Topo

Quatro pontos da complicada relação da Turquia com seus vizinhos - e com o Estado Islâmico

12/01/2016 20h58

A região de Sultanahmet, coração turístico de Istambul, foi chacoalhada nesta terça-feira (12) por um atentado suicida, que deixou ao menos dez mortos --ao menos nove turistas alemães e um peruano, segundo autoridades.

O ataque não foi reivindicado, mas o governo turco atribuiu-o ao grupo autodenominado Estado Islâmico.

O episódio ocorreu perto dos conhecidos pontos históricos de Santa Sofia e Mesquita Azul, em uma das cidades mais visitadas do mundo.

O premiê turco, Ahmet Davutoglu, afirmou que o país continuará sua luta contra o EI (Estado Islâmico), internamente e dentro da coalizão liderada pelos EUA.

Os ataques evidenciam as conflituosas --e muitas vezes dúbias-- relações da Turquia com alguns vizinhos e com o próprio EI.

Nesse contexto se insere também o enfrentamento constante do governo turco com os rebeldes curdos, que reivindicam um Estado próprio.

A seguir, quatro pontos das complexas relações internacionais da Turquia atualmente:

1 - A dúbia relação com o Estado Islâmico

A Turquia já havia se tornado alvo do EI com dois bombardeios realizados no ano passado atribuídos ao grupo: na cidade de Suruc, perto da Síria, e na capital Ancara, que matou mais de cem pessoas.

"Até que eliminemos o Daesh (outra designação dada ao EI), continuaremos a lutar internamente e com as forças da coalizão (internacional)", disse nesta terça-feira o premiê Davutoglu, em pronunciamento televisionado.

No entanto, até meados do ano passado, a Turquia relutou em assumir protagonismo nessa coalizão e foi acusada de leniência perante o EI.

O país tem servido de ponto de passagem para combatentes estrangeiros que se juntaram aos jihadistas na Síria --e armas e fundos supostamente fluíram pela mesma rota via Turquia.

Por conta disso, o país foi criticado por aliados ocidentais, incluindo os EUA, que acusaram Ancara de ter facilitado a ascensão do EI.

Além disso, em agosto passado, o líder do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão) acusou o governo turco de proteger o EI em seus bombardeios para impedir que os curdos ---que estão na linha de frente de combate aos jihadistas-- avancem e conquistem territórios.

2 - O enfrentamento com os curdos

Isso nos leva a um segundo ponto crucial da política interna e externa de Ancara: o enfrentamento, de décadas, com a minoria étnica curda, que reivindica mais autonomia.

São mais de 30 milhões de pessoas, segundo os cálculos mais conservadores, ocupando um território que engloba partes da Turquia, da Síria, do Iraque e do Irã.

Os curdos são os principais adversários do governo turco.

"Os turcos alegam estar lutando contra o EI, mas estão na verdade lutando contra o PKK", disse Cemil Bayik, líder do partido curdo, em entrevista à BBC em 2015. "Seu objetivo é interromper o avanço curdo contra (o grupo islâmico)."

O governo turco na época negou e disse estar comprometido no combate aos extremistas islâmicos.

A violência em áreas curdas vinha escalonando desde o colapso, em julho, de um cessar-fogo com o PKK --que também já foi acusado de atentados em território turco.

Curdos estão espalhados por 4 nações e sonham com país próprio

AFP

3 - A oposição ao governo sírio

O governo turco tem sido um duro crítico do presidente sírio, Bashar al-Assad, desde o começo da guerra civil no país vizinho.

Mas por ser um dos principais aliados da oposição síria, a Turquia tem enfrentado o fardo de abrigar milhões de refugiados sírios.

Efetivamente, segundo o "New York Times", a Turquia já fechou suas fronteiras para novos refugiados do país vizinho.

Depois de um ataque do EI em julho de 2015, os turcos autorizaram a coalizão contra o EI liderada pelos EUA a usar suas bases aéreas para lançar ataques em território sírio.

Por outro lado, a Turquia tem criticado o apoio da coalizão aos milicianos curdos.

4 - Os objetivos divergentes em relação à Rússia

Enquanto a Turquia é um forte opositor ao governo de Assad, este tem na Rússia seu principal aliado.

Os dois países têm objetivos divergentes na geopolítica da região, o que foi evidenciado com a derrubada, em novembro, de um caça russo por forças turcas --que acusaram a aeronave de ter violado o espaço aéreo turco.

A Rússia considera a manutenção de Assad no poder crucial para a defesa dos interesses russos no Oriente Médio; já o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, chegou a dizer que seria impossível para os sírios "aceitarem um ditador que provocou a morte de até 350 mil pessoas".

Todo esse xadrez geopolítico e o aumento das tensões com diversos agentes internos e externos provocam, na Turquia, o medo de mais atentados.