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'Antidiplomacia' telefônica: o estilo pouco ortodoxo com que Trump conduz relações internacionais dos EUA

Trump teria ameaçado invadir o México em telefonema a presidente do país vizinho  - Mandel Ngan/ AFP
Trump teria ameaçado invadir o México em telefonema a presidente do país vizinho Imagem: Mandel Ngan/ AFP

05/02/2017 14h04

O mundo pela primeira vez está vendo o lado diplomático de Donald Trump.

Antes, conheceu o apresentador de programa de TV, o homem de negócios e o candidato republicano à presidência dos EUA.

Seu estilo sempre foi atrevido e temperamental. Trump nunca hesitou em ser politicamente incorreto. Estes atributos fizeram do programa The Apprentice um sucesso de TV não apenas nos EUA, bem como o ajudaram a fechar negócios no mercado imobiliário em tempos de bonança - e a se manter "vivo" quando a crise financeira de 2008 eclodiu.

Mas há quem questione se o "jeito Trump" será eficaz na tarefa de impor autoridade no cenário mundial. Já é certo que representa uma mudança radical na maneira como outros presidentes americanos se comportaram no âmbito das relações internacionais, com interações cuidadosamente manejadas, raramente fugindo do protocolo.

Talvez seja melhor dizer que o mundo está vendo o Donald Trump "antidiplomático".

Diálogos tensos

Vários veículos de mídia no mundo relataram na quarta-feira o suposto conteúdo de conversas de Trump com o presidente do México, Enrique Peña Nieto e com o premiê australiano, Malcolm Turnbull, com base em informações de fontes que tiveram acesso à transcrição dos diálogos.

A Turnbull, Trump disse que um acordo firmado com a administração de Barack Obama para receber mais de mil refugiados atualmente em campos de detenção australianos era o "pior compromisso do mundo". Ele também descreveu a conversa com o líder australiano como a pior que teve com líderes internacionais.

Em um sinal foi o fato de que a conversa, prevista para durar uma hora, acabou encerrada em 25 minutos.

México

No telefonema a Peña Nieto, Trump teria reclamado da atuação das autoridades mexicanas contra o narcotráfico e o crime. Segundo a agência de notícias AP, o presidente americano teria ameaçado enviar tropas ao país vizinho - uma informação negada pelo governo mexicano.

Nas duas conversas, Trump teria se gabado do tamanho da multidão que assistiu nas ruas de Washingotn a sua posse, em 20 de janeiro. O assunto se tornou recorrente nos pronunciamentos de Trump depois da mídia em vários países afirmar que o evento recebeu audiência muito menor que a posse de Obama, em 2009.

Mas as os relatos divergem dos comunicados da Casa Branca, que falam apenas na "força das relações" entre os países e sua "proximidade".

Diplomacia "dura"

Um tuíte de Trump condenando o acordo de refugiados com a Austrália pareceu confirmar que a conversa com Turnbull foi menos harmoniosa que nos documentos oficiais.

E o presidente não tentou dissuadir ninguém.

"Se vocês ouvirem que estou tendo conversas duras, não se preocupem. Está na hora de sermos um pouco duros, meus amigos. Todos os países do mundo estão levando vantagem sobre nós. Isso não vai continuar".

Esse tipo de atitude mais abrasiva agrada às pessoas que apoiam Trump, mas preocupa quem prevê problemas internacionais para o país.

"Isso gera uma profunda incerteza em outros países sobre a confiabilidade dos Estados Unidos. Se Trump continuar se comportando de maneira errática, as consequências podem ser imprevisíveis", explica Zach Beauchamp, jornalista especializado em relações internacionais.

Nem todas as interações de Trump, porém, têm sido agressivas. A conversa com o premiê paquistanês, Muhammad Nawaz Sharif, foi marcada por elogios de Trump, segundo as transcrições.

"Os paquistaneses são pessoas inteligentes. Estou pronto para ajudá-los a encontrar soluções para seus problemas", disse o texto.

A arte de vender

Em um livro publicado em 1987, A Arte de Vender, Trump explica os segredos para uma boa negociação. Um deles é "ser afável, mas se defender com tudo" caso alguém acredite que está sendo tratado de maneira injusta.

Outro é "nunca mostrar fraqueza".

"O pior que se pode fazer em uma negociação é se mostrar despreparado", escreveu Trump.

"Isso faz com que a outra parte sinta o cheiro de sangue, e você está morto".

Há quem diga que Trump parece estar aplicando essas máximas a suas relações diplomáticas.