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Prisão de Delcídio abre precedente que pode se repetir com Cunha, dizem analistas

Mariana Schreiber

Da BBC Brasil em Brasília

25/11/2015 11h59

A prisão do senador Delcídio Amaral (PT-MS), líder do governo no Senado, na manhã desta quarta-feira, tem potencial para causar grandes estragos tanto no governo Dilma Rousseff como no Congresso Nacional, avaliam cientistas políticos.

Para analistas ouvidos pela BBC Brasil, a detenção inédita de um senador em exercício do seu mandato coloca pressão sobre os demais congressistas, principalmente o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), também investigado por suposto envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras.

Delcídio foi preso por tentar atrapalhar investigações da operação Lava Jato. No caso de Cunha, desde julho cogita-se que a Procuradoria-Geral da República (PGR) poderia solicitar ao Supremo Tribunal Federal (STF) seu afastamento da presidência da Câmara por supostas tentativas de usar seu cargo para dificultar apurações contra ele.

Parlamentares de oposição também cogitam fazer esse pedido ao STF depois de Cunha ter agido na semana passada para suspender uma sessão do Conselho de Ética que analisaria a possibilidade de abertura de um processo de cassação contra ele - a decisão ficou para a próxima terça.

Na ocasião, Cunha afirmou que não houve "qualquer tipo de manobra" em relação à sessão do conselho.

Algumas dezenas de parlamentares são alvo da Lava Jato - a PGR não soube informar exatamente quantos.

"Cria um precedente que leva intranquilidade a todos os congressistas supostamente envolvidos nessas denúncias recentes, com destaque para a Cunha", afirma o professor da UnB David Fleischer, avaliando que a ação do presidente da Câmara pode ser enxergada como manipulação para evitar a própria cassação.

"A partir daí, por exemplo, o próprio presidente da Câmara poderia ser preso também se fosse configurado o fato de ele estar obstruindo investigação", acredita também Antônio Lavareda, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Baque para governo

Por outro lado, a prisão de Delcídio representa um baque para o Planalto, não só porque traz mais holofotes sobre denúncias de corrupção envolvendo o PT, mas também por atingir o principal articulador político do governo hoje no Congresso.

Antes de se filiar ao PT, Delcídio assumiu a diretoria de Gás e Energia da Petrobras durante o governo Fernando Henrique Cardoso, entre 2000 e 2001. Depois, aceitou convite para assumir o cargo de Secretário de Estado de Infraestrutura e Habitação no governo de Zeca do PT, em 2001. Em seguida, foi eleito em 2002 senador pelo PT.

"É mais uma coisa bastante negativa para o governo Dilma, porque ele era líder do governo no Senado. Mas não só por isso, com certeza não há ninguém no PT com tanto trânsito na oposição - sobretudo no PSDB - quanto o senador Delcídio, que é considerado por todos uma figura afável, equilibrada. Com certeza, inclusive, a oposição não está comemorando essa prisão", disse Lavareda.

"Ele era tido como o senador cabeça fria, ponderado, que conseguia conversar com a oposição. Não era um radical como o Sibá (Machado, líder do governo na Câmara), que não consegue conversar com ninguém. É um baque para o governo, realmente", diz Fleischer.

Detalhes da prisão

A prisão de Delcídio foi autorizada pelo STF - como ele tem foro privilegiado, a PGR só poderia detê-lo com autorização da Corte.

Delcídio é suspeito de envolvimento em irregularidades na compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos. Ainda não foram divulgados oficialmente detalhes sobre o que motivou sua prisão, mas, de acordo com a imprensa brasileira, o líder do governo foi detido porque teria tentado dificultar a delação premiada do ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró.

Segundo a colunista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, Delcídio teria sugerido a Bernardo Cerveró, filho do ex-diretor da Petrobras, uma fuga de avião para Madri via Paraguai. Como Cerveró tem cidadania espanhola, acrescenta a colunista, teria facilidade de entrar e se instalar no país.

Um mandado contra o advogado Edson Ribeiro, que atuou para o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, também foi emitido, mas ele não foi detido porque está nos Estados Unidos. Segundo fontes da PF, o ministro Teori Zavascki pedirá que seu nome seja incluído na lista da Interpol.

Ribeiro teria participado da reunião entre Delcídio e Bernardo. Já o banqueiro Andre Esteves - também detido nesta manhã-, do BTG/Pactual, seria o avalista da operação, informa Bergamo.

A prova da tentativa de obstrução da investigação seria uma gravação feita pelo filho de Cerveró do encontro em que foi exposto o plano de fuga, na tentativa de impedir que o ex-diretor da estatal fizesse acordo de delação.

Outro delator do esquema, o lobista conhecido como Fernando Baiano, disse em depoimento em outubro que Delcídio recebeu US$ 1,5 milhão de dólares de propina pela compra da refinaria.

Delcídio afirmou, na ocasião, que a citação do seu nome era "lamentável" e negou o recebimento de propina.