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Por que o Japão não destrói os mísseis lançados pela Coreia do Norte?

Eugene Hoshiko/AP Photo
Imagem: Eugene Hoshiko/AP Photo

Redação - BBC Mundo

17/09/2017 19h46

Os alarmes antiaéreos da ilha de Hokkaido só foram ativados duas vezes nos últimos quinze anos. E não se tratava de um exercício, mas sim de resposta a uma ameaça real: os disparos de mísseis balísticos da Coreia do Norte, que sobrevoaram a ilha antes de cair no mar.

No último teste de mísseis norte-coreanos, na semana passada, os moradores receberam um aviso às sete da manhã do governo - enviado via SMS - recomendando que buscassem abrigo.

O projétil norte-coreano sobrevoou Hokkaido entre as 7h04 e as 7h06 da manhã, antes de cair no mar. Isto significa que os cidadãos tiveram cerca de quatro minutos para procurar abrigo.

Várias pessoas se perguntaram o porquê do governo japonês não ter destruído o míssil.

"Realmente não temos prática com evacuações. Não sabemos o que fazer, pois o Japão não entra em guerra há mais de 70 anos", disse à BBC o estudante de medicina Avelino Fujimoto. Ele mora em Maebashi, cidade a noroeste de Tóquio.

"Em geral, o Japão é um lugar muito seguro para se viver. Mas o fato de que não sabemos quão potentes são esses mísseis e nem que áreas eles podem atingir está deixando muita gente com medo", acrescenta Fujimoto.

O ministro da Defesa, Itsunori Onodera, disse que as autoridades acompanharam o míssil desde seu lançamento até a queda no mar, e que o governo soube rapidamente que o projétil não visava um alvo em solo japonês.

De fato, o petardo caiu a mais de 2,2 mil quilômetros de Hokkaido. Mas quais opções o Japão teria?

Defesa antimísseis

O Japão possui hoje um sistema de defesa antimísseis que funciona em duas etapas.

De um lado está o sistema de combate Aegis, espalhado pela região em navios de guerra japoneses, norte-americanos e coreanos.

Além disso, o território japonês conta com várias baterias antiaéreas do sistema Patriot, de curto alcance, cuja função é derrubar os mísseis quando estes começam a descer para atingir os alvos.

A combinação não é ruim, mas possui limitações.

Para que o sistema Aegis funcione corretamente, os navios precisam estar posicionados no lugar certo e na hora certa, de modo a tornar a interceptação possível.

O sistema Patriot, por sua vez, funciona bem para defender áreas específicas, mas é pouco eficiente para defender áreas muito grandes.

O Japão teria outras alternativas, mas são caras e demorariam bastante tempo para serem instaladas.

Poderia, por exemplo, criar um sistema adicional parecido com o Terminal de Defesa Aérea de Grande Altitude norte-americano (Thaad, na sigla em inglês). O Thaad está em operação na ilha de Guam e foi oferecido pelos EUA para operar na Coreia do Sul.

"O sofisticado radar do Thaad e sua capacidade de destruir projéteis à uma grande altitude reduziriam os estilhaços produzidos pelos mísseis interceptados, reduzindo os danos que seriam causados em zonas habitadas. Uma vantagem valiosa, principalmente no caso de um ataque nuclear", escreveu este ano o especialista em segurança Jonathan Berkshire Miller na revista Foreign Affairs.

Mas a implementação deste tipo de sistema criaria tensões com a China. Isto ocorreu quando o Thaad foi posicionado na Coreia do Sul.

O governo japonês já disse que pretende ampliar o uso do sistema Aegis. Além disso, o ministro da Defesa indicou que pretende adquirir um sistema terrestre, conhecido como Aegis Ahore, capaz de interceptar mísseis acima da atmosfera terrestre. O Ahore tem um alcance ainda maior que o Thaad, segundo o jornal americano The New York Times.

O problema é que nenhum destes sistemas garantiria a proteção do Japão.

É por isto que os oficiais da área de defesa do país debatem a aquisição de armas que permitam destruir mísseis norte-coreanos antes mesmo do seu lançamento, talvez em conjunto com os EUA.

"O Japão poderia comprar mísseis Tomahawk dos EUA, ou usar o caça F-35ª, que deve ser adquirido nos próximos anos, para atingir alvos norte-coreanos", diz Berkshire Miller. O especialista integra o Conselho de Relações Exteriores (Council on Foreign Relations), um think-tank.

Estes equipamentos se adaptariam facilmente aos destroieres do país, estacionados no Mar do Japão.

Mas ainda não está claro quais destas opções seriam consideradas legais pela Constituição japonesa, de caráter pacifista. A Constituição atual do país foi estabelecida depois da Segunda Guerra Mundial, e limita em grande medida as possibilidades de desenvolver um exército convencional. Também limita as ações que não tenham um caráter estritamente defensivo.

O governo japonês definiu em 1956 que um ataque preventivo seria considerado mero exercício do direito de defesa. Mas, segundo o jornal New York Times, estudiosos do direito japonês dizem que este tipo de ação representaria uma ruptura com a política estabelecida depois da Segunda Guerra.