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Bombas em metrópoles e alta tensão: entenda a instabilidade na Turquia

Militantes curdos e islâmicos fram culpados por ataques recentes em Istambul e Ankara - Reuters
Militantes curdos e islâmicos fram culpados por ataques recentes em Istambul e Ankara Imagem: Reuters

Paul Kirby

Da BBC News

29/06/2016 08h25

Mais um atentado de grandes proporções se soma a uma série de ataques às maiores cidades da Turquia, Ancara e Istambul.

A Turquia sempre foi um marco de estabilidade entre a Europa e o Oriente Médio. Mas atualmente vive um período de alta tensão, lutando contra militantes curdos no leste e tentando evitar que o conflito na Síria atravesse a fronteira.

E enquanto tratavam os militantes curdos como a principal ameaça, os turcos começaram a ser alvo do autoproclamado Estado Islâmico (EI).

Qual é o perigo da crise atual?

Além do atentado da terça-feira, cinco atentados a bomba em Istambul e três em Ancara nos últimos oito meses enviaram aos turcos uma mensagem clara de que não há lugar no país onde seja possível ficar à salvo da violência.

Em Istambul, no ano passado, militantes do PKK (Partido Trabalhista do Curdistão) explodiram um carro perto de um ônibus que levava forças de segurança.

Mas o autoproclamado Estado Islâmico também tem estado ativo na região. Um homem-bomba matou três turistas israelenses e um iraniano na movimentada avenida Istiklal, em Istambul, em março.

Em janeiro, 12 turistas alemães morreram quando um extremista suicida do EI explodiu a si mesmo na área turística da cidade de Sultanahmet.

Alguns dos ataques mais sangrentos ocorreram em Ancara:

  • O grupo militante curdo TAK disse estar por trás do carro bomba que matou 35 pessoas em 13 de março perto do escritório do primeiro-ministro.
  • Perto dali, 29 pessoas foram mortas em um ataque a ônibus que levavam militares em 17 de fevereiro. O ataque foi reivindicado pelo TAK (Falcões da Liberdade do Curdistão, um ramo do PKK.
  • Mais de 100 pessoas morreram do lado de fora de uma estação de trens em Ancara, em outubro de 2015. Militantes do EI foram considerados culpados pelo atentado.

Até recentemente, os ataques ocorriam apenas em áreas curdas do leste e sudeste do país - onde militares turcos já enfrentavam o PKK havia décadas.

A violência nas maiores cidades tendia a se focar em escritórios de partidos políticos, especialmente os de esquerda ou o HDP (Partido Democrático do Povo), pró-curdo. O partido marxista DHHP-C, que opera na clandestinidade, realizou ataques contra a polícia e embaixadas do Ocidente.

Mas para milhares de turistas que chegam ao país a cada ano, a Turquia permanece sendo um destino atrativo. A França, porém, orientou seus cidadãos a ficarem alertas em áreas turísticas.

A Grã-Bretanha também divulgou alerta, dizendo que "mais ataques poderiam ser indiscriminados e poderiam afetar locais visitados por estrangeiros".

Mas os turcos estão com medo de frequntar shoppings e locais públicos.

"Acho que estamos assistindo a uma escalada da violência ", diz Menderes Cinar, analista da Universidade de Baskent, em Ancara.

Por que a situação se deteriorou?

A Turquia está inserida em um conflito em duas frentes: dentro do país e na fronteira com a Síria.

O governo em Ancara lutou por décadas uma guerra interna contra o PKK. Por dois anos, um cessar fogo conseguiu conter escaramuças entre turcos e militantes curdos - vistos como terroristas pelo governo e por muitos países do Ocidente.

Mas o cessar fogo acabou em julho de 2015, após um ataque a bomba que matou 32 jovens curdos e ativistas de esquerda na cidade de Suruc.

As vítimas teriam sido alvejadas por um extremista do EI. Elas estariam planejando viajar para a Síria com o objetivo de reconstruir Kobane, uma cidade devastada por militantes do Estado Islâmico.

Isso deu início a uma onda de ataques de militantes e respostas militares do governo. O PKK acusou o governo turco de desejar que o Estado Islâmico tivesse sucesso em deter o avanço de tropas curdas na Síria e no Iraque.

A Turquia e o PKK parecem ter regredido para a situação em que estavam antes do início da trégua em 2013.

O líder do PKK, Cemil Bayik, acusou o presidente Erdogan de "proteger o EI" para impedir o avanço curdo em território controlado pelos jihadistas. Em entrevista à BBC em abril ele condenou ataques a civis, mas defendeu a campanha militar travada pelo grupo.

Qual é a influência do conflito na Síria?

A Turquia foi envolvida no conflito sírio há muito tempo e seu premiê, Recep Tayyip Erdogan, foi um dos primeiros a defender a queda do presidente da Síria, Bashar Assad.

Mas o governo turco começou a se preocupar quando grupos curdos começaram a controlar áreas no norte da Sìria. A Turquia temia o fortalecimento da milícia YPG (Unidades de Proteção Popular Síria Curda) e seu braço político PYD (Partido da União Democrática).

"A Turquia sente uma ameaça existencial do PYD e do PKK. E está claro que o PYD e o PKK são a mesma coisa", diz Burhanettin Duran, do institudo de pesquisas Seta, partidário do governo turco.

Em 2015, o YPG fez o Estado Islâmico recuar da fronteira turca e passou a controlar uma faixa de 400 quilômetros de território. Após a intervenção russa no conflito, em setembro de 2015, os curdos da Síria também ganharam território ao norte de Aleppo.

Grupos curdos agora controlam a maior parte da fronteira síria com a Turquia. Um grande problema do governo turco é que, apesar dos Estados Unidos classificarem o PKK como uma organização terrorista, apoiam o YPG na fronteira com a Síria.