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A surpreendente moderação de Trump e outras 3 lições das primárias em NY

Andrew Kelly/Reuters
Imagem: Andrew Kelly/Reuters

Anthony Zurcher

Da BBC nos EUA

20/04/2016 05h38

Os principais nomes da corrida presidencial dos EUA tiveram vitórias importantes nas primárias do Estado da Nova York na terça-feira.

Hillary Clinton, do Partido Democrata, e o republicano Donald Trump conquistaram a maioria dos votos entre um eleitorado "caseiro" - ambos têm seu domicílio eleitoral em Nova York - derrotando, respectivamente, os senadores Bernie Sanders e Ted Cruz.

Clinton e Trump tinham sofrido derrotas eleitorais em outros Estados nas últimas semanas.

Nova York ofereceu também quatro importantes observações sobre a corrida eleitoral.

Trump 'paz e amor'

Ameaçado pelo crescimento de Cruz nas últimas primárias, Trump precisava de uma vitória categórica. E conseguiu: os resultados provisórios da Nova York já apontam que o bilionário conseguirá a maioria dos 95 delegados do Estado.

Ele também terá a maioria dos votos, algo que havia ocorrido apenas uma vez este ano e chegará com novo ânimo para as próximas votações, que ocorrerão nos Estados do Nordeste e Meio-Atlântico, regiões consideradas "amigáveis".

O mais importante, porém, é a mudança de atitude de Trump na campanha. Em Nova York, ele mostrou-se bem mais contido tanto no palanque quanto nas mídias sociais - os tuítes atacando rivais e suas esposas sumiram. Em vez disso, na terça-feira Trump fez um discurso com base em seus planos para a economia.

Depois de turbulentas semanas, em que sua campanha foi cercada de polêmica por declarações contra o aborto e acusações de que um de seus assessores agrediu uma jornalista, Trump trouxe assessores experientes para tentar reparar os danos.

Se a nova imagem for parte disso, Trump poderá se transformar não apenas em um adversário formidável nas próximas primárias como também na missão de convencer os republicanos que ainda não aprovam sua candidatura.

"Amanhã, voltamos ao trabalho", disse Trump durante seu discurso da vitória na noite de terça-feira nos EUA. Foi uma declaração atipicamente modesta em se tratando de Trump. E isso deve deixar seus adversários bem preocupados.

Clinton abre vantagem

O senador Bernie Sanders concentrou muitas forças na batalha de Nova York, estratégica para suas pretensões de chegar à Casa Branca. Gastou US$ 7 milhões em publicidade na TV, mais que o dobro de Hillary Clinton, e organizou uma série de comícios - em um deles, em Manhattan, havia mais 20 mil pessoas.

Não foi o suficiente.

Sanders, representante do Estado de Vermont no Senado Americano, mas que nasceu no bairro novaiorquino do Brooklyn, chegou à primária tendo vencido cinco Estados consecutivos, mas Nova York era um obstáculo diferente.

As regras de registro de eleitores eram bem mais rigorosas e impediram a participação de eleitores independentes - justamente um segmento que vem apoiando Sanders. Clinton também tem forte ligações com Nova York - foi senadora pelo Estado durante sete anos.

Outro problema para Sanders é que o eleitorado democrata em Nova York tem grande proporção de eleitores de minorias (40%), uma faixa demográfica que tem mostrado mais apoio a Clinton.

Sanders agora está próximo de um deficit quase impossível de ser descontado nas 19 primárias restantes. Precisará vencer as disputas por margens de dois dígitos, o que incluiu o Estado da Pensilvânia, na semana que vem, onde ele aparece atrás da ex-secretária de Estado pesquisas de opinião.

"A vitória está à vista", disse Clinton na terça-feira.

O senador tem fundos para lutar até o final, mas a contagem de delegados (Clinton lidera com o placar de 1.893 a 1.180) é uma verdade fria e dura.

Democratas nem tão divididos

Clinton e Sanders, nas últimas semanas, trocaram ataques pouco amigáveis ao criticar ideias e propostas, mas o clima de agressividade não parece estar afetando o Partido Democrata.

De acordo com pesquisas de boca de urna durante as primárias democratas de Nova York, apenas 13% dos eleitores disseram que não votarão na ex-secretária de Estado se ela for escolhida pelo partido. O percentual é bem menor que os eleitores de Clinton que disseram se recusar a apoiar Barack Obama nas eleições de 2008.

Entre os republicanos, 26% disseram que não apoiarão Trump.

Obviamente, há algumas divisões claras entre o eleitorado democrata. Pesquisas mostraram que, em Nova York, Sanders teve 69% dos votos de eleitores entre 18 e 29 anos de idade, ao passo que Clinton registrou 72% dos votos entre a faixa etária de mais de 65 anos.

O senador teve uma vitória apertada no voto de eleitores brancos, enquanto a ex-primeira-dama levou 63% do voto hispânico e 75% do negro.

E quase sete entre 10 democratas acreditam que a disputa entre Clinton e Sanders "energizou o partido".

Cruz 'esmagado'

Não foi à toa que Ted Cruz não fez campanha semana passada em Nova York e preferiu participar de eventos na Califórnia. O senador pelo Estado do Texas tem chances na primária californiana, em um mês, mas a estrada até lá promete ser complicada para o homem que se apresenta como a única alternativa a Trump.

Ele foi derrotado com sobras em Nova York, terminando atrás de Trump e do outro candidato republicano - o governador de Ohio, John Kasich. Pode ter sido o resultado do uso da expressão "valores novaiorquinos", usada por Cruz como forma de criticar Trump, mas pode ter sido também um sinal de que os Estados do nordeste americano não se identificam com o discurso evangélico e ultraconservador do senador.

Isso deverá causar preocupação na campanha de Cruz, já que os próximos Estados a votar na disputa republicana estão justamente nessa região - Pensilvânia, Maryland, Delaware, Connecticut e Rhode Island -, com eleitorados bem similares.

Cruz poderá voltar a vencer quando o circuito das primárias tomar o rumo do oeste nas próximas semanas, mas poderá matematicamente já estar eliminado da disputa e torcendo por alguma manobra de bastidores para ser escolhido como candidato na convenção do partido, em julho.

Se Trump mantiver-se fiel ao novo script de campanha e evitar os insultos pessoais, Cruz terá para frente um senhor desafio.