Kosic disse: "Ele vai ficar internado por vários dias, tenho certeza."

Só que isso não aconteceu. A equipe da BBC soube depois que antes que Azam Aldaham pudesse receber o tratamento que tanto precisava, ele e o homem tinham desaparecido.

Sweeney diz que, olhando em retrospectiva, foi um daqueles momentos terríveis quando seus instintos humanos e de pai percebem que algo está errado. Mas havia tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo, diz o apresentador, que a equipe pensou que ele estaria bem quando entrou na ambulância.

A dimensão da busca nas redes sociais por Azam foi amplificada por contas da BBC usando a hashtag e pelo próprio repórter John Sweeney. Usuários do Twitter começaram a escrever sobre o caso para a Interpol, a polícia internacional, e para outras organizações humanitárias.

A hashtag foi divulgada na imprensa de países como Estados Unidos, Sérvia, Espanha e Austrália, e pela ativista de direitos humanos Bianca Jagger.

Mas apesar de todos os tuítes, há provas de que campanhas em mídias sociais podem ajudar a localizar imigrantes?

A hashtag está sendo usada sobretudo em inglês, e não em árabe, o que pode limitar o alcance da campanha entre outros refugiados sírios. Por outro lado, há muitos imigrantes sírios usando o Facebook para encontrar parentes e amigos desaparecidos em jornadas em busca de refúgio pela Europa.

Nos últimos dias, a busca continua a se espalhar, com mais de mil publicações no Facebook. O braço da ONU (Organização das Nações Unidas) para refugiados também tuitou sobre Azam, informando desconhecer o paradeiro do garoto, mas esperar que "ele esteja sendo tratado".