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Campanha falsa de italiano à Presidência "engana" eleitores nos EUA

"Começou como brincadeira", conta escritor que criou "congressista" Alex Anderson - Alessandro Nardone/BBC
"Começou como brincadeira", conta escritor que criou "congressista" Alex Anderson Imagem: Alessandro Nardone/BBC

Andrea Vogt

De Como, Itália, para a BBC

04/03/2016 08h44

Nos últimos oito meses, o congressista californiano Alex Anderson fez campanha na internet em busca da indicação do Partido Republicano para disputar as próximas eleições presidenciais nos Estados Unidos.

Mas tudo não passou de uma farsa. Anderson era um personagem criado pelo escritor italiano Alessandro Nardone, que admitiu ter se passado pelo candidato fictício.

No entanto, ele disse que não tirará do ar o site de sua campanha nem deixará de publicar em sua conta no Twitter por ter conquistado muitos fãs americanos.

"Quando minha mulher e minha filha vão dormir e os Estados Unidos começa a acordar, eu sento em meu computador e viro Alex Anderson, como quando Clark Kent entra em uma cabine telefônica e vira o Super-Homem", diz o consultor de marketing, de 39 anos, que já atuou na política no norte da Itália e escreve romances nas horas vagas.

Nardone e um grupo de amigos da cidade de Campione d'Italia, na fronteira com a Suíça, usaram as redes sociais para obter apoio para Anderson, que tem 26,4 mil seguidores no Twitter e registrou mais de 200 mil visualizações no site de sua campanha.

O falso candidato recebeu inclusive convites de diversas partes do país para participar de debates e dar entrevistas.

Jogada de marketing

 

Nardone teve a ideia de criar o personagem como uma jogada de marketing para promover um romance escrito por ele que tem Anderson como protagonista.

Para sua surpresa, o público começou a levar Anderson a sério. O autor produziu camisetas, canecas e pôsteres. Um vídeo de sua campanha supostamente feito em Los Angeles foi rodado em um bar na cidade de Nardone, com a ajuda de amigos, moradores da cidade e funcionários de um cassino próximo, que se passaram por eleitores do candidato.

"Começou como uma brincadeira, mas, após uma semana, ficou realmente sério, com muitos e-mails chegando dos Estados Unidos", diz Andrea Balzaretti, que se passou pela gerente da campanha.

Conforme a candidatura ganhou vida própria, Nardone começou a trabalhar noite adentro para acompanhar o noticiário americano e travar conversas pelo Twitter, por aplicativos de mensagens e por e-mail com cidadãos do país. Sua mulher, Irene Colombo, chegou a pensar que ele havia ficado louco.

Alguns fãs queriam doar dinheiro para sua campanha. Apesar de vender produtos do candidato, Nardone diz não ter aceito as doações e pedido que o apoiassem compartilhando suas mensagens no Twitter.

 

Espionagem

O autor diz que, cada vez que criticava a pré-candidata democrata Hillary Clinton nas redes sociais, ganhava mais seguidores. Mas foi ao anunciar que o ex-funcionário da CIA Edward Snowden seria seu vice-presidente que o apoio a Anderson cresceu.

Nardone diz ter mantido a farsa para estimular o debate da espionagem de civis pela agência de segurança nacional americana, a NSA. "Muito americanos veem Snowden como um traidor, mas ele é um herói para mim. Decidiu usar ser nome para colocar o assunto no centro do debate eleitoral."

O italiano diz não ter permissão de Snowden para fazer isso, mas que não recebeu nenhuma reclamação.

Em entrevista à BBC, Nardone não soube dizer o nome da capital da Califórnia. Ainda assim, mensagens divulgadas por ele no Twitter e no site, feitas com base em uma boa dose de pesquisa, convenceram milhares de pessoas que ele estava rodando os Estados Unidos de ônibus, quando, na verdade, estava no norte da Itália.

Experimento

Mas houve quem percebesse rapidamente que Anderson não era um candidato real - dois jornalistas de Washington ligaram para falar com ele, passaram a segui-lo na internet e a oferecer conselhos sobre como parecer mais genuíno.

Alex Anderson conseguiu até ser registrado como força política legítima. No dia 5 de setembro, os quatro tópicos mais quentes da política americana, identificados com base em mensagens publicadas no Twitter pelo instituto de pesquisa alemão Big Data Analytics Research Lab, da Universidade Goethe, em Frankfurt, eram ligados ao candidato fictício.

Nardone defende a farsa dizendo que ela se transformou em um experimento sociopolítico que ilustra a superficialidade da internet, um meio facilmente manipulável com bons conhecimento de mídia.

"Se consegui realizar uma campanha falsa a partir da Itália e convencer milhares de americanos a votar em alguém que não existe, então qualquer um pode fazer o mesmo. Como saber se (o pré-candidato republicano) Donald Trump não está fingindo e fazendo uma nova série para competir com (a série do Netflix) House of Cards?"