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Entenda os argumentos do governo no STF para tentar adiar desfecho do impeachment

Cardozo elogia Fachin, mas diz que decisão deve ser do plenário do STF

UOL Notícias

Mariana Schreiber

Da BBC Brasil em Brasília

14/04/2016 14h54

O governo decidiu acionar o Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar anular parte do trâmite do impeachment contra presidente Dilma Rousseff no Congresso.

Dependendo da decisão do tribunal, a iniciativa pode ter o efeito de obrigar o processo a voltar algumas etapas, adiando a votação que está prevista para este domingo na Câmara.

Basicamente, o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, argumenta que a comissão especial de deputados que aprovou relatório pela abertura de um processo contra Dilma nesta segunda-feira não respeitou o amplo direito à defesa da presidente. Dessa forma, solicita que essa etapa seja anulada e refeita.

O mandado de segurança, entregue ao ministro Edson Fachin, solicita decisão rápida do magistrado. No entanto, não há prazos para ele se manifestar.

Nesta ação, o governo está questionando apenas pontos processuais, ou seja, relativos ao andamento do impeachment no Câmara. Não está sendo questionado se falta fundamento jurídico para abertura de um processo contra Dilma - mas, segundo Cardozo, isso ainda pode ser futuramente abordado em outro processo.

O ministro argumentou que o recurso ao Supremo contra decisão da Câmara não feriria a divisão de poderes do Estado brasileiro.

"A Constituição prevê que nenhuma lesão de direito ficará afastada do Judiciário. Quem entende que um direito foi lesado pode ir à Justiça. Nessa caso a presidente entendeu que não foi respeitado o devido processo legal", afirmou Cardozo.

A decisão do governo de acionar o STF ocorre na sequência de uma série de anúncios de partidos da base governistas de apoio ao impeachment. Nesta semana, partidos com bancadas grandes de deputados, como PP e PSD anunciaram que a maioria de seus parlamentares deve votar pela abertura de um processo contra Dilma. O ministro, no entanto, negou que a ação tenha relação com perda de apoio político.

Quais os argumentos do governo?

Quando o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, aceitou a denúncia contra Dilma em dezembro, acolheu apenas parcialmente o pedido apresentado pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Junior e Janaína Paschoal.

Na ocasião, Cunha entendeu que não havia indícios suficientes de implicação da presidente no esquema de corrupção da Petrobras. Além disso, achou melhor não aceitar acusações referentes a "pedaladas fiscais" cometidas em 2014, porque alguns juristas argumentam que Dilma só poderia ser processada por crimes cometidos no atual mandato, ou seja, após sua reeleição.

Dessa forma, o governo argumenta que a comissão especial que avaliou a denúncia contra Dilma só poderia ter debatido as acusações acolhidas por Cunha - irregularidades em seis decretos de suplementação orçamentária e a continuidade das "pedaladas" em 2015 devido a atrasos no pagamento ao Banco do Brasil relativos ao Plano Safra (empréstimos subsidiados à agricultores).

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No entanto, sustenta o governo, a comissão em diversos momentos discutiu fatos da operação Lava Jato, ferindo dessa forma o direito à defesa de Dilma. Inclusive a delação do senador Delcídio Amaral (ex-PT-MS) - que acusa a presidente de saber do esquema de corrupção da Petrobras - chegou a ser anexada à denúncia.

Segundo Cardozo, se a comissão queria acolher essas denúncias, deveria ter feito formalmente, para que houvesse novo prazo para a defesa rebater essas acusações específicas.

"Uma pessoa tem que saber do que está sendo acusada para que possa se defender. É óbvio que esse tratamento ampliado (da denúncia) atingiu de morte a defesa da presidente", argumentou Cardozo.

O ministro argumentou ainda que, embora o relator, deputado Jovair Arantes (PTB-GO), tenha dito que não levou em conta a delação do Delcídio em seu voto que recomendou o processo contra Dilma, ele fez diversas citações genéricas à Lava Jato em seu relatório.

"Não sei nem ao que ele se refere que poderia incriminar a presidente já que não tem inquérito aberto contra ela (pela Justiça)", disse o advogado-geral da União.

Outro ponto questionado pelo governo é o fato de que a defesa da presidente não foi notificada a participar da sessão da comissão que ouviu Miguel Reale e Janaína Paschoal sobre a denúncia.

A AGU também reclama que não teve direito a levantar "questões de ordem" na sessão em que Arantes leu seu relatório por cerca de quatro horas.

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Qual pode ser o efeito prático?

A ação movida pelo governo não questiona o recebimento da denúncia por Cunha, portanto não busca anular totalmente o processo de impeachment.

Caso o STF acolha os argumentos da AGU, o que pode ocorrer é a necessidade de refazer a etapa de análise da denúncia na comissão especial.

Nessa hipótese, caso a comissão decida incluir novas acusações à presidente, além daquelas aceitas por Cunha, seria aberto novo prazo de defesa para Dilma, adiando o desfecho do impeachment na Câmara.

Outra possibilidade seria a comissão não querer ampliar a denúncia, mas teria então que ser redigido novo relatório, sem citações à Lava Jato.

São cenários hipotéticos que dependem ainda de qual será a decisão do Supremo - a corte, claro, pode também optar por rejeitar os pedidos da AGU.

A velocidade da análise da ação pelo Supremo também dependerá se Fachin tomará alguma decisão liminar (provisória) sozinho ou se vai preferir levar a questão direto ao plenário (o que tende a ser mais demorado).